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Um dos aspectos mais discutidos nos últimos meses tem sido o equilíbrio entre o sistema de remunerações dos executivos, a realidade econômica de escassez, a expectativa de rentabilidade dos investimentos por parte de acionistas e investidores. São aspectos que impactam enormemente na confiança desses públicos estratégicos de toda companhia bem como no patrimônio acumulado de reputação.
Tornam-se, nos dias atuais, um fio muito sensível a administrar no cenário atual – especialmente em nosso país – e torna-se um tema recorrente em ambiente de crise, recessão e reajuste dos indicadores macroeconômicos.
Os acionistas delegam a gestão da empresa a executivos profissionais com a expectativa de garantir a eficiência necessária da administração no sentido de manter o grau de valor de ativos e a competitividade do negocio. A ideia inerente a essa delegação é que repassando essa responsabilidade a indivíduos com ampla experiência possa se garantir a maior eficácia do processo, no sentido de dispor aos acionistas a maior remuneração e valorar os ativos no mercado. Mas, ao mesmo tempo em que estimula a busca por desempenhos melhores, o sistema de remuneração exige um alinhamento entre o comportamento das pessoas com os objetivos da empresa bem como os valores de cada organização e as promessas de ganho futuro disseminadas pelos discursos organizacionais – um grande pilar de convergência ou divergência no atendimento das expectativas existentes por parte dos envolvidos.
A remuneração executiva interpretada pela teoria da agência como mecanismo de incentivo e de compensação dos gestores, principalmente das grandes corporações - que têm o seu capital pulverizado em milhares de acionistas - está intimamente ligada à prática da governança corporativa, Em estudo desenvolvido nos Estados Unidos demonstrado por JENSEN; MURPHY; WRUCK (2004) concluiu-se que a governança corporativa e as políticas salariais das empresas têm uma relação muito próxima e que estruturas ruins de governança podem conduzir a práticas de remuneração que levam à destruição do valor de qualquer empresa.
Quando se dissemina que uma das regras básicas exigidas pelo modelo de gestão baseado na governança é a transparência, recentes fatos demonstram que esse indicador pode ser reinterpretado de acordo com o significado extraído do pensamento de cada agrupamento de gestores do que seja transparência - de acordo com os interesses em jogo e o contexto competitivo de cada momento. Alguns estudos recentes, principalmente no campo da gestão comunicacional e da administração, têm colocado em questionamento o nível de transparência das organizações no ambiente complexo da contemporaneidade.
Muitos evocam a questão relacionando-a com a postura, o comportamento organizacional, aspectos estritamente dependentes da cultura de cada organização. É uma questão a ser considerada, pois, afinal, o significado que uma e outra concede à transparência pode variar de forma exponencial conforme as variáveis de seu mercado, seu posicionamento estratégico e sua realidade competitiva.
Esse questionamento acerca do nível de transparência das organizações e cujo discurso em comum inseri-o como dado indiscutível nos dias atuais, traz à tona outras variáveis que estão diretamente relacionadas ao tema e que evocam outras como: o direito ao acesso à informação por parte dos públicos essenciais de qualquer organização (o acionista, o investidor, o cliente e a sociedade, bem como os órgãos reguladores); as políticas de incentivo adotadas por elas que estimulam à eficiência (produtividade e rentabilidade) com foco na eficácia organizacional (retorno de investimento e lucratividade adicionado de maior competitividade e participação e mercado) para seus executivos e o equilíbrio de tudo isso com as expectativas e percepções de seus acionistas. No caso das grandes corporações esse questionamento torna-se fator de extrema delicadeza e um fio condutor e balizador de sua reputação.
Um caso recente nesse sentido pode ser exemplificado pela divulgação pela Financial Times, da informação do crescimento do valor da remuneração de altos executivos na Europa inclusive de Jamie Dimon, do JPMorgan Chase e de Vikram Pandit do Citigroup, que desfrutaram de um aumento anual em sua remuneração de cerca de 12%, mesmo com a queda generalizada nos lucros e nos preços das ações de suas companhias, impactando em, a partir da divulgação desses dados, um aumento na indignação por parte dos investidores em relação a esse desequilíbrio e levou aos reguladores do mercado, incluindo os Estados envolvidos – a promover um movimento em direção ao estabelecimento de um teto básico para os bônus dos bancos.
