Enfoque

GESTORES DE FUNDOS: RACIONALIZAÇÃO NOS NOVOS TEMPOS...

As notícias que vem de fora são verdadeiras. Não falamos de fake news. Faz pouco tempo, os investidores começaram a olhar para os mercados emergentes, principalmente para o Brasil, com mais benevolência. Diria que com sofreguidão. Os retornos de nossas companhias listadas, bem como as perspectivas num prazo maior são alvissareiros. Como os preços andavam historicamente deprimidos, chegou a hora da virada.

Mas puxaram o freio vermelho de emergência. A crise política vai se infiltrar nas relações públicas e nas de investidores. E mesmo as companhias que necessitam se financiar entendem que via dívida ou “governo” ficou inviável. Mas nessa hora, o RI deve ficar atento para outras ocorrências concomitantes.

O mercado nos EUA anda muito, muito nervoso, com a indecisão na política monetária, e mesmo indecisão ontológica sobre o que vai acontecer com Trump de capitão, suas políticas tributárias, enfim, uma série de fatores. Portanto os fundos olham para os “outliers”, pontos fora da curva, nos mercados emergentes. E seria bom ficar por dentro de certas tendências.

Muitas companhias brasileiras pensam em desbravar novos mares e mercados em busca de investidores. Como no Oriente Médio e Ásia. Nesse momento não seria má ideia. Mas a grama do vizinho ao lado anda verdinha. Quando a companhia tiver um roadshow marcado para Nova York ou Boston, vale saber que as cidades americanas consideradas de “second” ou “third tier” podem surpreender.

Fizemos na Ipreo uma filtragem, e nos fundos com 10% de investimento em Lat Am nessas cidades, temos cerca de U$ 38 bi em AUM. Como comparação, no Rio e em São Paulo temos U$ 44 bi em AUM. Ou seja, caso o RI queira estender sua viagem para visitar outros centros, temos um Brasil quase que inteiro a ser visitado. E com uma correlação forte, pois são fundos com boa parte do portfólio na região, já cientes das particularidades desse tipo de investimento.

Mas o que o IRO deve fazer agora já é outra espécie de trabalho antecipatório. Essa bonança que vivenciamos, em parte nos mercados de capital, não estava apenas anunciada, mas já ocorria. Por exemplo, notamos que já no segundo trimestre de 2016, uma observação nas “compras” demonstrava uma forte tendência em relação à América Latina, principalmente por parte de Europa e América do Norte.

Foi quando o famoso investidor Mark Mobius começou a dar entrevistas em que se mostrava otimista em relação ao Brasil. O Ibovespa já apresentava uma alta, que diria ser inicialmente de correção, dada a depreciação dos ativos...

Se pensarmos na característica e “qualidade” desses investidores, o percentual de investimento passivo no país subiu de 19.1% no início de 2015 para 20.5% no ano passado. Os investidores ativos constituem ainda 80% do mercado. Mas a sintonia da base acionária passa a ser algo mais importante ainda na hora de escolhas em roadshows ou one-on-ones... Temos observado de ano a ano uma mudança para um perfil mais longo, e fundos alternativos ou hedge permanecem...

Uma pesquisa recente da Ipreo visou esclarecer quais seriam os quatro mais potentes “screens” negativos de investimento, ou seja, fatores que mais pesariam na hora de investir e se reunir com companhias e emissores. Em primeiro temos a “governança corporativa” com 37%. Ela veio seguida por “falta de transparência adequada”, com 33%, falta de consistência na comunicação com 20%, e regulamentações e política com 13%.

Ou seja, como na vida, a resposta para os problemas de sua companhia vem de dentro. A transformação não vem a cabo de externalidades. Adpate sua companhia a uma estrutura moderna e transparente de governança para sobreviver. Falamos sobre isso já quase há dois decênios, mas ainda temos recalcitrantes que lutam contra moinhos de vento.

Se a questão é a região, veremos que em outras paragens, fundos soberanos no Oriente Médio continuam a tirar o gerenciamento de muita grana das mãos de gestores externos, mantendo a maior parte do bolo in-house. Os investidores passivos, como noticiado alhures, não param de crescer. Inclusive isso se torna critério para fundos soberanos. Hoje em dia o Norges possui praticamente 2% de todas as companhias européias listadas em bolsa. Foram U$ 90bi retirados de gestores externos nos últimos dois anos.

Não leve isso a mal, ou como se fosse algo pessoal, mas há a tendência. Eles estão mais ativos do que antes, e dados sobre as interações de Abu Dhabi com fundos demonstra isso. Voltando a território mais conhecido, em Setembro agora, o Alaska Permanent Fund lançou um programa de investimentos de cinco anos que visa dobrar os valores que gerencia internamente. Hoje em dia cerca de U$ 55 bi encontram-se sob gestão. Portanto a crise e incerteza chegaram e chega a hora de trabalhar dobrado.

O fundamental é estar municiado de dados e informações analíticas… Somente assim aumentam suas chances de tocar um programa com êxito.

Sorte a todos, pois.
 

Fernando G. Carneiro
é managing director da Ipreo para a América Latina
fernando.carneiro@ipreo.com


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