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Conquistamos ao longo dos últimos anos mais diversidade de gênero nos Conselhos de Administração, mas isso ainda está longe significar Conselhos com perfil mais diverso.
A verdadeira vitória, além dos pré-requisitos de competências, conhecimentos e experiências, ocorrerá quando membros da comunidade LGBTQI+, a diversidade étnica e os jovens estejam presentes em conselhos. Bem disse Roberto Castello Branco na entrevista após o call dos resultados de 2020 da Petrobras: “vencemos a batalha, mas perdemos a guerra”.
Por praticamente um ano na Vale, aprendi muito sobre escuta ativa - um exercício de humildade necessário para reconstruir imagem abalada pelos dois maiores acidentes ocorridos na história das empresas brasileiras, que ceifaram centenas de vidas em segundos. Isso é mandatório após a sua principal liderança ter usado como bandeira “Mariana nunca mais”. Isso é “ESG” - Environmental, Social and Governance (Ambiental, Social e Governança) de verdade!
Assumir assento em uma das principais Companhias brasileiras em maio de 2020, auge da primeira onda da Pandemia Covid-19, foi um exercício de aprendizado importante em uma nova realidade, pois a Vale adotou apenas o regime home office para o seu alto escalão e realização de reuniões virtuais para o Conselho de Administração, e política que impediu visitas técnicas e, por consequência um onboarding adequado para o único de todos os 13 conselheiros eleitos a assumir mandato em 2020.
Ciente do tamanho do desafio e responsabilidade, ainda mais complexos do que experimentado na Eternit com seu processo de recuperação judicial e o banimento da exploração do Amianto Crisotila, ou quando presidi o Conselho de Administração da Usiminas durante a maior disputa societária do Brasil em 2015, e na penúria da Eletrobras no pós-MP 579/12 durante um período que destruiu o setor elétrico brasileiro, busquei contribuir nos assuntos de alto impacto para a Companhia relacionados a questões judiciais, jurídicas, regulatórias e ambientais onde a formação jurídica permitiu-me posicionar-me de forma assertiva em temas caros para a Vale.
Mesmo incomodado com a impossibilidade de conhecer as operações por entender que o conselheiro deve ver e não somente ouvir sobre o “chão de fábrica” para ser efetivo sem assumir o “manche do avião”, foi mais difícil definir a estratégia de negócios tão complexos quando não os conhece, especialmente numa empresa com operações em dezenas de países, já que as responsabilidades inerentes ao mandato são muito grandes, por outro lado eu estava muito motivado com os trabalhos anunciados pelo Comitê de Nomeação para melhoria da governança corporativa da Vale.
Mas no momento em que o Conselho de Administração estava prestes a entregar mudanças importantes na estrutura de governança da Companhia, acabou empacotando tudo em proposta “tudo ou nada”, com inédita sugestão de instituição do “voto-veto” em eleição de administradores. Assim como escuto atentamente e aprendo com meus pares, imaginei que poderia apresentar argumentos que suplantassem o formalismo que sustentou a tese dos Dres. Paulo Aragão e Nelson Eizirik ao defenderem a proposta do voto contrário sob argumento da livre capacidade de contratar das S/As. Mas não consegui ser ouvido.
Devemos celebrar a diversidade de opiniões, assimilar as diferenças em não buscá-la de forma impositiva. Os juristas exploraram palavras utilizadas por quem ousou contestar a inclusão de instrumento semelhante, mas não igual, ao que existe em outros países, cujo mercado de capitais é majoritariamente formado por true corporations. Lá predomina as “uncontested elections” mas o número de candidatos é invariavelmente igual ao número de assentos. Aqui as “contested elections” são muito frequentes pois incentivadas pela legislação que permite que a minoria indique com mais facilidade candidatos ao CA e ao CF, e assim geralmente temos mais candidatos do que assentos.
E o necessário debate acabou tirando um pouco do brilho da proposta, apesar das demais mudanças positivas, o tema acabou gerando a republicação da convocação da AGE, opiniões de experts, na maioria enxergando mais malefícios do que benefícios no voto negativo.