No primeiro caso, de Jamie Dimon, um dos executivos com maior reputação do mercado mundial na gestão de fundos, se viu em poucos segundos, diante de um cenário de “xeque mate” em relação à sua própria reputação.
Esse ano, no nosso lado de cá do Atlântico, outros dados chegaram ao mercado e demonstraram que a discussão global se reflete em qualquer local. O caso da Vale que também, em março, apresentou um aumento salarial de sua diretoria executiva de 19,4%, em relação ao ano anterior, exigiu da Companhia uma explicação à agência Reuters acerca do desmembramento dos valores divulgados e encaminhados à CVM, ou seja, conforme divulgou a Companhia: “a parcela relativa à remuneração fixa sofreu basicamente o aumento decorrente da correção pelo IPCA e alguma variação do câmbio. O montante cresceu quase 8% para US$ 12,3 milhões”.
No Brasil, a remuneração dos executivos subiu ao Olímpo se for comparado à realidade de outros países, devido, principalmente, à realidade de crescimento e à ambiência de otimismo reinantes nas ultimas duas décadas. O contexto hoje é outro. A realidade hoje é a otimização de equipes, equilíbrio de custos, readequação de salários e, principalmente, voltar-se a um contexto complexo, de uma sociedade carente, uma realidade econômica recessiva e um cenário social extremamente reivindicatório e cada vez mais agrupada por causas e demandas que se amparam pela conscientização política e do direito.
Esse contexto traz à tona a realidade de um mundo atual no qual não cabe mais definições de políticas desequilibradas e baseadas no ego ou de institucionalização de micropoderes, dissociadas de resultados, dissonantes em relação a uma realidade de mercado, um ambiente competitivo e à exigência de diferenciais que ajustem valores, cultura, coerência comportamental e atrativos que, além da remuneração, atraiam gestores pelo equilíbrio entre desafios tangíveis e aqueles que vão além dos ganhos e resultados “matematizáveis”.
De acordo com estudo realizado pela Towers Perrin, consultoria de Recursos Humanos norte-americana, junto a 67 empresas no Brasil que buscou detalhar os princípios que norteiam as relações de trabalho e as tendências para o futuro, em um espaço de 2 a 3 anos, “[...] as recompensas intangíveis são aquelas mais importantes para levar os empregados a resultados superiores”. A remuneração e os bônus destacam-se como item de suma importância, porem, de acordo com o estudo, com peso relativo.
Uma fala do executivo da consultoria, Luiz Roberto Gouveia, vale a pena ser destacada: “[...] superada a fase de underwater (crescimento negativo), os programas de ações serão reconhecidos como um dos eficientes instrumentos de alinhamento entre os interesses de acionistas e dos empregados”.
O desafio reputacional está dado na citação de Gouveia acima, ou seja, o equilíbrio entre os interesses dos públicos de cada organização, além do acionista. Seja qual for a política adotada e tida como certa pela organização, ela pode ser colocada facilmente em discussão por qualquer que seja o publico de interesse. Desconfiança é um fator de perda de valor, efetivo. Coerência comportamental e atitudes verdadeiras e viáveis, equilibradas em relação à realidade e ao contexto social e de cada coletivo são os balizadores de reputação nos dias atuais, alinhados, logicamente, à rentabilidade, porem de forma coerente – esse o valor maior demandado pelo contexto dos sujeitos contemporâneos.
As organizações deixaram de ser meras instituições alijadas da realidade. Suas políticas e decisões causam e provocam alterações do ambiente e da realidade, instrumentalizam vidas, alteram sonhos. Não cabe mais desequilíbrio entre desafios competitivos, valores organizacionais, políticas internas com contextos externos.
Tornaram-se todos, indivíduos, grupos e organizações, sujeitos de um mundo complexo. Nessa ambiência, transparência, verdade e políticas devem estar em sintonia com interesses e expectativas do externo e do interno. O desafio é integrar essas demandas. Afinal, tornamo-nos, todos, meros sujeitos de um tabuleiro no qual jogamos no mesmo pé de igualdade. Sintonia é o maior desafio a ser alcançado nesse jogo reputacional.
Ana Lucia De Alcântara Oshiro
é Doutora em Ciências da Comunicação, Mestre em Comunicação, Tecnologia e Mercado. Consultora de reputação, professora universitária, diretora da Tatica.com e pesquisadora das estratégias e interpretações reputacionais dos sujeitos coletivos na contemporaneidade.
Analucia@taticacom.com.br