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Os efeitos devastadores da COVID-19 estão refletidos nos vários continentes e tanto esses efeitos quanto o final da pandemia são altamente incertos. O momento ainda é de elevado nível de perplexidade. Como o Estado, as empresas e as demais organizações da economia devem agir? Como as pessoas podem reagir à reclusão, por motivos de sobrevivência e manutenção da saúde, considerando a queda da economia? Como a depressão econômica será superada? Como serão enfrentadas a contenção da demanda e oferta de muitos produtos e serviços,a paralisação de atividades organizacionais e as perdas de empregos?
Estas e outras questões são fundamentais para analisarmos o cenário da COVID-19 e o que fazer no presente e no pós pandemia. E para isso,consideramos neste artigo os quatro blocos de avaliação dos fundamentos do MGS:
Para cada um desses blocos,desenvolvemos uma análise sobre racionalidade e criatividade, objetos do artigo anterior publicado nesta Revista RI, à luz das ideias do grande pensador Max Weber. Curiosamente, esses dois conceitos são correspondentes aos dois hemisférios do cérebro humano, o que notamos durante a elaboração do citado artigo. A nosso ver, os preciosos cérebros que integram uma organização terminam por criar uma espécie de grande cérebro corporativo, capaz de enfrentar os mais variados desafios.
Iniciemos pelo Bloco 1 – Comprometimento ético, relembrando que ele envolve três fundamentos de um Modelo de Gestão Sustentável (MGS), quais sejam: 1. Ética; 2. Alinhamento, Governança & Sustentabilidade; e, 3. Modelo de Gestão Sustentável (MGS).
Do ponto de vista da racionalidade, em tempos de uma realmente grande crise (estamos tratando de guerra, revolução, pandemia), o mundo tende a se adaptar através de um conjunto de ações para minimizar impactos, as quais podem colidir frontalmente com os próprios princípios e valores das organizações, por questão de sobrevivência a curto prazo: redução irracional de custos, demissão em massa, quebra de contratos e a suspensão de pagamentos de obrigações e impostos, por exemplo.
Como um MGS ajuda na racionalidade? Este assegura a importância da conduta ética, mantem alinhados os administradores e gestores, suportados por uma governança e gestão sustentáveis, com um plano de contingência robusto, que busca assegurar às organizações atravessarem a crise mantendo-se fiéis aos seus princípios e valores, com espírito de empreendedorismo.
A racionalidade inerente a um MGS ajuda organizações a criar e implementar soluções direcionadas à proteção de seus funcionários, de sua cadeia de produção, dos compromissos assumidos com a sociedade e com o Estado, mantendo a responsabilidade ambiental. Pode parecer utopia, mas trata-se de uma questão de sobrevivência a longo prazo. Este é o diferencial racional da decisão tomada por gestores que investem no futuro de suas organizações, cujos resultados são maturados a longo prazo. Atitude, resultados e reconhecimento social serão distintos daqueles resultantes da visão e ação de curto prazo. Racionalmente falando, em um contexto globalizado e fortemente interconectado, que não haja ilusão: a sociedade perceberá diferenças e penalizará as condutas consideradas antiéticas. Em referência ao título de um conhecido filme, observamos que será impossível, em um grande número de situações, deixar de ver “o que alguns fizeram no verão passado”.
E como um MGS ajuda na criatividade diante de uma forte crise? As organizações que criam e adotam um MGS investem em soluções criativas, direcionadas à implementação de curto e médio prazos e com efeitos de longo prazo, abrangendo gestão estratégica de receitas e custos, revisão dos contratos de trabalho, com redução da carga horária sem demissão, manutenção dos contratos de fornecedores com soluções que envolvam maior tecnologia, bem como a negociação dos pagamentos das obrigações e impostos, com aproveitamento da legislação própria para a crise em vigor.
Boa parte das soluções citadas requer, além de criatividade, velocidade e este é um poderoso diferencial das organizações que têm um MGS: capacidade de tomada de boas decisões em tempo hábil, pois o tempo, em crises agudas,pode significar sobrevivência, assim como no caso da saúde dos seres humanos. Muitas organizações adaptam o canal de distribuição do produto ou da prestação de serviço, antes fornecidos no próprio estabelecimento, para, respectivamente, entrega integral para os clientes e atendimento virtual.
Um exemplo recente, no Brasil, de reação ágil em relação à COVID-19, é o das universidades, que apresentavam, em média,20% de educação à distância para o ensino presencial, e se adaptaram para atender aos alunos em uma semana, no máximo. Algumas migraram totalmente para a plataforma digital em apenas 48 horas. Com certeza essa velocidade de transformação da indústria de educação irá refletir positivamente nos resultados das organizações de ensino, que manterão o conteúdo para seus alunos, garantirão razoável estabilidade do fluxo de caixa e estabelecerão um “novo normal”: a procura maior pela educação à distância e por ofertas diferenciadas de serviços para atender a essa nova demanda. Os mundos físico e virtual tendem a se integrar em muito maior medida, o que significa gerações de pessoas formadas em uma nova ordem de ensino, capacitação e desenvolvimento de talentos, na qual milhões de computadores e aplicativos se tornam extensões de (por vezes, muito belos!) campi universitários.
