“A Nova Economia é o processo de inflexão de uma curva, de um desenho de cenário econômico em que existe uma múltipla convergência de inovações tecnológicas e que muda radicalmente o padrão de organização das empresas, o nível de produtividade e naturalmente gera impacto benéfico na sociedade.”
Diego Barreto, 38 anos, VP de Finanças e Estratégia do iFood, autor do best seller “Nova Economia: Entenda por que o perfil empreendedor está engolindo o empresário tradicional brasileiro” (Gente Editora) – possui MBA pelo IMD (Suíça), com foco em Estratégia e Liderança e é mentor na Endeavor e na 500 Startups, atuando em favor de mais de 30 startups em diferentes países e como conselheiro de empresas da Velha e Nova Economia. Especialista em Finanças pela Fipecafi/USP, é também bacharel em Direito pela PUC-SP tendo Iniciado sua carreira profissional como trainee na Mattos Filho Advogados (2004 à 2007), como parte do time de mercado de capitais responsável por fusões, aquisições, IPOs e etc. Foi executivo da Ingresso Rápido (2016 à 2018), da Suzano Papel (2015 à 2016), da OAS (2010 à 2011), AES Brasil (2008 à 2010) e na Lopes Consultoria (2007 à 2008).
Diego Barreto, que também é vice-presidente do Conselho de Administração do IBRI - Instituto Brasileiro de Relações com Investidores, aborda em seu recém lançado livro “Nova Economia”, já um best seller como a Nova Economia vem impactando os modelos de negócios tradicionais. Acompanhe a entrevista.
RI: Quem é o mineiro Diego Carneiro Barreto?
Diego Barreto: O mineiro Diego Carneiro Barreto é um cara cheio de privilégios e que tem consciência desses privilégios. Sou homem, branco, heterossexual, nascido em uma família de classe média alta, nascido na cidade de Uberaba, região sudeste do Brasil, um típico perfil que nasce para ter sucesso no Brasil. É o típico perfil que não vive preconceito ao longo da sua vida, que tende a ter uma taxa de segurança alimentar muito maior do que os demais perfis, de acesso a uma boa escola, melhor do que os outros perfis, acesso a uma boa faculdade e como consequência com um potencial altíssimo de ter sucesso. Agora eu tenho a consciência, o Diego Barreto é um cara que tem a consciência que esse é um perfil para poucos. É um perfil que segrega, que é um gerador de parte dessa imobilidade social que existe no Brasil e, portanto, Diego é um cara revoltado com as estruturas tradicionais de poder e de organização da sociedade e da economia brasileira.
RI: Estamos na era de grandes transformações do setor econômico, que aliado ao avanço tecnológico está cada vez mais focado no meio digital e menos no meio físico, com empresas novatas surgindo, ganhando bilhões de reais do dia para a noite, enquanto tradicionais gigantes do mercado perdem espaço e cifras. Com isso, a economia está mudando e o empreendedorismo também. Como autor do best-seller “Nova Economia: Entenda por que o perfil empreendedor está engolindo o empresário tradicional brasileiro”, como você analisa esse cenário e quais os principais pontos em que a Nova e a Velha Economia se diferenciam?
Diego Barreto: O Brasil vive pela primeira vez a sua Nova Economia. A Nova Economia é o processo de inflexão de uma curva de um desenho de cenário econômico em que existe uma múltipla convergência de inovações tecnológicas e que muda radicalmente o padrão de organização das empresas, o nível de produtividade e naturalmente um impacto benéfico na sociedade. Historicamente o Brasil nunca viveu isso, se você pensar na primeira revolução industrial, na segunda, na eletricidade, na produção em massa, do petróleo e todas as demais novas economias que existiram na história. O Brasil nunca fez parte dela. O Brasil pela primeira vez faz parte de uma Nova Economia e o motivo é a globalização, o processo de globalização definitivamente se concretizou no Brasil, o que permite com que tecnologias cheguem aqui mais rápido, ganhem escala mais rápido pelo tamanho do país e como consequência fiquem mais baratas portanto acessíveis. Esse processo é o que cria essa Nova Economia no Brasil pela primeira vez. E ela diferencia, ela gera pontos muito diferentes entre empresas da nova e da velha. Primeiro, as empresas da nova não são só startups, empresas da Nova Economia são aquelas que compreendem essa convergência das múltiplas tecnologias e imputam isso dentro do seu modelo de negócio. Empresas da Velha Economia são aquelas que não compreendem isso, aquelas que não executam isso. Portanto, estar na Nova Economia não implica ser uma startup, estar na nova significa ser uma empresa ou indivíduo que percebe e executa dessa forma e isso diferencia o atraso, do moderno.
