Caro leitor, o que é ser rico? Você se considera rico?
Durante muito tempo, fiz estas duas perguntas a inúmeras pessoas. Cada entrevistado tinha uma definição específica sobre o significado de riqueza. A maioria das pessoas, quando perguntadas, afirma que são ricas em saúde, amor ou amigos. Se a questão é sobre a riqueza material, os entrevistados desconversam e dizem que não são ricos.
Alguns dos que negaram ser ricos estão no topo da pirâmide social brasileira. Porém, para estas pessoas, "ser rico" é definido como algum padrão acima do nível de riqueza em que elas se encontram. Para a classe média, sinônimo de riqueza pode ser possuir carros caros e viajar todo ano para o exterior. Já para a classe A+, só é rico quem tem o próprio jato executivo, ou, eventualmente, um jato melhor e mais moderno. Mas o fato é que ser rico, para todos a quem fiz as perguntas, era ter muito mais do que tinham naquele momento.
Um dia perguntei a um senhor bastante humilde o que era ser rico, para ele. "Rico é quem come carne todo dia!", ele respondeu. Então lhe perguntei se ele era rico. "Agora sou", ele disse. Este senhor tinha um objetivo claramente definido sobre o que é ser rico. Chegou lá e, portanto, se considera um homem rico.
Todos os semestres, recebo cerca de cento e setenta novos alunos na matéria de Finanças Pessoais que ministro na Universidade Federal de Santa Catarina. Sempre pergunto aos jovens universitários o que eles buscam da disciplina. Normalmente as respostas dos alunos começam imprecisas, falando sobre obter equilíbrio financeiro ou sobre o interesse em se tornar investidor. Mas em um dado momento algum aluno diz que está ali porque gostaria de ser rico. A partir deste primeiro "atrevimento", vários outros alunos costumam também assumir que desejam se tornar ricos.
Mas quando pergunto aos estudantes o que é ser rico, eles normalmente não sabem ou ficam muito constrangidos em explicar o que consideram ser rico. Alguns, depois, confessam que têm vergonha de ser vistos como excessivamente ambiciosos ou muito modestos em suas pretensões.
Uma viagem sem chegada
Quem não tem objetivos claros, nunca sabe aonde quer chegar. Imagine que você decida fazer uma viagem qualquer, mas não tenha idéia de onde quer ir. Quando você vai chegar ao seu destino? Você pode ir a vários lugares diferentes, porém nunca chegará ao seu destino – pelo simples fato de que não há destino.
Correr atrás de riqueza e dinheiro é uma tarefa complicada e difícil. No processo de enriquecimento é preciso alocar muito tempo (por vezes a vida inteira) na tarefa de ganhar, acumular e multiplicar o dinheiro. Quando nos lançamos nesta tarefa, precisamos saber que podemos cometer dois grandes erros. O primeiro é acumular muito e não viver o suficiente para desfrutar a riqueza acumulada. O segundo é acumular pouco, viver muito e enfrentar uma velhice repleta de restrições.
Quanto maior o valor ou o volume de coisas que uma pessoa julgar fundamental para se considerar rica, mais difícil será atingir este objetivo. Alguém que acredite que ser rico é ter um apartamento de dois quartos, um carro popular e um salário no final do mês que lhe permita pagar as contas, precisa de muito menos esforço para chegar lá do que uma pessoa que queira uma cobertura de 500 metros quadrados e um jato particular.
Evidentemente que quanto maior a ambição, maior a chance de frustração. O ambiente em que uma pessoa foi criada e os modelos aos quais ela é exposta ao longo da vida podem influenciar muito na formação das ambições pessoais. Porém, alguns fatores inerentes ao indivíduo parecem também interferir neste processo.
Desta forma podem existir pessoas que nasceram em famílias simples e pouco ambiciosas e tenham enorme desejo de formar grandes fortunas. Enquanto outras, que nascem em famílias abastadas, eventualmente, desejam uma vida modesta e sem grandes recursos materiais.
Porém considero fundamental que cada um defina o que deseja na vida. Não consigo imaginar um bom planejamento financeiro que não parta de objetivos claramente definidos. Você deve dizer objetivamente o que é ser rico para você e perseguir este objetivo.
Voltando ao exemplo da viagem, se você decide que vai sair de São Paulo para chegar ao Rio de Janeiro, pode conferir depois se atingiu ou não seu objetivo. Pode ser que ao chegar o Rio você decida ir mais longe, quem sabe até a Bahia, ou ao Ceará. Também pode ser que no meio da viagem resolva mudar seu destino e ir para Minas Gerais. Mas sempre terá claro se atingiu ou não seu objetivo inicial.
Onde chegar
Acredito que todas as pessoas devem traçar objetivos concretos de curto, médio e longo prazo para suas vidas. Ganhar e acumular dinheiro não deve nunca ser o objetivo de uma vida. Mas o dinheiro, muitas vezes, possibilita chegar aos reais objetivos da vida.
Lembro de uma pessoa que me procurou após uma palestra e disse que seu desejo era poder largar o emprego e dedicar sua vida a cuidar de cães abandonados. Para ela, o dinheiro não tinha nenhuma importância na vida. Perguntei se pretendia cuidar dos cães na própria rua onde eles estavam abandonados. Ela, logicamente, afirmou que não.
Então recomendei que ela estabelecesse um plano financeiro para atingir seu nobre objetivo de vida. Disse que, se ela não desse o devido valor ao dinheiro, provavelmente nunca conseguiria cuidar dos seus animais. Depois de muito discutir, ela definiu seu plano de vida: construir uma casa de dois andares para alugar as lojas térreas e cuidar dos cães no terreno dos fundos. A partir de então, ela poderia se tornar rica.
Porque rico é quem possui patrimônio suficiente para gerar uma renda que lhe permita viver da forma como deseja.
Se você deseja ter um barco, um sítio, uma casa de praia e viagens anuais, precisa construir um enorme patrimônio que sustente estes gastos. Se seus desejos são mais modestos, um pequeno patrimônio pode lhe tornar rico. Quanto maiores seus desejos de consumo, mais difícil é ficar rico. Quanto menores estes desejos, mais acessível é a riqueza.
Quando seu patrimônio puder sustentar seus objetivos, pare de acumular e comece a aproveitar mais a vida. A partir de então só trabalhe naquilo que lhe der prazer e significado. O dinheiro é um meio e não um fim. Mas descuidar da gestão financeira dificulta muito a conquista de uma vida plena e feliz.
Jurandir Sell Macedo
é doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
jurandir@edufinanceira.org.br