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A lei bancária ainda em vigor - Lei 4.595 - foi editada em 31.12.1964, no auge do regime militar. Abrangia a área bancária e a de mercado de capitais (a Comissão de Valores Mobiliários só viria a ser criada em 1976). A pena de advertência era originariamente irrecorrível e das demais penalidades cabia recurso ao Conselho Monetário Nacional - CMN.
Ocorre, porém, que o CMN, ocupadíssimo com suas múltiplas e relevantes atribuições, nenhuma importância conferia, na prática, a apreciar e julgar os recursos. Limitava-se, de forma burocrática e sistemática, a simplesmente negar provimento em bloco aos recursos, “mantendo a decisão recorrida pelos seus próprios fundamentos”. Sequer era permitida sustentação oral dos recorrentes nas sessões.
Um dos primeiros atos após a redemocratização em 1985 foi a criação do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional - CRSFN, para substituir o CMN na atribuição de julgar os recursos das penalidades aplicáveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais.Passou a ser conhecido como “Conselhinho” (o “Conselhão” seria o CMN). O Ministro da Fazenda designa seus oito integrantes, sendo quatro entre os indicados pelo setor privado e quatro pelo setor público.
Durante o discurso de instalação do CRSFN, destacou o então Ministro de Estado da Fazenda Francisco Dornelles:
“A criação do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional responde assim à demanda do próprio mercado e do poder público por uma maior eficácia administrativa no trato de questões tão sensíveis e especializadas como são os recursos a penalidades aplicáveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais [...] com a finalidade de julgar, em segunda e última instância, os recursos administrativos interpostos das decisões já mencionadas. Por outro lado, o órgão técnico paritário, congregando representantes do próprio mercado e do poder público regulador, será certamente o fórum adequado para a solução, a nível administrativo, de conflitos e litígios de interesse do mercado, podendo assim auxiliar na tarefa que, de outra forma, desaguaria necessariamente no poder judiciário”.
Ao longo dos anos, o Conselhinho veio ampliando sua competência, valendo destacar que em 2012 recebeu também a competência, até então atribuída ao Ministro da Fazenda, para julgamento dos recursos das decisões do Conselho de Atividades Financeiras (COAF).
Por outro lado, também vem aumentando sua eficiência. Se no passado vários recursos ficavam represados por terem que transitar necessária e previamente pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, a partir de fevereiro de 2016 essa Procuradoria só opina previamente por escrito nos casos em que for instada para tal por Conselheiro. Foi realizado naquele ano um mutirão entre os conselheiros para zerar o estoque de recursos que se encontravam na PGFN.
Além disso, o Conselhinho adotou o processamento eletrônico, o que permitiu maior velocidade, transparência e eliminou o atraso na entrega dos votos dos relatores, já que o sistema só aceita ser pautado para julgamento o recurso cujo voto do relator esteja inserido como minuta.
Justamente nesse momento em que o CRSFN se acha apto a atender aos padrões de eficiência exigidos pela OCDE, o Decreto 9.759, de 11 de abril, extinguiu e estabeleceu novas diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal, incluindo o Conselhinho.
Trata-se de inaceitável retrocesso ao período pré-redemocratização! A participação paritária, em órgãos julgadores, de representantes do setor público e do setor privado é uma conquista no avanço civilizatório de mais de 800 anos. Desde a Magna Carta, de1215,procura-se limitar o poder absoluto dos governantes, com a participação mais ativa dos governados.
Vale salientar, ainda, que após a Lei 13.506/17, os limites máximos dos valores das multas aplicáveis pelo BACEN e pela CVM subiram a níveis elevadíssimos, podendo o BACEN, p.ex., impor multas de R$ 2 bilhões (art. 7º, II), o que pode significar, conforme o caso, confisco ou até mesmo o fim da empresa. Mais do que nunca se faz imprescindível a possibilidade de revisão por órgão externo de que participem, ao menos paritariamente, integrantes indicados pelos administrados.
Com a extinção do CRSFN eventuais discussões sobre penas e multas aplicadas pelos reguladores dos mercados de financeiro, de capitais e de seguros recairão necessariamente na justiça comum, sobrecarregando os julgadores e reduzindo a qualidade dos julgados dada a escassez de tribunais especializados nesses temas.
A Abrasca vem que se posicionar contra esse verdadeiro arroubo de Leviatã em concentrar ainda mais seus poderes. O Estado Democrático de Direito exige de todos a eterna vigilância contra o autoritarismo.
Alfried Plöger
é presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira das Companhias Abertas (ABRASCA)
abrasca@abrasca.org.br