Orquestra Societária

ENTREVISTA: EDUARDO GOMES, ESPECIALISTA EM ESTRATÉGIA

Mundo pós-pandemia: Cenários e estratégias sob grandes riscos e incertezas

A pandemia COVID-19 mudou o rumo da história da humanidade de forma irreversível. Afetou fortemente sociedades, economias, finanças e a geopolítica. Sob vários aspectos e, de forma ampla, encerrou a vida de milhões de pessoas, de empresas e modelos de negócios ao redor do mundo e gerou sequelas. A contaminação pelo vírus atingiu, indistintamente, todos de forma direta e indireta, sem discriminar classe social, raça, gênero. Se o que aconteceu, e ainda está acontecendo, não tem volta, como definir estratégias e analisar cenários em tempos de incerteza extrema e altos riscos? O que pode ser extraído do caos? Visando refletir sobre estas perguntas, convidamos o empresário Eduardo Gomes, especialista em estratégia, para compartilhar com os leitores da Revista RI suas percepções.

Eduardo Gomes é conselheiro de administração certificado pelo IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – e pela FDC – Fundação Dom Cabral. Atua em conselhos corporativos há aproximadamente 25 anos. Tem de mais de 30 anos de experiência como CEO e executivo C-Level, em empresas de grande e médio portes, como Leroy Merlin, EMH e Mannesmann, com um histórico de sucesso na gestão executiva de projetos complexos e responsabilidades relacionadas ao planejamento estratégico, pesquisa, operações, administração financeira e liderança de equipes.

Eduardo tem formação acadêmica em Engenharia Metalúrgica pela UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais, com pós-graduação em Engenharia Mecânica pela SLV Duisburg (Alemanha), MBA em Marketing pela FGV – Fundação Getúlio Vargas, e especializações em Administração Financeira e Engenharia Econômica pela FDC, além de uma série de outros cursos de pós-graduação em business schools no Brasil e no exterior. É um leitor voraz e entende que necessita ser um eterno aprendiz, que a busca de seres humanos pelo conhecimento não pode parar. Eduardo Gomes é fluente em inglês, alemão, francês, espanhol e italiano, com uma significativa experiência internacional e multicultural.

A agradável conversa com Eduardo Gomes foi realizada virtualmente e durou mais de uma hora, durante a qual falamos sobre os impactos da pandemia COVID-19 na definição de cenários e estratégias, em tempos de grandes riscos e incertezas elevadas a um patamar inusitado, com base em sua vasta experiência corporativa e profundo conhecimento acadêmico. Acompanhe a entrevista.

RI: O senhor tem longa atuação como líder em empresas multinacionais. Qual é a sua percepção sobre a pandemia COVID-19 e o que ela tem provocado?

Eduardo Gomes: Para entender a gravidade dos impactos da COVID-19, compartilho algumas informações de um estudo global sobre a incerteza, tema que acompanho há muitos anos. Elas podem ser resumidas através dos dois gráficos a seguir, que medem a Global Economic Policy Uncertainty. O primeiro gráfico abrange um período de 20 anos, de 1997 a 2017, no qual se percebe que o maior índice de incerteza foi o de 2017, com a political turmoil in Brazil, France, South Korea and others.

Global Economic Policy Uncertainty Index, January 1997 to May 2017 www.PolicyUncertainty

O segundo gráfico, a seguir, abrange o período da pandemia e demonstra o impacto irreversível do quadro de incertezas ao redor do mundo, com o índice ultrapassando o patamar de 400, quando nos últimos anos, mesmo com crises que assolaram o mundo, não passou de 325. Nossa constatação é que a pandemia levou as incertezas a um patamar extremo, turbinando os riscos e criando, por vezes, uma espécie de amálgama entre riscos (o que pode ser mensurado) e incertezas (sem mensuração).

