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Em análise de ações é fundamental um entendimento muito profundo do que é risco sistemático, ou não diversificável, e risco não sistemático, ou diversificável. Isso é de grande interesse prático inclusive, principalmente nos dias de hoje em que o intangível ou as externalidades negativas estão cada vez mais evidentes e, infelizmente, sem a transparência devida.
Um Analista de Valores Mobiliários credenciado, através dos diversos formatos de Relatório de Análise, expõe sua tese de investimento, suas premissas, a taxa de desconto aplicada, o custo ponderado de capital, os prêmios de risco, sejam explícitos ou implícitos. Um Relatório de Análise deve dar total transparência, precificando agora, com muito mais ênfase, os riscos inerentes à empresa no que se refere ao ambiente, ao social e governança, os conhecidos Fatores ASG (ou ESG), pois argumentos como “meu cliente não me cobra isso” ou “já está na minha taxa de desconto” ou “o mercado brasileiro é de curto prazo”, não reflete a realidade do “preço-alvo”, ou “valor justo”, ou simplesmente a Análise Fundamentalista estará virando Análise Gráfica, já que “a queda gerou suporte forte, o IFR está muito baixo e virou ponto de compra”. Isso é inadmissível.
Ao longo do tempo a análise de investimento gerou várias correntes de pensamento. A mais antiga refere-se à Análise Técnica, ou Análise Gráfica, que se formou, de fato, a partir das ideias do jornalista Charles Dow, após o crash de 1929 nos Estados Unidos, devido à sua preocupação com as tendências dos preços e como compreender suas oscilações no tempo.
A segunda corrente da análise de investimentos teve suas raízes nas preocupações de Benjamim Graham, autor dos livros Intelligent Investor e Security Analysis, e na aprovação da Securities Act em 1933 e Securities Exchange Act em 1934, que criou a Securities and Exchange Commission – SEC, orientada para o disclosure de informações econômico-financeiras, dentro do escopo mais amplo de fiscalização do mercado de capitais norte-americano. Os principais objetivos dessas leis baseavam-se nas empresas oferecendo publicamente valores mobiliários para investimento, devendo dizer ao público a verdade sobre seus negócios, os valores mobiliários que estão vendendo, e os riscos envolvidos no investimento. Além disso, quem vende e negocia valores mobiliários – corretores, operadores e bolsas – deve tratar os investidores razoavelmente e honestamente, colocando em primeiro lugar os interesses dos investidores. Esta corrente de pensamento foi responsável pela criação da Análise Fundamentalista.
Interessante que as preocupações estavam restritas a “quem vende e quem negocia”. Contudo, “Verdades e Riscos” empresariais tornaram necessário o desenvolvimento do mercado de capitais com base em profissionais como contadores, analistas de investimentos, gestores de recursos de terceiros, analistas de crédito, auditores, gestores de riscos, relações com investidores, etc, na medida em que o mercado se sofisticava e exigia novos aperfeiçoamentos institucionais.
A terceira corrente refere-se à Teoria Quantitativa de Investimentos, abrangendo seleção de portfolios, objetivos de otimização de retorno e minimização de riscos e os princípios de formação do mercado eficiente. Ressalte-se que certas correntes teóricas apenas ganharam importância, nos anos 80, a partir da evolução da informática, devido à complexidade crescente dos cálculos.
Uma quarta corrente de investidores são os usuários de metodologias mais recentes, cujo desenvolvimento foi facilitado pela evolução significativa da tecnologia da informação, usuários de algoritmos muitas vezes bastante sofisticados que combinam as várias técnicas de Análise Técnica, Análise Fundamentalista e de Análise Quantitativa, que permitem realizar operações através de sistemas robotizados em alta velocidade, várias vezes ao dia.
Diante dessa evolução importantíssima de análise de valores e cenários é preciso definitivamente agora, mensurar, tratar, incorporar e dar total transparência nos modelos, não mais na Perpetuidade, mas sim na Sustentabilidade, o impacto de valores “intangíveis”, nem sempre quantificáveis, mas que trazem a questão da “confiança” na empresa, principalmente, quando se trata de decidir sobre investimentos de longo prazo.
A empresa recomendada pelos seus valores econômicos intrínsecos merece confiança considerando-se os seus princípios de governança, de relação com o meio ambiente e com as partes interessadas integrantes da sociedade, tais como consumidores, investidores, público interno, comunidades onde a empresa atua, etc? Qual o risco de geração de externalidades negativas das empresas? Em que medida esses riscos podem criar impactos reputacionais e prejuízos diversos, com repercussões reducionistas sobre o valor de dividendos esperados?
O futuro será marcado pelas expectativas de grandes mudanças nas estratégias empresariais, trazidas pelo comportamento da demografia, que exigirá uma previdência social mais flexível; pela revolução tecnológica do século 21; pelas mudanças climáticas já reconhecidas pelo Acordo do Clima de Paris em dezembro de 2015; pelas novas necessidades de infraestrutura de energia renovável, mobilidade urbana e regional, de saneamento e gestão de resíduos, etc.
A melhor das análises quantitativas pode ter barreiras na etapa de decisão de investidores, caso a empresa não tenha, por exemplo, políticas transparentes de remuneração de investidores, respeito ao acionista minoritário, políticas de respeito aos direitos humanos, políticas de águas, políticas de gerenciamento de risco abrangente, questões que estão se apresentando no radar de muitos investidores institucionais.
Os segmentos de investidores estão se diferenciando, com maior demanda por valores corporativos intangíveis, de compreensão mais complexa e que são mais difíceis de inserir em modelos que integrem análise, recomendação e decisão de investimentos.
A Revista RI nº 229, de março de 2019, em seus 11 temas elencados em seu índice, 6 tratavam de Responsabilidade Socioambiental, Sustentabilidade e Governança, o que nada mais é do que os Fatores ASG (ou ESG), que a APIMEC tanto tem explorado e alertado os Analistas de Valores Mobiliários que é preciso sair da mesmice, dando transparência desses fatores na análise de investimento e respectivas recomendações, o que com certeza vai ser um diferencial gigante nos Relatórios de Análise e motivo de cobiça.
Dois recados importantíssimos
Felipe Brasil da Costa, que não se descreve como atuante no mercado financeiro mas que é doutor em agronomia pela UFRJ e professor da Universidade Veiga de Almeida, diz tudo ... “É preciso entender que custo evitado é lucro. Por isso é tão importante adotar medidas preventivas com análises de risco que vão além das questões econômico-financeiras, mas também ambientais, incluindo nesta avaliação a sociedade. Aquele gestor do século 21 que só trabalha gerenciando risco financeiro e econômico voltado para a lucratividade da empresa, vai ser penalizado sobretudo nos processos produtivos que podem ter grandes interações com o meio ambiente”.
Eduardo Werneck, vice presidente da Apimec Nacional, escreve com todo conhecimento que tem sobre o tema ... “As questões ASG vão pesar cada vez mais no Risco Brasil por vários caminhos e quem fundamentar suas recomendações e decisões de investimentos acreditando que os preços se recuperam, pois a poeira abaixa e a memória se apaga não vai obter sucesso no longo prazo”.
A análise de investimento requer muita informação, mensuração e no assumir de riscos que não estarão no longo prazo. Tudo estará no curto prazo, estará no último balanço publicado, estará no último parecer dos auditores, estará na última reunião com os diretores, estará no último Analyst & Investors Day.
Ricardo Tadeu Martins
é economista e analista de valores mobiliários da Planner Corretora de Valores e presidente da Apimec - Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais.
O artigo reflete as opiniões pessoais do autor.
ricardo.martins@apimec.com.br