RI: Por que o perfil empreendedor está, de fato, “engolindo” o perfil do empresário brasileiro? Como potencializar o viés empreendedor?
Diego Barreto: O perfil empreendedor está ligado à busca de oportunidade, a busca de solução, a encontrar novos caminhos, a um instinto animal que é extremamente apurado para poder cruzar para o outro lado. O perfil empresário está mais ligado a gestão, a perpetuação, a eficiência máxima, ou seja os dois perfis têm valores bons, eles fazem sentido, o problema é que o Brasil historicamente não teve competição, nós temos muita barreira de entrada para o estrangeiro vir competir e na outra ponta a gente mata o empreendedor para acontecer aqui dentro. Portanto existe aqui um meio caminho na economia brasileira que só as grandes empresas tradicionais habitam e se perpetuam. E aí elas perdem naturalmente um instinto empreendedor com pouca competição, por que eu deveria ser empreendedor? Pelo contrário, deveria sentar no sofá e ficar assistindo televisão, então o que o Brasil perdeu ao longo do tempo por criar essa conjuntura foi exatamente dificultar esse perfil empreendedor se manter nas gerações que vão assumir nos negócios das empresas tradicionais. Como potencializar o viés empreendedor? É uma mudança de hábito, mudança de compreensão do mundo, é uma consciência maior do que está acontecendo, é exatamente ter a humildade de reconhecer o processo evolutivo e isso cabe ao acionista, não cabe aos executivos. Quem define a direção, quem define a cultura, quem define os valores de uma empresa, o nível de consciência de uma empresa é o acionista, que, portanto, pede para o executivo executar naquele caminho. Então a mudança está associada exatamente a uma modernização do mindset, do viés, da cabeça dos acionistas brasileiros.
RI: Em artigo publicado no site Poder360 em Julho/2020, em que trata de economia sob demanda e da complexidade do arcabouço regulatório, você defende que “o Brasil não pode ficar fora da ordem futura”. Na sua opinião, quais são os compromissos que o país necessita assumir atualmente?
Diego Barreto: O Brasil precisa assumir um compromisso de mudança de comportamento, de viés, nós temos uma visão extremamente arcaica, antiga, em que nos escoramos no estado brasileiro para poder pedir benesses, para poder garantir uma produtividade artificial. Pensa, quem acredita historicamente que o Brasil poderia ter sido um país de sucesso se não tivesse o tamanho que nós temos em termos de população e geografia e a riqueza dos recursos naturais. Se a gente tivesse nascido com o tamanho geográfico do Japão e com as riquezas naturais do Egito, não seria o Brasil hoje em termos de potência econômica e por tanto de geração de riqueza para a sua sociedade e, portanto, de redução das mazelas sociais. O Brasil provavelmente seria um país miserável porque nós não criamos ao longo do tempo uma estrutura mental que faça o brasileiro, as empresas brasileiras, os acionistas brasileiros terem um comportamento de levantar a régua, de sonhar grande, de competir na arena global. Portanto, o que nós temos que mudar aqui é efetivamente essa cabeça, temos que nos afastar desse jeitinho de pedir para o estado subsídios, temos que nos afastar de pedir para o estado os empréstimos mais baratos, de aumento de tarifa e aceitar mais a competição, aceitar a evolução gerencial, tecnológica, organizacional, do modelo de negócios, para efetivamente subir a régua aqui, poder competir fora e atrair divisas como consequência para o país.
RI: A palavra que pode ajudar a definir a Nova Economia é “disruptura”, que acredita em um rompimento com o velho mercado e a abertura para o novo, mais tecnológico, flexível e prático. Como empresas bem-sucedidas no modelo tradicional podem fazer parte da Nova Economia, migrando para esse novo cenário?
