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A mudança na política operacional do BNDES indica uso mais disciplinado de subsídios e crédito estatal, cruciais para reduzir o risco sistêmico da economia e promover uma tendência de redução na taxa de juros, o que ajuda a dinamizar a economia. A principal mudança é que o BNDES deixa de ser um competidor desleal do mercado de capitais e passa a atuar como um complemento dele, focando de maneira pontual nos segmentos que possuem maior impacto e interesse social e nas situações onde o mercado tem dificuldade de financiar.
A nova política vai focar no financiamento em projetos, o que vai gerar incentivos para que empresas de menor porte tenham acesso a investimentos de longo prazo para viabilizar seus projetos e futuramente serem candidatas a abrir o capital. Segundo Antônio Castro, presidente da Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas), o impacto no mercado de capitais deverá vir daqui a cinco, dez anos que é o tempo de maturar os projetos que serão financiados a partir de agora pelo banco.
No momento a nova política funciona como um alento para o mercado de capitais e dá oxigênio para uma retomada da economia com geração de empregos, diz Castro. "Investir em projetos permite que vários tipos de empresas se viabilizem para serem atrativas para investidores no mercado de capitais". Na avaliação dele, porém, o retorno da renda fixa ainda dificulta o investimento no mercado de renda variável.
A política antiga do banco focou setores específicos e grandes empresas do setor de commodities, fornecendo dinheiro barato, uma atuação que contribuía para distanciar as empresas do mercado de capitais. Agora, na opinião de Mauro Rodrigues da Cunha, presidente, da AMEC (Associação dos Investidores no Mercado de Capitais), estamos vendo uma inversão da política anterior e a mudança é positiva.
"A principal mudança é que o BNDES deixa de ser um competidor desleal do mercado de capitais e passa a atuar como um complemento dele, focando de maneira pontual nos segmentos que possuem maior impacto e interesse social e nas situações onde o mercado tem dificuldade de financiar", afirma o presidente da AMEC. Assim, desfaz-se o incentivo perverso que havia para os empresários irem ao BNDES pois o dinheiro era barato e menos complicado do que prestar contas ao mercado, acrescenta.
A atuação anterior do BNDES freou o movimento de abertura de capital que vinha dinamizando o mercado. No ano passado, apenas uma empresa realizou IPO, (sigla em inglês para abertura de capital), enquanto 43 cancelaram o registro de companhia aberta, conforme dados da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). A redução do número de IPOs, depois de um boom em 2006 e 2007, quando cerca de 80 companhias vieram a mercado, começou a partir de 2012.
Para os investidores, com a nova postura do banco o mercado de capitais ganha atratividade porque não tem mais um competidor desleal, com crédito imediato e um saco sem fundo de dinheiro, como foi o BNDES nos últimos anos, observa Rodrigues da Cunha.
Ele afirma, porém, que em sua opinião pessoal - e não da AMEC -, não vê razão para o BNDESPAR carregar uma carteira de empresas maduras que não precisam do banco como acionista. "É chegada a hora de reciclar este portfólio, liberando capital para novas atuações do banco. Existem empresas que podem andar sozinha e não precisam de crédito de banco de fomento, como aconteceu na gestão anterior."
Embora estejam mais confiantes na atual política, investidores estrangeiros continuam a apontar problemas e incertezas que influem em suas decisões de investimento. Uma delas é quanto ao dinheiro para financiar projetos de longo prazo para a infraestrutura, que é um dos pilares para colocar o país de volta no caminho do crescimento econômico, já que a participação do BNDES nesses financiamentos será menor. Outro problema para os estrangeiros é como ficará a proteção em relação ao câmbio. O investidor que alocar recursos em dólar ou euro vai querer retorno na mesma moeda e não em reais.
Política operacional
De acordo com recente artigo publicado no Valor Econômico, pela presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, "em seu conjunto a nova política operacional do banco define condições de financiamento e incentivos horizontais, substituindo a antiga lógica de apoio a setores, pelo apoio a projetos".
"A primeira razão para essa mudança é o fato de que um dos principais papéis do BNDES é financiar projetos que apresentem alguma forma de externalidade. Isto é, que gerem benefícios para a sociedade, além daqueles que serão apropriados pelos beneficiários diretos dos projetos. Dois projetos de um mesmo setor podem apresentar diferentes graus de externalidades e portanto devem merecer condições distintas de financiamento".
Com a nova política, conforme o artigo, o BNDES passa a contar com duas linhas de financiamento, "Incentivada" e "Padrão", que substituirão todas as anteriores e definirão as condições financeiras dos projetos apoiados. As novas linhas têm gradações de subsídios no financiamento que vão até 80% da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) para projetos de educação e saneamento. Nesse primeiro semestre, a TJLP está em 7,5% ao ano, enquanto a atual taxa básica de juros da economia, a Selic, está em 13% ano.
Conforme o artigo da presidente do BNDES, todo projeto financiado pelo banco terá um quadro de resultados esperados, definidos antes que serão listados para acompanhamento e futura avaliação, prática que possibilitará ao Banco dar mais transparência aos projetos financiados, além de criar um banco de dados para continuo aperfeiçoamento de sua política operacional.
Restrição a dividendos
A nova política também estabelece restrições ao pagamento de dividendos, além do mínimo legal de 25%, para beneficiários de empréstimos em percentual igual ou superior a 50% em TJLP. O objetivo é garantir que o financiamento do BNDES gere adicionalidade nos investimentos, ou seja o reinvestimento de parte do lucro.
Para especialistas, essa limitação não deverá reduzir a atratividade do mercado para os investidores. Na avaliação de Sérgio Lazzarini, professor titular da cátedra Chafi Haddad do Insper, a regra sobre dividendos também é positiva. "Nossos estudos indicaram que muitas das grandes empresas negociadas em bolsa tomavam recursos do BNDES sem mudar seu padrão de investimentos".
O que acontecia antes, segundo o professor, era simplesmente uma transferência de subsídios para acionistas sem que isso resultasse em impacto na economia real. Embora isso possa beneficiar os acionistas no curto prazo, a recente crise mostrou que não é algo sustentável no longo prazo, dado que recursos públicos são escassos e têm custo relevante.
Com uma melhoria das condições macroeconômicas, espera-se que as empresas consigam captar mais com fontes do mercado, deixando os bancos públicos mais focados em apoiar projetos de alto impacto social, acrescenta.
Em resposta à pergunta da RI sobre projetos e estudos em conjunto com o BNDES para o desenvolvimento do mercado, a CVM nos informou por e-mail "que mantém, permanentemente, contatos com participantes considerados relevantes para o mercado de capitais brasileiro, a fim de aprimorar e expandir o segmento. Estas ações estão em linha com o mandato legal da Autarquia que, dentre diversas características, busca promover o funcionamento eficiente do mercado".