Monthly Global Economic Policy Uncertainty Index

Sobre as informações anteriores, é relevante esclarecer: economistas norte-americanos desenvolveram uma metodologia para cálculo de um índice de incerteza econômica relacionada a políticas públicas diversas, com base em três pilares: (1) cobertura jornalística das incertezas econômicas relacionadas às políticas; (2) número de disposições do código tributário federal definidas para expirar em anos futuros; e, (3) desacordo entre os analistas econômicos como proxy para a incerteza. Conforme se percebe, o índice representado nos dois gráficos anteriores pondera três grupos de elementos muito relevantes. Mais informações importantes para os interessados podem ser vistas na internet (www.policyuncertainty.com/global_monthly.html).

RI: O que as empresas – e os mercados consumidores e financeiros, de forma mais ampla – podem esperar?

Eduardo Gomes: As empresas estão se deparando com patamares escandalosos de dados que remetem à incerteza, vindos de fontes do mercado de capitais, financeiro, regulatório, somados à força das redes sociais e às fake news. O que está em jogo? A qualidade decisória, que pode ser medida por três atributos: precisão, tempestividade e maturidade institucional do processo. São muitos conceitos utilizados para definir os cenários com os quais as empresas estão se deparando: aqui são citados VUCA e BANI entre outros. Em minha opinião, no cenário VUCA, que é o acrônimo dos termos em inglês - volatility, uncertainty, complexity e ambiguity – o “U” é gigantesco. A volatilidade ocorre em virtude da incerteza e os analistas terminam por criar mais cenários. De modo geral, o que o mercado de capitais prever, terá alta probabilidade de acontecer de um jeito ou de outro, pois terá sido testado, com resultados positivos ou negativos.

RI: Diante dessa incerteza extrema, o que fazer?

Eduardo Gomes: A pandemia COVID tornou propício o cenário de inovações. Então, vem logo à cabeça a transformação digital – e disso, eu posso falar bastante, pois estive à frente da transformação digital pela qual passou a Leroy Merlin. Quando emergiu a pandemia, de uma hora para outra, muitas lojas começaram a fechar, mas a empresa parecia estar bem próxima do que eu chamaria de ponto de bala. O que era possível fazer? Vender online. Conforme dito, a percepção é que a empresa estava preparadíssima para o momento. Na verdade, não foi bem assim, houve problemas e gargalos de logística. Nós já tínhamos um plano same day delivery e um plano de entrega em 48 horas. Todos os fornecedores recorreram aos logs, isto é, aos parceiros de logística. Era preciso fazer com os que os produtos chegassem até os consumidores, logística se tornou crucial. Em suma, houve um problema não previsto (risco não percebido), um boom de demanda inesperado, que não foi atendido em seus primórdios. Eis um exemplo pessoal do que houve com o mercado: um motoboy conhecido nosso teve sua moto roubada. Reunimo-nos (uma turma de amigos) e conseguimos arrecadar o valor para que ele comprasse outra moto. Não havia moto para comprar e este exemplo singelo mostra o gargalo ocorrido com a indústria (risco). Este e outros casos ilustram o que as empresas enfrentaram – e ainda enfrentam –em uma fase de incerteza extrema.

RI: Sendo assim, como inovar?

Eduardo Gomes: O mais importante da jornada de inovação é a transformação humana. Para mim, inovação vai além de investir em hardwares, softwares e soluções tecnológicas. E qualidade decisória em tempos de crise é ainda mais crítico diante da incerteza extrema. A qualidade da decisão a ser tomada é responsável por pavimentar e iluminar a rodovia que leva ao futuro da empresa, com DNA de inovação. E as pessoas qualificadas em todas as dimensões são fundamentais para que as decisões disruptivas sejam tomadas. Existem incumbentes, que representam a velha economia, procurando se modernizar e, analisando a história, os insurgentes, guerreiros, tropas pequenas que enfrentam os grandes, que é o que está acontecendo.

