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Ponto de Vista |
A privatização é parte da solução dessa crise. Nenhum governante gosta de vender empresas, mas a crise fiscal não será superada sem isso. O desequilíbrio das contas públicas é o assunto da hora. A necessidade de ajuste é reconhecida por todos. O problema é como fazer.
Diminuição significativa de gastos é limitada pelo grande percentual de despesas vinculadas, em especial na Previdência e área social, e pela falta de disposição política do governo de cortar Ministérios e cargos. Aumento de impostos aparece como alternativa, com a CPMF sendo aparentemente a única opção. Mas dada a já elevada carga tributária, qualquer iniciativa de aumento de tributos é barrada no Congresso Nacional antes mesmo de irem à votação.
Mesmo a troca de Ministro não trouxe muitas mudanças. Imaginava-se que com um novo comando na Fazenda, com perfil mais governista que Joaquim Levy, e, portanto, com maior apoio da base do governo, que as reformas necessárias pudessem avançar. Mas Nelson Barbosa não agradou nem a oposição, por conta do frágil pacote de ajuste que apresentou, nem aos apoiadores da Presidente Dilma, por ousar a falar de Reforma da Previdência. A lua de mel com Barbosa se encerrou antes de começar.
A dívida pública sofreu forte aceleração nos últimos dois anos, o que torna ainda mais urgente a obtenção de um superávit primário para inverter uma trajetória preocupante da dívida, que vem alimentando especulações sobre encurtamento de prazos no perfil da dívida. Por isso, o pacote de ajuste anunciado pelo novo Ministro foi mal recebido ao introduzir o conceito de banda fiscal, em reconhecimento da incapacidade do governo prever receitas e garantir corte de gastos.
A crise fiscal também atingiu Estados e Municípios, que estão a reboque do governo federal para tentar ajustar suas finanças, após assistirem passivamente nos últimos anos as despesas subirem muito acima das receitas.
Em reposta ao aprofundamento da crise das finanças estaduais, governo federal flexibilizou as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal. No fim e ao cabo, o que se teme é que as medidas desenhadas como “ajuste fiscal” terminem por aumentar o endividamento público federal.
Nesse cenário, rebaixamento da nota do país pela terceira agência de rating não causou surpresa. A crise política, que paralisa legislativo e o governo, e os gritantes desacertos da política econômica dos anos recentes jogaram o país numa situação onde não se enxerga nem o fundo do poço, nem luz no fim do túnel. Os ajustes propostos não atacam erros fundamentais que levaram ao descalabro nas contas, entre eles o gigantismo do Estado, e pouco avança neste campo. A privatização não foi mencionada uma vez sequer pelo governo federal, que acena apenas com venda de alguns ativos da Petrobras como forma de resolver o problema de curto prazo no caixa da empresa.
A privatização é parte da solução dessa crise. Ela não depende, na maioria dos casos, de apoio do Legislativo. Apenas da vontade política do Poder Executivo em qualquer esfera federativa. Nenhum governante gosta de vender empresas estatais, mas a crise fiscal não será superada sem isso.
No início da década de 1990, o país viveu crise semelhante. Os Estados e municípios, como a União, registraram desequilíbrio financeiro, ainda que por motivos distintos do momento atual. O fim da inflação deixou exposta a fragilidade da situação. Além disso, complementando o esforço de ajuste nas contas da União e buscando maior transparência nas contas estaduais, foram proibidos empréstimos entre Tesouros estaduais e seus bancos.
Sem recursos, a saída foi repetir o que vinha fazendo o governo federal e iniciar a venda de ativos para gerar receitas extraordinárias e contribuir, não só para o ajuste, mas para investimentos em serviços públicos, já que não havia mais recursos estatais para realizá-los.
O Programa Nacional de Desestatização (PND) passou a incluir empresas estaduais, que buscaram no BNDES "expertise" para a privatização. Os exemplos mais notórios são os das empresas de distribuição de energia, além de companhias estaduais de gás, rodovias, bancos, companhias de transportes urbanos e de saneamento.
A crise abre oportunidade para uma nova rodada de privatizações. A lista de ativos federais, estaduais e municipais a serem vendidos pode e deve ser ampliada. Há oportunidades na área de distribuição de gás, transportes e saneamento. A quantidade de empresas, e o montante de recursos a serem arrecadados, é grande. Some-se ainda o plano de desinvestimento da Petrobras e os valores duplicam.
O momento do mercado mundial não é, no entanto, dos mais auspiciosos. O excesso de intervenção do governo, o enfraquecimento da regulação e a insegurança jurídica vêm afastando tradicionais investidores, como evidencia o fracasso do programa de concessões. Sintomático que alguns secretários de fazenda estaduais tenham oferecido ativos como garantia de empréstimos, já que receiam um engarrafamento de ativos a serem privatizados em um ambiente econômico e político tão negativo no país. Mas isso não é solução. Já vimos pela experiência das distribuidoras de energia federalizadas nos anos 90, e ainda hoje controladas pela Eletrobrás, que apenas se transfere o problema da esfera estadual para a federal. Tais empresas absorvem há anos recursos do Tesouro e minoritários sem melhoria na prestação de serviços, e sem perspectiva real de venda, apesar das eternas promessas do governo federal. Com exceção da Celg (Goiás), não há cronograma para a privatização dessas concessionárias.
O processo de privatização exige planejamento. Perderão todos se os ativos forem vendidos sem uma visão organizada do que se pretende para cada setor. Governo Federal, Estados e Municípios deveriam organizar programas de privatização.
O PND precisa sair de sua longa hibernação - e o BNDES deve recuperar sua vocação para coordenar o projeto de desestatização nacional, com lei específica e regras claras.
A gravidade da crise não permite tergiversação. Para além do ajuste fiscal, é hora de reconhecer os benefícios da privatização, apoiar os entes federativos na venda de ativos, ajudando o país a superar seus gargalos na infraestrutura, serviços públicos e, especialmente, diminuir o déficit no saneamento básico.
Elena Landau
é mestre em economia e advogada, sócia do escritório Sergio Bermudes Advogados e diretora-presidente da Elandau Consultoria Econômica Ltda. Foi professora do departamento de Economia da PUC-Rio e Diretora de Privatização do BNDES de 1994 a 1996 (governo FHC). Autora de diversos artigos nas áreas do direito e da economia, com destaque para os temas da Privatização, Energia Elétrica e Organização do Futebol no Brasil.
elenalandau@sbadv.com.br