Fórum Abrasca

PROTEÇÃO & GERAÇÃO DE VALOR EM TEMPOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

O que lideranças como Guilherme Leal, Ranan Tata, Richard Brenson e Paul Polman têm em comum? Além de apresentarem perfis inovadores e estarem à frente de grandes corporações, eles compartilham a visão de um futuro zero carbono. Junto a um grupo de 12 CEOs, reunidos na iniciativa B Team, eles conclamam que os líderes globais estabeleçam um consenso para equilibrar as emissões líquidas de gases de efeito estufa a zero até a metade do século por meio da definição de um acordo climático global em Paris, em dezembro deste ano.

Em outra frente, investidores assumiram o compromisso de descarbonizar US$ 100 bilhões de seus portifólios por meio do lançamento da Portfólio Decarbonization Coalition, durante a Cúpula do Clima, em Nova Iorque, em setembro de 2014. A iniciativa conta com a participação de grandes investidores como o fundo de pensão norueguês AP4 e a gestora de ativos Amundi, bem como do CDP e da UNEP-FI.

Diante desses sinais, já não é mais possível ignorar os riscos das mudanças climáticas. No entanto, a abordagem tradicional de gestão de riscos não dá conta de proteger os negócios dos efeitos das mudanças climáticas. A fim de reduzir a vulnerabilidade dos seus negócios as empresas deverão trabalhar cada vez mais com o planejamento de contingências. Esse foi um dos pontos centrais das discussões da 1ª Conferência Abrasca e CDP: Mudanças Climáticas e Mercado de Capitais que reuniu representantes de empresas, investidores, especialistas e analistas de mercado.

Os debates foram muito ricos e sinalizaram para uma conclusão importante: a principal característica que distingue os líderes é sua capacidade de orientar decisões corporativas olhando para o futuro. Futuro esse em que a competitividade das empresas será ainda mais determinada por sua capacidade de gerenciar recursos naturais, dado seu crescente risco de escassez.

Companhias que adaptarem seus modelos de negócio e operações aos riscos e oportunidades das mudanças climáticas irão liderar os próximos ciclos de crescimento.


Business case para redução de emissões

Se comportar de uma maneira mais sustentável deixou de ser uma posição elegante e passou a ser um imperativo comercial. Essa pressão vem dos mais variados stakeholders e tem no CDP um exemplo notório. Anualmente, a organização envia um pedido de informação sobre mudanças climáticas e gestão da água a mais de 6.000 empresas de todo o mundo. Essa solicitação é enviada em nome de 822 investidores globais que juntos administram US$ 97 trilhões em ativos e clientes corporativos que detêm um poder de compra de mais US$ 1,6 trilhão.

Em 2008, o Walmart, fez mais do que responder ao CDP, a empresa fundou junto à organização o Programa Supply Chain, exigindo de seus fornecedores o relato de emissões e gestão de riscos e oportunidades climáticas através do CDP.

Começou chamando seus mil fornecedores chineses para uma reunião como representantes do governo chinês e do CDP. Os executivos do Walmart apresentaram metas agressivas que a empresa havia estabelecido para construir uma rede global de abastecimento mais responsável do ponto de vista ambiental e social. Eles anunciaram que essas exigências seriam aplicadas para todos os seus fornecedores da China em 2009 e expandida para fornecedores ao redor do mundo a partir de 2011. Os critérios exigiam que as 200 principais fábricas das quais o Walmart obtém seus materiais atingissem uma melhora de 20% na eficiência energética já em 2012.

O Walmart foi uma das únicas duas empresas que compõe o índice Down Jones Industrial Average, que registraram valorização em 2008 (aumento de 18% no ano). Esse desempenho foi em grande parte atribuído aos seus esforços de sustentabilidade.


Resolver a crise do clima é a SAÍDA para a crise econômica

O economista Joseph Stiglitz, ganhador do prêmio Nobel, ressaltou que as alocações financeiras são impulsionadas por sinais do mercado. No entanto, esses sinais são distorcidos porque as nações "atribuem um preço” zero a muitos dos recursos inestimáveis do mundo (como um clima estável ou a ameaça de concentração de gases de efeito na atmosfera, por exemplo). “Não surpreende que isso tenha conduzido a resultados ineficientes, com níveis de emissão excessivamente elevados e muito pouco esforço dedicado à conservação e a à pesquisa da energia”, ressalta Stiglitz. Segundo ele, definir um preço forte e estável para o carbono é o plano de ação que está propenso a causar o maior efeito na melhoria da eficiência econômica e no gerenciamento da crise do clima.