RI: Um exemplo disso seriam as Fintechs?

Eduardo Gomes: Empresas que utilizam tecnologia para gerar soluções inovadoras nos diferentes produtos e serviços do mercado financeiro e muitos gigantes do setor já perceberam que as novas empresas têm muito a ensinar, principalmente sobre experiência do cliente. Inovar é estar preparado para realizar mudanças contínuas! É permitir o convívio com novas fontes de geração de capital, baseadas essencialmente em tecnologia!

RI: Como fazer a gestão de riscos em um contexto tão complexo?

Eduardo Gomes: Com a profusão de dados, faço uma provocação – se você não está com confuso, certamente é porque está mal informado. A confusão procede, pois os dados disponíveis realmente críveis são ambíguos. Retornemos ao segundo mês da pandemia (mai/20): os analistas consideravam, naquele momento, que esta duraria somente mais um mês. Ao longo de quase dois anos de pandemia, várias pessoas têm procurado responder à pergunta: como será a recuperação das atividades econômicas? Em V (a economia sofre uma forte queda e reage de imediato), U (cai, permanece durante certo tempo no fundo do poço e sobe) ou L (cai, fica em um patamar mais baixo e não retorna a curto e médio prazos)? Mais recentemente, surgiu o modelo em K (apenas uma parte da economia se recupera). O significado dessa sopa de letrinhas, todos já sabemos: nada disso pode ser comprovado – ao menos, até aqui. Para o momento, todos caíram juntos e os retornos precisam ser observados com lupa, setorialmente, e até caso a caso. Alguns setores e empresas voltaram com força, como construção civil, petshop, saúde, materiais de construção; outros não se recuperaram – hotelaria, turismo, aviação e academia –, conforme a evolução dos fatos. Como a incerteza é knightiana, os riscos refletem as incertezas. Os dois têm fundamentos randômicos; o risco é previsível, é possível mapeá-lo, ele é conhecido, é mensurável; a incerteza não. Ocorre que os dois convivem juntos, dependendo da perspectiva. Analisando as curvas elevadíssimas dos gráficos apresentados anteriormente, que expressam uma inteligência do risco – neles, riscos e incertezas parecem tão elevados que dificultam a discussão sobre como combatê-los, inclusive em âmbito acadêmico. O que é necessário fazer? Como não conseguimos controlar e não conseguimos combater os riscos, temos que abraçá-los e com eles conviver. É uma mudança de mindset, é uma forma de abordar a realidade de modo diferente e, doravante, assim será (ou até mais). Principal problema: quando começou a pandemia, os riscos estavam concentrados na saúde. Eles continuam existindo, mas estão sob relativo controle. Para o momento, os riscos preocupantes são os de ciberataques, os ataques cibernéticos. A palavra que eu mais tenho lido em estudos sobre riscos e incertezas é futureproof, que significa à prova de futuro, de tal maneira a prevenir estragos lá na frente. A cibersegurança é um tema crítico para as empresas. A qualquer momento, mesmo estando preparadas, com instalação de antivírus poderosos, firewall, empresas podem facilmente ser hackeadas. A governança corporativa abrange a gestão de riscos, que é essencial para a sobrevivência das empresas, principalmente com a LGPD – Lei de Proteção de Dados em vigor e, desde agosto, com penalidades para o descumprimento.

RI: As empresas com excelência em governança corporativa têm uma área responsável pela gestão de riscos. O que as diferencia das que não têm?

Eduardo Gomes: Principalmente as empresas com ações negociadas nas bolsas de valores são obrigadas a fazerem o mapeamento, mensuração, análise, acompanhamento e divulgação dos riscos de todas as naturezas. Estas empresas determinam sua tolerância de exposição a determinado risco. As matrizes europeias das multinacionais instaladas no Brasil determinavam à filial brasileira a cobertura total dos riscos, através de operações estruturadas (hedge) não especulativas. Nas condições atuais de incerteza extrema, as áreas responsáveis pela gestão de riscos vão além das exigências regulatórias, pois, não têm como mensurar os vários riscos, dada sua magnitude. Ao mesmo tempo, lembramos que não existe tolerância zero ao risco e, sim, convivência com o risco, na governança e gestão das empresas.

