Apesar de o mercado de capitais norte-americano ter se acostumado com grandes escândalos midiáticos envolvendo casos de insider trading (do qual Martha Stewart talvez seja o exemplo mais emblemático), o ano de 2013 merecerá um capítulo especial na história da repressão ao insider trading nos EUA. Na esteira do escândalo do fundo de hedge SAC Capital, o mercado viu com perplexidade a imposição de multas que alcançaram US$ 1,8 bilhões de dólares (maior multa por insider trading já aplicada na história americana) e condenações penais que chegaram a 45 anos de prisão.
A comparação com o mercado brasileiro pode dar ao leitor a falsa impressão de que a repressão ao insider trading ainda não desembarcou em terras brasileiras. É inegável que o número de condenações e o montante das multas ainda não se comparam à prática norte-americana mas, ainda assim, a avaliação atenta da atuação da CVM na repressão ao insider trading no Brasil conta uma história que deve ser lida com muita atenção por todos aqueles envolvidos no mercado de capitais, notadamente os departamentos de relações com investidores, que podem assumir um papel relevante de prevenção a esta prática.
Estudo recente elaborado pelo escritório Stocche Forbes advogados revelou que, nos últimos 6 anos, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou um número aproximadamente 66% maior de casos de insider trading do que no mesmo período anterior, sendo que parcela expressiva dos casos que efetivamente resultaram em condenações envolviam agentes ligados diretamente à Companhia (administradores, ex-administradores e funcionários). As multas aplicadas nestes casos também mudaram de patamar e aproximaram-se dos 7 dígitos, alcançando em alguns casos, valor superior a R$ 20 milhões, montante muito superior às multas aplicadas no início dos anos 2000 (data de início do período pesquisado), sem prejuízo de investigações criminais promovidas pelo Ministério Público Federal com base em convênio firmado com a CVM.
Ao olhar de forma detida este cenário, salta aos olhos a constatação de que parcela significativa das condenações por ilícito de insider trading no Brasil envolvam administradores (diretores ou conselheiros) ou funcionários de companhias abertas, conhecidos no jargão como “insiders internos”. A constatação não é, contudo, de difícil explicação.
Do ponto de vista da regulação da CVM, comete o ilícito de insider trading aquele que utiliza informações privilegiadas, ainda não divulgadas ao mercado, para auferir vantagem na negociação com valores mobiliários, ainda que a operação não resulte em lucro. Dado o caráter eminentemente intangível da informação, a CVM (a quem cabe o ônus da prova do fato ilícito cometido pelo acusado) invariavelmente encontra dificuldade em reunir um conjunto probatório que ateste, de maneira inequívoca, que um determinado agente tinha conhecimento da informação privilegiada quando da negociação de valores mobiliários e que, portanto, cometeu o ilícito.
Diante da dificuldade inexorável de construir a prova, a CVM, seguindo tendência internacional neste sentido, cristalizou o entendimento de que recai sobre determinados agentes (como é o caso dos insiders internos - administradores e funcionários), em função de sua posição dentro da empresa, uma presunção relativa (presunção que pode ser afastada por meio de prova em contrário) de posse da informação privilegiada.