Diego Barreto: A primeira ação a ser tomada é entender qual é o poder da tecnologia. A gente se acostumou a achar que tem tecnologia porque a gente vai lá e compra na prateleira. Só que toda vez que você chega em uma fábrica e alguém fala: “olha como a minha fábrica é tecnológica”, a primeira pergunta que eu faço é: a do vizinho também é? porque ele comprou do mesmo fornecedor?. E a resposta é: sim. Então o que a tecnologia fez de diferente, então existe um conceito aqui de tecnologia proprietária aprender a desenvolver, aprender a criar, a ter essa liberdade interna de gerar ideias e na sequência produzir tecnologia proprietária. Isso não é sobre ser um aplicativo, isso é sobre ter capacidade de criação de tecnologia. São coisas diferentes. O segundo ponto que é muito importante aqui é o processo de criação de uma força de talentos internamente e não de colaboradores apenas. A gente se acostumou a contratar por currículo, o que você faz quando contrata por currículo, você contrata pessoas que passaram por uma boa faculdade, uma boa empresa, mas você perde a visão do comportamento. E o que você precisa de uma empresa que detém tecnologia proprietária e portanto muita flexibilidade, agilidade porque domina o código fonte é que você tenha pessoas com comportamento fantástico, porque trazem agilidade para discussão, porque trazem a capacidade de testagem, trazem a capacidade de gerenciamento de risco, não baseado em políticas escritas em 300 páginas, porque trazem toda uma quantidade de skills, que diferenciam e geram portanto um potencial na empresa muito grande. A maioria das empresas faz o quê? Traz boas pessoas baseadas no currículo da empresa, coloca lá dentro de um quadrado chamado políticas corporativas e aí ela tem que simplesmente linearizar a execução dela ao longo do tempo. E o terceiro ponto é aprender a ajustar modelo de negócios, a gente é muito linear no Brasil, a gente faz a coisa por muito tempo do mesmo jeito, isso não faz sentido no mercado que é cada vez mais competitivo.
RI: O pequeno e o médio empresário também podem trilhar o caminho de mudança rumo à Nova Economia e se beneficiar dessa dinâmica do mercado?
Diego Barreto: Eu acho que aqui a gente vai ter o grande impacto, o pequeno e médio empresário, hoje tem acesso a ferramentas tecnológicas que o permitem criar sua própria tecnologia proprietária e criar este tipo de tecnologia não é necessariamente ter um time de tecnologia criando códigos a partir desse time, mas quando você pensa no pequeno empresário que se utiliza de várias ferramentas tecnológicas e organiza, emaranha do seu jeito próprio, ele em última instância está criando tecnologia. Hoje, o pequeno e médio empresário pode vender no Brasil e antes não podia, porque fisicamente ele estava preso a uma cidade ou um bairro. Hoje ele pode ter um atendimento diferenciado ao seu consumidor com custo muito baixo, se utilizando de ferramentas digitais que no passado ele não podia. Hoje ele pode trabalhar, como se uma franquia estivesse, sem estar nela, porque ele tem acesso aos bens e serviços e capacidade de distribuição de plataformas. Por exemplo, Magalu, Mercado Livre, ifood, entre outras. Então veja o nível do ferramental e a quantidade disponível hoje para um pequeno e médio empresário de forma barata é enorme, o que permite ele repensar a sua cadeia, ele repensar o seu modelo de negócios, ele repensar o modelo de atendimento ao cliente, ganhar uma escala que um pequeno e um médio nunca teriam historicamente no Brasil. Então para mim, aqui vai estar um dos grandes benefícios que a gente vai enxergar e já está enxergando no Brasil.
RI: Com o desafio de revolucionar o universo da alimentação, oifood já alcança números expressivos, como mais de 60 milhões de pedidos entregues por mês, mais de 270 mil restaurantes parceiros, mais de 160 mil entregadores ativos na plataforma e mais de 4 mil funcionários no Brasil. Como responder às novas demandas, em especial aos novos desafios ESG, em um mundo volátil, incerto e complexo?