RI: Como empresas podem garantir que a gestão de riscos será adequada e atenderá às regras impostas a elas?

Eduardo Gomes: Como conselheiro de administração certificado pelo IBGC, recorro aos seus seis pilares, totalmente alinhados com a adequada gestão de riscos:

1. Ética e integridade – os escândalos Lava Jato e Mensalão, como exemplos, expuseram empresas, conselhos, administradores e shareholders. A blindagem contra a corrupção é uma questão de sobrevivência das empresas.  

2. Diversidade e inclusão – destacarei, mais à frente, a importância deste pilar que, para mim, é o mais relevante em tempos de incertezas extremas. 

3. Ambiental e Social – ligado diretamente ao ESG – Environmental, Social and Governance. Um tema fortemente valorizado pelos investidores, a começar pelo BlackRock, maior fundo de investimentos do mundo, cujo presidente Larry Fink tem reforçado a urgência da agenda ESG. Trata-se hoje de um dos temas mais caros à questão dos riscos, conforme identificado pelos líderes que compõem o Fórum Econômico de Davos.

4. Inovação e transformação – com boa governança corporativa, pode ajudar a pavimentar a estrada do futuro. Trata-se também de um tema que está diretamente relacionado à sobrevivência das organizações.

5. Transparência e prestação contas – um dos principais pilares da governança e de mitigação de riscos, por meio da obrigatoriedade das auditorias e empresas atenderem às exigências regulatórias, com o compromisso de apresentar os resultados de forma acurada e com equidade. 

6. Conselhos do futuro – ressalto a importância de preparar os conselhos para a pavimentação e iluminação da rodovia do futuro.  

Volto ao pilar 2 – diversidade e inclusão: a inclusão traz a diversidade, com amplitude, abrangendo gênero, religião, étnica, opção sexual e outros tópicos. A inclusão é uma poderosa ferramenta utilizada para garantir que a ampla diversidade seja praticada. Questionamos muitas empresas que declaram que seus conselhos não têm diversidade, justificando-se pela contratação por competência. Por que diversidade? A diversidade dos conselhos ajuda as empresas a conviverem com ambientes complicados, complexos – do tipo VUCA. Considerando que o número de conselheiros não é superior a 10/12, se as empresas colocarem somente especialistas para cada risco relevante – finanças, compliance, ciberataques, ESG e outros – terão assegurado quantidade de conselheiros, mas não terão garantido diversidade. Pessoas que enxergam de ângulos diferentes têm que fazer parte dos conselhos, a fim de trazerem para dentro da organização a riqueza da diversidade. Isso ajuda bastante na redução da incerteza. As empresas têm que ter cuidado para não caírem na armadilha de manterem em seus conselhos apenas profissionais com o mesmo background, com competências semelhantes. O esforço para ter um conselho com diversidade tem um retorno imediato, pois este terá à sua disposição diferentes formas de pensar sobre desafios. Imagine-se a diferença de pensamento entre gerações de 25 a 70 anos, com seres humanos de distintos gêneros e variadas etnias! Um conselho com diversidade tem, em sua composição, a representação equilibrada de vários elementos relevantes. A presença de conselheiros especialistas não deixou de ser importante, lembrando que eles agregarão mais valor às áreas que efetivamente necessitarem de especialistas, como finanças, ESG e outras.

RI: Como montar um conselho de administração diverso?

