Educar seus filhos para lidar com dinheiro pode definir se, no futuro, eles serão pessoas bem-sucedidas financeiramente ou se viverão correndo atrás dos prejuízos todo final de mês. E, nesse caso, educar também é impor limites. As lições podem começar desde cedo. Uma criança com quatro anos de idade já pode participar de algumas decisões simples do orçamento familiar, como a de que não pode ganhar brinquedos sempre que pedir, por exemplo.
Quando falo a respeito desse assunto, em palestras para escolas de ensino fundamental e médio, os pais normalmente perguntam: “mas mostrar que não posso comprar não vai frustrar meu filho?”. Na verdade, a frustração ocorre sempre, e ela faz parte do aprendizado. Afinal, que adulto nunca se sentiu frustrado?
No mundo adulto, as frustrações fazem parte do dia a dia. Segundo os psicólogos, a frustração é um sentimento que ocorre quando há um desejo, uma expectativa, um objetivo a ser cumprido ou atingido e, no decorrer do percurso, surgem impedimentos. Por exemplo, quando alguém está com pressa de chegar a um compromisso e não consegue vaga de estacionamento. Ou, quando uma pessoa quer ir à praia em um dia de sol e tem que finalizar o relatório exigido pelo chefe. Todos os dias frustramos alguns de nossos desejos.
O que diferencia um adulto de uma criança é a sabedoria para lidar com as frustrações de uma maneira madura. Um adulto bem estruturado entende as diversas frustrações que a vida lhe impõe sem prejudicar sua qualidade de vida. Se as frustrações são inevitáveis, resta aprender a lidar bem com elas. Já indivíduos com baixa tolerância à frustração, freqüentemente comportam-se de forma imprópria, geram problemas de relacionamentos interpessoais, sofrimentos materiais e emocionais a si e ao outros.
A maioria dos pais costuma concordar que as crianças precisam aprender a lidar com frustrações, mas poupam os filhos por tempo demais. Querem prolongar a infância dos filhos enquanto puderem. Acabam criando adolescestes que se comportam como crianças. Esses indivíduos se tornam adultos que agem como adolescentes mimados, sem aceitar limites e normas por não terem aprendido a lidar com as frustrações quando deveriam.
É interessante notar que as famílias que mantém fortunas por várias gerações criam seus filhos dentro de princípios financeiros rígidos. Desde a mais tenra idade, mostram aos herdeiros que dinheiro precisa ser cuidado e que existem limites para os gastos. Sabem que para ter pessoas capazes de gerenciar grandes complexos empresariais, precisam ter filhos capazes de ter uma relação saudável com o dinheiro. Trabalhei como Planejador Financeiro de muitas famílias detentoras de grandes patrimônios e, muitas vezes, me surpreendia pela rigidez com que o dinheiro era controlado em algumas delas.
Já em famílias de classe média alta, descontroles financeiros são mais comuns. Muitas vezes, os pais querem dar aos filhos tudo que não tiveram quando eram jovens. Esse comportamento é extremamente danoso. Os filhos crescem com a percepção de que o dinheiro cai do céu. Quando entram no mercado de trabalho, descobrem que seu salário não é suficiente para sustentar o nível de consumo a que se acostumaram, o que os desestimula para procurar e manter seus empregos.
As lições sobre controle dos gastos e a importância de poupar podem ser dadas de forma simples. Quando meu filho tinha nove anos pediu-me uma prancha de surfe. Queria muito dar o presente a ele, mas o aumento no consumo de energia elétrica em minha casa me incomodava. Sentei-me com o garoto e tratei com ele que cada real economizado da conta de energia seria poupado para a compra da prancha. Os aparelhos de tevê passaram a ser desligados sempre que não estavam em uso e só eram acesas as lâmpadas dos ambientes ocupados. Depois de alguns meses, ele ganhou o presente que tanto queria.
Vendo o sucesso do irmão, minha filha mais velha logo quis uma oportunidade semelhante. Em vez da conta de luz, ela passou a controlar a conta do telefone e as economias serviram para uma viagem para a Disney. O impacto que aquelas economias fizeram no meu orçamento foi pequeno, porém, na educação dos dois foi imenso.
Frustração é muito diferente de trauma. Frustração é algo que as pessoas vivem, mas que não tira a vontade que têm de enfrentar novos desafios. Já o trauma pode incapacitar alguém para enfrentar situações semelhantes. Assim, não é recomendado que você diga a seus filhos que eles não podem ter ou fazer algo que queiram, mas, sim, que precisam fazer sacrifícios para conseguir realizar esse desejo. Procure não usar frases que possam desestimular a buscar pela conquista. Antes de tudo, diga que tudo é possível mediante algum sacrifício e questione se esse sacrifício vale a pena.
Por exemplo, se seu filho perguntar por que você não tem um carro tão bonito quanto o de seu vizinho, você pode dizer a ele que, para conseguir comprar um carro como aquele, precisaria trabalhar muitas horas a mais e ficaria menos tempo com ele. Verifique o que ele pensa sobre essa escolha. Se ele achar que vale a pena, expresse claramente que esta não é sua opção, mas que, quando ele se tornar um adulto, poderá escolher da forma que preferir. Também mostre a ele que irá precisar de uma boa formação educacional para poder conquistar objetivos como esse.
Finalmente, tente ensinar a seus filhos os prazeres da vida que têm baixo custo. Compartilhe com eles um piquenique, uma caminhada no parque, um momento de culinária em família ou a leitura de um bom livro. Filhos que aprendem na infância a se divertir sem gastar muito tendem a ter uma vida financeira muito mais tranquila no futuro.
É sempre bom lembrar que a família educa e a escola ensina. Eu e minha esposa sempre dedicamos muito tempo para educar nossos filhos, e isto inclui a educação financeira. Mesmo tendo uma boa condição financeira, nunca demos folga aos nossos filhos. Eles habitualmente tiveram que ajudar nas tarefas da casa e correntemente mostrávamos a eles de onde vinha o dinheiro. Além disso, nos dedicamos a contar coisas positivas do nosso trabalho e envolver os dois em decisões financeiras.
Minha filha entrou na universidade com 16 anos e desde o início começou a trabalhar, hoje aos 27 anos é dona de uma padaria de sucesso em Florianópolis, além do aspecto financeiro a empresa tem uma forte pauta de empoderamento feminino. Ela é casada e o marido é sócio de uma health tech. Meu filho também se formou e hoje é sócio de uma fintech de crédito. Felizmente, meus filhos são unânimes em dizer que a educação e, em especial a educação financeira que receberam em casa, ajuda muito a suportar as agruras de serem empresários no Brasil.
Tenha em mente que educar os filhos para a vida e, particularmente, para terem uma boa relação com o dinheiro é um dos melhores investimentos que você pode fazer.
Jurandir Sell Macedo
é doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
jurandir@edufinanceira.org.br