Passemos para o bloco 2 – Visão sistêmica, alinhamento e gestão de riscos. Este bloco engloba quatro fundamentos, a saber: 4. Abrangência da visão de grupo; 5. Alinhamento dos cinco vértices da Estrela de Galbraith; 6. Sustentabilidade e gestão de riscos; e, 7. Obrigações formais e boas práticas. Apenas para lembrar, a Estrela citada abrange as cinco principais dimensões de uma arquitetura organizacional, ou seja, o desenho ou projeto de uma organização, vistas adiante.
Em tempos de crise, caso de uma pandemia como a COVID-19, as organizações podem, racionalmente refletindo, ter conflitos, em função das decisões tomadas, as quais podem prejudicar um grupo internamente. Conforme suas práticas, podem decretar, alegando a defesa do curto prazo, mais adiante – ou pouco mais adiante –, o fim da organização.
Ainda do ponto de vista da racionalidade, as organizações que criam e adotam um MGS, frente a uma pandemia, mantêm a visão abrangente sobre a realidade e sobre sua arquitetura organizacional e suas cinco dimensões básicas: estratégia, estrutura, processos &tecnologia, pessoas & e cultura e sistema de recompensas (Estrela de Galbraith). Elas preservam o alinhamento entre esses vértices, mitigam conflitos internos através de canais apropriados e fazem gestão de riscos e compliance de acordo com as exigências legais e com boas práticas de mercado. No que tange à gestão de riscos, providenciam planos de contingência com grande nível de racionalidade, zelando por sua reputação.
Adicionalmente, organizações que criam e implantam um MGS têm maior capacidade de responder com criatividade à crise instalada pela COVID-19, pois buscam uma arquitetura organizacional eficiente, eficaz e flexível. Elas são capazes de produzir resultados mais abrangentes do que aqueles meramente financeiros, com harmonia entre sócios e alta gestão e com respeito aos stakeholders. Ademais, essas organizações materializam a gestão eficiente da sustentabilidade em três dimensões clássicas: econômica, social e ambiental. Consideremos, como exemplo, o caso de uma empresa multinacional da área de produtos de limpeza e pessoal, participante do Índice de Sustentabilidade – ISE da B3 e listada como uma das 100 empresas mais sustentáveis do mundo, que adotou medidas imediatas para a contenção dos danos aos stakeholders:
O bloco 3 trata da capacitação de líderes e abrange seis fundamentos, correspondente a capacitações em: 8. Estratégia; 9. Estrutura; 10. Processos & Tecnologia; 11. Pessoas & Cultura – aspirações das pessoas e sua gestão; 12. Pessoas e Cultura – cultura organizacional; 13. Sistema de Recompensas. As capacitações dos demais colaboradores da organização, também fundamental, é um dos objetos do bloco 4, visto adiante.
Do ponto de vista racional, as organizações, diante da crise provocada pela COVID-19, com severas restrições de caixa, certamente cortarão os gastos com capacitação de líderes e demais colaboradores, além de gastos com pessoal (bloco 1), como consequência da prévia análise de sobrevivência a curto prazo via redução de custos.Mas esta não é a lógica de um MGS, que induz as organizações a manterem a capacitação da liderança e usufruírem dos benefícios dos resultados desta capacitação, tornando sua força de trabalho mais preparada para fazerem as mudanças necessárias, de forma inteligente e com visão de longo prazo.
Não nos iludamos: fazer cortes será preciso, diante de uma crise tão severa. Ao mesmo tempo, cortes poderão ser feitos à luz da gestão estratégica de receitas e custos e focando a capacitação e o desenvolvimento de pessoas para novas necessidades que o momento e o pós pandemia exigirão. O rápido movimento das universidades do ensino presencial para a plataforma digital e a preparação dos professores e alunos para a utilização dessa última provam que há espaço para criatividade e inovação, ou seja, para o “novo normal”, que garanta a qualidade de ensino aos alunos e potencialização do conhecimento.
O bloco 4, por fim, tem sete fundamentos relacionados ao bloco 3 e traduz a inteligência construtiva de um MGS, abrangendo a gestão dos seguintes itens: 14. Estratégia – concepção e planejamento; 15. Estratégia – implantação; 16. Estrutura; 17. Processos & Tecnologia; 18. Pessoas & Cultura – temas críticos; 19. Pessoas & Cultura – desenvolvimento de Lideranças; e, 20. Sistema de Recompensas.
Neste ponto, ressalta-se: organizações podem não ter estratégias corporativa e de negócios definidas, uma estrutura de poder racional e divulgada, processos & tecnologias ajustados e documentados, pessoas capacitadas para o que é necessário– e elas precisarão de investimentos em capacitação para a nova ordem –, bem como sistemas de recompensas coerentes com o contexto. Aliás, tais organizações podem ter uma cultura extrativista de curto prazo, carecendo de líderes que possam conduzi-las à superação da crise.