Eduardo Gomes: Trata-se de um recrutamento e seleção que deve incluir a capacidade de geração de estratégias e a gestão de riscos de modo geral, indo além do conhecimento específico em finanças e outros campos de conhecimento. Não deve se limitar a certificações. Ademais, deve-se questionar se o profissional candidato ao conselho já vivenciou e solucionou situações crises, participou assertivamente de movimento como transformação digital e a materializou, como trata a gestão do capital humano, qual é o seu comprometimento com a agenda ESG. A Leroy Merlin, empresa em que atuei durante 11 anos, optou pela mudança da composição do conselho de administração. Foram contratados conselheiros bem diferentes, de mercados distintos ao do varejo, com conhecimento de novos mercados (mercados inovadores), inovação e tecnologia, e com experiência no exterior. Esta diversidade no conselho da empresa foi uma mudança que trouxe excelentes resultados e a preparou para enfrentar a pandemia COVID. Tínhamos um bom nível de preparação para a venda online, com tecnologia e a preparação de pessoas. Mesmo assim, tivemos problemas de logística, conforme dito. Em maio de 2020, a empresa atingiu o volume de vendas previsto para o final de 2023. Não tenho dúvidas de que a preparação veio com a prática da diversidade, que é propiciada pela inclusão, em sua forma mais ampla. É importante ressaltar que a mudança de um conselho não é rápida. O mandato é de dois a três anos e ter um número representativo de mulheres no conselho de administração requer tempo. Deve-se ampliar as vagas? Ou deve-se esperar mais tempo? Existem situações nas quais empresas já detectaram necessidades de mudanças e nada puderam para o momento. Existem aspectos a levar em consideração para a implantação de um programa DIE – Diversidade, Inclusão e Equidade (tratar a todos de forma justa, indo além da igualdade, que é tratar a todos do mesmo modo). É preciso ouvir todos os candidatos e dar oportunidade a todos de se expressarem. Não basta incluir, é preciso dar a devida atenção às questões trazidas pelas pessoas incluídas. Assim, é preciso haver mudança cultural, de mindset. Algumas empresas mais novas, com pessoas visionárias, por já terem sentido o calor dos desafios a elas impostos, já conseguem. Por fim, lembro que há que destinar verbas para manter o desenvolvimento contínuo dos conselheiros de administração e ficais, que é prioritário.

RI: O senhor é a favor das cotas nos conselhos de administração?

Eduardo Gomes: Confesso que antes destas experiências, eu era muito contrário a cotas. Hoje penso de uma forma totalmente diferente. Das 10 maiores empresas listadas na B3, com um total de 101 conselheiros, menos de 20 são mulheres, um número muito baixo. Consideremos, por exemplo, um mercado composto em 50% por mulheres que compram os materiais, e com uma força de trabalho integrada em 50% por mulheres. Se metade de quem trabalha é mulher, como incluir a mulher no conselho ou na direção? Através de apenas 10%? Volto à preparação contínua do conselho. O profissional entra e é muito bom, mas o mundo está em constante transformação. Desta forma, é necessário trazer gente de fora, fazer reuniões externas, testar o ecossistema completo do setor em que se atua. E investir nas pessoas, nos conselheiros.

RI: O que foi colocado em prática?

Eduardo Gomes: Em uma empresa de cujo conselho participei, a evolução para a valorização da diversidade veio da constatação de que havia alguma coisa errada, ao analisarmos os perfis de nossos clientes e colaboradores. Realizei uma apresentação demonstrando, por meio de um detalhado diagnóstico, a composição desses públicos, em termos percentuais. O raio x foi esclarecedor. Agregamos em nosso diagnóstico a questão da idade: havia na empresa mais colaboradores jovens do que de meia idade ou com mais tempo de vida. Fomos a campo e analisamos loja a loja, o que nos permitiu demonstrar várias faces da realidade. Havia uma gigantesca diferença entre os clientes presentes nas lojas: 35 a 40% eram pessoas aposentadas. E quando detalhamos os números loja a loja, vimos que a realidade era bem mais desafiadora do que se supunha. Com estas experiências, a sensibilização e o reconhecimento das prioridades da empresa, dentro de casa, foram iniciadas as mudanças. Os líderes refletiram sobre o que era preciso mudar e concluíram: aumentar e aproximar as informações e preços dos produtos para os clientes; disponibilizar uma entrada friendly para os cadeirantes nas lojas e se preparar para as necessárias mudanças.