Diego Barreto: A resposta ela passa por três pontos. A primeira delas é a transparência, é assumir seu atual status em relação a essa discussão. Então se você me perguntar: “Você é uma empresa que hoje consegue endereçar de forma clara, prática e exposta em termos de números todas essas demandas?”. A resposta é não. Então a minha humildade, o meu reconhecimento, a minha consciência e a coragem de falar isso de forma pública é o que me pressiona, no bom sentido da palavra, a me movimentar, porque vou ser cobrado por isso. O que a maioria das empresas no Brasil faz? Diz que é sustentável, diz que é transparente, inclusiva, que zera carbono, mas o business dela é crescer árvore então na verdade você está fazendo o que já faz no seu negócio. Esse nível de consciência é muito importante. O segundo ponto é dar transparência para a discussão, ou seja, não tratar só internamente, mas passar a dar publicidade a tudo o que você faz, como você faz, e o estágio em que você está. Essa publicidade gera uma pressão sobre você, porque uma vez público o número, as entidades de classe vão te cobrar, a mídia vai te cobrar, as pessoas vão te cobrar. E o terceiro pilar é números, me dê números para que eu saiba efetivamente se as coisas vão bem ou mal. Me dê números para mostrar se efetivamente o caminho que está seguindo é um caminho grandioso nessa discussão. Sem números não existe discussão. Então por exemplo, no caso do ifood, nossos números são: nós iremos zerar as emissões de carbono já no ano de 2021, de todo impacto que a gente gera ou eu vou ter que compensar comprando crédito ou vou ter que efetivamente passar a criar soluções tecnológicas para esse impacto que, por exemplo, uma mota com motor a combustão gera. No caso por exemplo de diversidade e inclusão, nos comprometemos publicamente, até 2023, ter uma empresa em que mulheres vão representar 40% do corpo diretivo da empresa e negros vão representar 30%. E não só do corpo diretivo, mulheres vão representar 50% de toda a empresa e negros 40%, esse número é público, desafiador e eu vou ser cobrado se não entregar isso. Então veja como a soma desses três pilares me permitem efetivamente caminhar porque a pressão que você cria para você mesmo acaba gerando isso.
RI: As empresas hoje trabalham muito em parceria, principalmente entre startups. Isso é um fenômeno ligado à Nova Economia?
Diego Barreto: Totalmente, a empresa brasileira tradicional não é cooperativa, pelo contrário, ela trabalha de forma a se isolar, trabalha de forma a criar silos, feudos, você tem raros casos no Brasil de empresas tradicionais que trabalham em um formato de ecossistema. E aí as pessoas de uma forma leviana confundem ou argumentam que a cadeia de valor que ela tem é um ecossistema. Não, só a cadeia de valor não é um ecossistema, o ecossistema é dar liberdade de integração para terceiros, é você permitir que terceiros entrem e saiam sem qualquer tipo de barreira, por exemplo a lógica da API em que você permite que qualquer um que pegue sua API entra no seu ecossistema e saia quando quiser. Essa lógica ela não está ligada a um contrato que te segura, que te prende, que te aprisiona, então as empresas da Nova Economia, como elas entendem mais de tecnologia e tem uma paixão natural por dados, elas automaticamente tendem a ser organizar em ecossistemas e por tanto colaborar muito mais.
RI: Na sua opinião, quais aspectos a pandemia da Covid-19 acelerou o mundo corporativo rumo à Nova Economia e também a adesão às questões ESG?
Diego Barreto: Na minha opinião, a Covid-19 não acelerou o processo das empresas irem rumo à Nova Economia e nem ESG. O que a pandemia fez foi colocar uma arma na cabeça dos empresários e dizer “você não se digitalizou” “você corre o risco de morrer” e aí todo mundo saiu correndo para se digitalizar e prestar atenção nesses temas, isso não quer dizer que você está na Nova Economia. O fato de você olhar para o mercado e comprar tecnologia, o fato de simplesmente digitalizar algo que se você não digitalizasse, não ia conseguir continuar vendendo, não te transforma em uma empresa da Nova Economia. Economia tem a ver com comportamento. Aliás os elogios constantes que a gente ouve a empresas que se digitalizaram por causa da pandemia faz com que a gente abaixe a régua em relação a esse tema. A gente não pode achar que isso é bom porque você faz em uma situação de desespero, de total necessidade, estar na Nova Economia é compreender o moderno, é evoluir constantemente porque o moderno se altera, então eu acho que a pandemia não ajudou a ir nesse rumo. Ela criou uma série de caminhos para algumas empresas que tiveram que aderir a algumas coisas e em específico em relação a ESG você vê em especial um movimento vindo por parte dos investidores estrangeiros, dando mensagens muito claras de se quiserem meu capital vocês vão ter que se adequar. Então vejam que ele não parte de forma genuína das empresas, ele parte do capital exigindo isso. É benéfico? É benéfico, mas as coisas são boas quando elas são feitas com consciência e não simplesmente reagindo a pressões.
RI: Qual a importância da recente modernização da legislação empresarial, como “Lei de Liberdade Econômica”, “Marco Legal das Startups”, a MP de “Ambiente de Negócios” e a iminente “Reforma Tributária”, para os avanços relacionados à Nova Economia?