Ao mesmo tempo, as organizações que criam e adotam um MGS, por sua robustez e capacidade de liderança,irão se mobilizar em prol de alianças com a sociedade, organizações do Estado e outras, buscando soluções conjuntas para superar esta crise global. Neste quarto e último bloco, racionalidade e criatividade se tornam fundamentais para enfrentar desafios.
Após estas breves considerações, imaginemos o mundo pós pandemia, com a disponibilização de vacina e tratamentos eficazes para a população afetada pelo coronavírus. Em caráter exploratório e para fins deste artigo, apresentamos a um grupo de quatro executivos e executivas de empresas de diferentes setores uma única pergunta: o que você pensa sobre o que advirá após a crise COVID-19 nas várias sociedades ao redor do Planeta?Desse exercício, emergiram as seguintes percepções:
NO AMBIENTE GLOBAL
NAS ORGANIZAÇÕES
Os 10 itens acima ocorrerão aos estrategistas das organizações? Não sabemos, mas temos uma certeza: este é um momento de liderança. Cabe aos líderes organizacionais repensar suas organizações melhor do que jamais o fizeram. O cérebro corporativo citado inicialmente será necessário como nunca foi: racionalidade e criatividade, serão fundamentais para atravessar o oceano revolto da crise, suportadas por ferramentas como perguntas críticas, painéis de indicadores críticos (dashboards) e novos modelos mentais.
Por fim, lembramos os nossos leitores de que muitas mentes estão concentradas, neste momento, em entender o presente e repensar o futuro, bem como em identificar o que precisa ser feito para enfrentar os desafios que a pandemia ora impõe aos habitantes deste mundo. De acordo com o Banco Mundial (World Bank – WB, blog da Instituição), governos e serviços de emergência estão se concentrando nas necessidades imediatas: aumentar a capacidade dos hospitais, combater a fome e proteger empresas e famílias de despejos e falências.
Adicionalmente, a maioria dos fundos do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional (FMI), outros bancos regionais de desenvolvimento ou bancos centrais ora procura fornecer recursos para equipamentos de proteção em hospitais, estabilizar instituições financeiras, pagar empresas para fornecer bens e serviços a trabalhadores essenciais ou fornecer apoio monetário direto às famílias.E conforme observa o WB, alguns países estão se mobilizando para a recuperação pós COVID-19. O WB elaborou uma lista de verificação de sustentabilidade para os formuladores de políticas, ainda em discussão, a qual, dada sua imensa importância para o momento atual, reproduzimos nesta Revista RI, a seguir. Conforme se nota, presente e futuro podem ser resumidos em duas palavras: muito trabalho.
PROPOSTA DE LISTA DE VERIFICAÇÃO DE SUSTENTABILIDADE
PARA AVALIAÇÃO DE INTERVENÇÕES DE RECUPERAÇÃO ECONÔMICA (WB)
I - CONSIDERAÇÕES DE CURTO PRAZO (6-18 MESES)
IMPACTO NO EMPREGO
IMPACTO NA ATIVIDADE ECONÔMICA
OPORTUNIDADE E RISCO
II - CONSIDERAÇÕES A LONGO PRAZO
IMPACTO NO CAPITAL HUMANO E SOCIAL
IMPACTO NAS TECNOLOGIAS
IMPACTO NO CAPITAL NATURAL E CULTURAL
IMPACTO NO CAPITAL FÍSICO
IMPACTO NAS FALHAS NO MERCADO FUNDAMENTAL
RESILIÊNCIA AUMENTADA E CAPACIDADE ADAPTATIVA
DESCARBONIZAÇÃO E CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL E RISCOS A LONGO PRAZO
Caros leitores, esperamos que todos estejam bem de saúde e seguros ao lado de suas famílias. Sabemos que não será fácil a superação da crise COVID-19. Em que essa crise difere de outras enfrentadas pela humanidade ao longo de sua história? Em sua magnitude e abrangência, que exige, ao lado da racionalidade e da criatividade, muita solidariedade, indo além de fazer o básico e focando também no que é necessário. E nesta 60ª edição da coluna Orquestra Societária desta Revista RI, reiteramos, uma vez mais, como sempre temos feito, a importância dos Modelos de Gestão Sustentáveis (MGS), instrumentos que podem ajudar na construção de um futuro melhor para as organizações e, portanto, para o Planeta.
Cida Hess
é economista e contadora, especialista em finanças e estratégia, mestre em contábeis pela PUC SP, doutoranda pela UNIP/SP em Engenharia de Produção - e tem atuado como executiva e consultora de organizações.
cidahessparanhos@gmail.com
Mônica Brandão
é engenheira, especialista em finanças e estratégia, mestre em administração pela PUC Minas e tem atuado como executiva e conselheira de organizações e como professora.
mbran2015@gmail.com