RI: O senhor nos informou que foi líder do comitê de sustentabilidade da Leroy. Como essa assunção de responsabilidade aconteceu? O que foi realizado sob sua liderança?

Eduardo Gomes: O Comitê de Sustentabilidade da empresa – posteriormente denominado Comitê de Desenvolvimento Sustentável – teve um desenvolvimento significativo na empresa ao longo do tempo. Ele teve início a partir de um projeto interno que, partindo dos colaboradores da empresa, elevou o desenvolvimento sustentável a um dos pilares da empresa, juntamente com os clientes, os colaboradores e a cultura de produto. Inicialmente composto por colaboradores que doavam seu tempo de forma voluntária em prol da sustentabilidade, o Comitê se desenvolveu, agregando especialistas fazendo diversas parcerias de sucesso com outras empresas, no Brasil e no exterior. Tive o privilégio de trabalhar com pessoas altamente engajadas nesta causa, ao mesmo tempo pragmáticas e realizadoras. O desenvolvimento responsável realmente se tornou parte indissociável da cultura da empresa.

RI: Como o senhor analisa sua trajetória?
Eduardo Gomes: Minha carreira começou no grupo Mannesmann, morei na Alemanha, cuja cultura é totalmente diferente da brasileira. Determinadas coisas me chamaram muita atenção – a convivência com os alemães foi muito marcante, em vários aspectos. Enquanto lá havia uma consciência ecológica generalizada, no Brasil, as indústrias ainda não se preocupavam como meio ambiente. Isso me marcou bastante, eu tinha percepção clara de que o assunto era sério. À medida que eu me desenvolvia profissionalmente, o tema também se tornava mais ativo. Não sou um especialista no assunto, mas cerquei-me de vários deles, dentro e fora das empresas, aprendendo sempre. A análise e a mitigação de riscos ambientais passaram a ser temas obrigatórios, inicialmente com viés mais de cumprimento de exigências legais, tornando-se rapidamente de caráter preventivo. Recentemente, fui convidado para ser conselheiro do Instituto Capitalismo Consciente do Brasil, capítulo Mina Gerais. O Capitalismo Consciente é um movimento global, que se originou nos Estados Unidos, a partir de um estudo acadêmico, com o objetivo de verificar como algumas empresas conseguiam manter alta reputação e fidelidade dos clientes, em ter investimentos exorbitantes em publicidade e marketing. Essas empresas tinham em comum propósitos que iam muito além de trazer lucro para os shareholders – elas se voltavam para os seus stakeholders. Achei que o movimento tem tudo a ver com os meus princípios e topei o desafio. Tenho aprendido bastante e procurado colaborar.

A densidade dos assuntos tratados durante esta entrevista, realizada em pouco mais de uma hora, não foi suficiente para compartilharmos com os leitores toda a experiência de Eduardo Gomes. Desta forma, o convidamos para uma rodada futura e nos sentimos entusiasmadas em aqui compartilhar as experiências deste profissional e o seu comprometimento com a agenda ESG e novas formas de tratar riscos pelas organizações.

Cida Hess
é economista e contadora, especialista em finanças e estratégia, mestre em contábeis pela PUC SP, doutoranda pela UNIP/SP em Engenharia de Produção - e tem atuado como executiva e consultora de organizações.
cidahessparanhos@gmail.com

Mônica Brandão
é engenheira, especialista em finanças e estratégia, mestre em administração pela PUC Minas e tem atuado como executiva e conselheira de organizações e como professora.
mbran2015@gmail.com


Continua...