E eu que tive a possibilidade de participar em 2015 de eleição onde a situação semelhante aconteceu, e o Escritório Eizirik Advogados era o contratado pela Usiminas e seu sócio Marcus Henriques foi secretário da Assembleia Geral Extraordinária que elegeu um conselheiro e o presidente do Conselho de Administração onde os votos favoráveis foram inferiores aos contrários, que não foram computados. O resultado foi objeto de questionamento pelo acionista Ternium(*) na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) elaborado pelo Escritório do ex-Presidente da CVM Marcelo Trindade. Presente também no evento, o Escritório Barbosa, Musnich & Aragão por sócio Francisco Musnich que representando o acionista BTG indicou candidato para disputar o mesmo assento, e cuja derrota não foi questionada.
(*) Processo CVM n. RJ-2015-2925 - ”... Já em relação à desconsideração dos votos proferidos pelos signatários do acordo de acionistas na eleição do oitavo membro do Conselho de Administração da Usiminas, cientificamos que, em nosso entendimento, não há a possibilidade do cômputo de votos contrários na eleição de administradores, devendo este, se eventualmente proferido, ser desconsiderado para fins do quórum de deliberação, por força do que dispõe o art. 129 da Lei n. 6.404/76”.
Tanto Aragão quanto Eizirik afirmaram que a decisão da Superintendência de Relação com Empresas (“SEP”) – órgão técnico da CVM – entendendo que voto contrário não é computável em eleição de conselheiro não formou jurisprudência da CVM sobre a matéria em face da desistência do recurso ao Colegiado após três anos aguardando ser pautado para julgamento pelo Colegiado. Mas isso merece reflexão, senão vejamos:
No âmbito judicial isso não é trivial, mas no âmbito administrativo da CVM desistir de um recurso ao Colegiado pode ser estratégico, seja pela composição desfavorável do órgão que vai julgar a matéria, seja exatamente para não formar jurisprudência contrária a acionistas controladores que se valem de acordos de acionistas para escolher os conselheiros que elegem e submetê-los às regras de voto previstas nos referidos acordos.
Nesse ínterim, até o envio desse artigo, a AMEC – Associação de Investidores no Mercado de Capitais emitiu opinião contestando o “voto contrário”, resumindo o texto técnico em três parágrafos:
“Desconsiderar os riscos do uso inadvertido do instrumento significa ignorar o histórico do nosso mercado de capitais. As incertezas são muitas, e não se vê razão para o tema seja colocado sem o devido debate.
A ausência de controlador em Corporations não afasta o fato de que os acionistas de referência continuam a deter posições muito relevantes nessas empresas.
À luz do espírito da lei societária, mecanismos de maior equilíbrio de forças entre os acionistas deveriam também ser pensados para se evitar situações extremas.”
A imprensa também divulgou que as principais casas de recomendação de voto - Institutional Shareholders Service (ISS) e a Glass Lewis - recomendaram a desaprovação dessa matéria, item 8 do Boletim de Voto à Distância. “AGAINST” à “bola preta” - Recomendação que os acionistas votem “contrário” a proposta de inclusão no estatuto de regra que permita que o voto contrário a candidato ao Conselho de Administração seja computável.
Ademais o tema ainda tem sua legalidade dúbia, o que poderá ser esclarecido quando a Superintendência de Relação com Empresas (SEP/CVM) se manifestar.
Enfim, os agentes do mercado já se manifestaram. Caberá agora aos acionistas tomarem a sua decisão na AGE convocada para 12/03/21, pois seus interesses, aprovando ou rejeitando, já estará valendo para escrutínio na AGO de 2021 quando será eleita a nova composição do Conselho de Administração da Vale sob novas regras de governança, e que será responsável por dar sequência ao trabalho até então desenvolvido pelo Conselho “pós Brumadinho”, mas também podendo dar mais foco ao core business - mineração de minério de ferro, níquel e cobre -, alienando ativos non core que mesmo que rentáveis não faz sentido estarem no portfólio de investimentos da Vale, gerando mais retorno de capital aos seus acionistas com uma política de dividendos mais agressiva nos períodos de alta do minério de ferro, assim como dar sequência ao aprimoramento das nossas políticas e práticas de ESG.
Marcelo Gasparino da Silva
é Conselheiro de Administração certificado por experiência - CCA+ pelo IBGC, membro da Comissão Técnica da AMEC e conselheiro de administração independente da VALE.
marcelo@gaspa.com.br