Em seu livro Plano B, Lester Brown reproduz um testemunho de Oystein Dahle, ex-vice-presidente da Exxon na Noruega. Nas palavras do executivo, “O socialismo desmoronou porque não permitiu que o mercado contasse a verdade econômica. O capitalismo poderá desmoronar porque não permite que o mercado conte a verdade ecológica”.

Atentas a esse cenário, algumas empresas estão assumindo uma postura proativa e se antecipando a regulações mais restritivas na área de mudanças climáticas. A forma como muitas delas decidiram adaptar seus modelos de negócios foi estabelecendo um preço interno para o carbono. Segundo o estudo do CDP “O Uso Corporativo da Precificação de Carbono”, 150 empresas do universo de respondentes do CDP já estabelecem um preço interno para o carbono, que varia de US$ 6 a US$ 60 por tonelada. Entre essas empresas, estão cinco da América Latina: Braskem, BRF Foods, Cemex, Cemig e Natura; quatro das quais companhias abertas brasileiras.

Ainda segundo o estudo do CDP, 638 empresas relataram que regulações relacionadas à precificação de carbono (cap and trade & impostos de carbono) apresentam oportunidades para os seus negócios. Outras 212 informam que estão se engajando diretamente com formuladores de políticas em favor da precificação de carbono.


Gestão dos negócios em tempos de recursos escassos

O relatório global de riscos do Fórum Econômico Mundial, resultado da consulta com lideranças políticas e do setor privado, apontou o risco de uma crise global de água como a principal ameaça que afetará o planeta ao longo da próxima década. A água é um exemplo emblemático de como as mudanças climáticas apresentam, ao mesmo tempo, riscos e oportunidades. Além de lidar com chuvas intensas e inundações, é preciso apresentar soluções para o fato de que mais de um bilhão de pessoas, uma em oito ao redor do mundo, não têm acesso à água potável, situação que só vai piorar com o agravamento das mudanças climáticas.

As secas que ameaçam a agricultura na China e as geleiras que estão derretendo e limitando a água na Bolívia, bem como o racionamento de água em grandes cidades na Califórnia e em São Paulo, levaram analistas da Goldman Sachs a concluir que a água será “o petróleo do próximo século”.

Não há mais dúvidas quanto à urgência de se firmar um forte compromisso – formal e o mais amplo possível – com metas materiais de descarbonização da economia mundial. Nações que não mostrem forte compromisso com um novo modelo de desenvolvimento econômico tendem a ficar alijadas também das oportunidades de ganho. Uma matriz econômica sustentável que viabilize a estabilização climática aumenta a longevidade dos projetos e reduz o risco associado às catástrofes naturais, elevando a geração de riqueza.

Para as grandes corporações o cenário também não é diferente. Os líderes de hoje só serão líderes também nos próximos cinquenta anos se mostrarem capacidade de internalizar o risco iminente de escassez de recursos hídricos e o desafio de reduzir suas emissões de carbono.

A eficácia dos esforços nesse sentido depende, necessariamente, de um diagnóstico de alta qualidade da real utilização de recursos hídricos e de emissões de carbono por parte da companhia e consequente de suas operações.

O arcabouço de informações administrado pelo CDP, na América Latina e no mundo é, sem dúvida, a melhor ferramenta para as companhias abertas brasileiras manterem seu papel de liderança regional. O Brasil já representa 90% do conjunto de respondentes do CDP na América Latina e sua posição de liderança certamente irá se consolidar no horizonte até 2050. Quanto maior for sua utilização como ferramenta de disclosure por parte das companhias abertas e de sua cadeia de suprimentos, maior será sua capacidade em antecipar riscos e enxergar oportunidades para os líderes do futuro.



Juliana Lopes
é CEO do CDP Latin America.
juliana.lopes@cdproject.net

Antonio D. C. Castro
é presidente da Abrasca e chairman do CDP Latin America.
antoniodccastro@abrasca.org.br


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