Diego Barreto: São extremamente importantes, é inegável que todo esse movimento que vem acontecendo nos últimos anos no Brasil de melhora do ambiente corporativo, do ambiente empresarial, do ambiente de competição é extremamente positivo para a Nova Economia, porque ele aumenta a chance de competição, quando você pensa na lei da liberdade econômica, o que ela fala é isso que não tem um risco excessivo, avança, acelera. Quando isso ficar grande, apresentar um risco que pode preocupar a sociedade, aí você vai precisar se adequar. Quando você olha para o Marco Legal das Startups o que você está fazendo basicamente é: Toda essa coisa chata, essa burocracia, que não faz sentido para uma empresa que mal tem receita, ok você não precisa se preocupar com isso agora. Quando você pensa na MP do Ambiente de Negócios, reforma tributária é menos para a Nova Economia e mais para o Brasil. Mas tem especial, na primeira fase, a redução da complexidade tributária um impacto muito grande. Quando você pensa em todo o processo oriundo dos novos marcos do saneamento e gás, é a mesma coisa, parece uma discussão de infraestrutura, mas tem a ver com a Nova Economia. Porque quando traz o capital privado em um ambiente de extrema competição, como vai acontecer agora na indústria do saneamento, você automaticamente traz tecnologia junto. Quem compete traz tecnologia junto, porque a tecnologia te permite ter um posicionamento competitivo muito mais forte.
RI: Você costuma afirmar que a “Nova Economia é geradora de renda, e não de salário”. Na sua opinião, haveria um ponto de equilíbrio para que a sociedade possua garantias sociais mínimas? Há uma tendência de aumento ou diminuição da informalidade na sua opinião?
Diego Barreto: De fato, a Nova Economia permite um nível de descentralização muito maior da produção, do empreendimento. Pensa por exemplo na lógica de um influenciador digital, esse influenciador não tem um salário, ele está gerando renda. Pensa na lógica de uma pessoa que opta por deixar de trabalhar em uma empresa para ter flexibilidade e vai buscar a demanda numa plataforma, essa pessoa está atrás de renda, não está atrás de salário. Então a Nova Economia colabora para que se tenha mais oportunidades de renda, não quer dizer que não existam as de salário, mas ela aumenta essa chance. Porque aumenta essa chance? Porque na prática sempre houve essa geração de renda no Brasil, mas a gente tratava ela de uma forma informal e de uma forma pouco escalável. O encanador que vai na sua casa uma vez por ano para resolver um problema que aparece, o eletricista, a manicure que vai a sua casa uma vez a cada 30, 60 dias, eles são geradores de renda e não de salário, eles fazem parte dessa economia sob demanda. O que eles não tinham antes da Nova Economia? Escala. Eles tinham que ficar tentando todo dia buscar alguma coisa, eles não tinham uma ferramenta que os ajudava a impulsionar, pensa na lógica do GetNinjas que chegou à bolsa recentemente, ele impulsiona, ele dá caminhos adicionais. Então a Nova Economia aumenta as oportunidades de renda, mas ela naturalmente também gera as oportunidades de salário. Em relação a proteção social, sem dúvida alguma, o estado brasileiro vai caminhar para esse meio, a Nova Economia está evoluindo e gerando essas oportunidades de renda e o estado está atento a isso. É natural que o estado nos próximos anos e provavelmente nesse curto prazo, ele entenda isso e crie mecanismos que permita que essas pessoas que optem por ter renda e não salário, tenham proteções sociais que permitam tanto estado quanto a própria pessoa viver de forma digna, chegar aos 80 anos preparados, chegar aos 60 anos com proteção, enfrentar um eventual acidente que acontece na sua vida, que o tira da capacidade de gerar renda por um período de uma forma mais segura. Então sem dúvida o estado vai ajustar isso, assim como o estado sempre foi ajustando ao longo do tempo as inovações que apareceram assim como a CLT um dia foi uma inovação.
RI: Especialistas acreditam que os negócios mais bem-sucedidos devem durar entre três e cinco anos com sua fórmula inicial, sendo obrigado a mudar a forma de negócio após esse período, adequando-se a realidade do momento. Nela, ocorrerá uma nova relação das pessoas com o trabalho, com a possibilidade dos funcionários pensarem e executarem novos projetos e não só obedecer ordens e seguir tarefas repetitivas. Na parte final do seu livro, você aborda que, na Nova Economia, não existe um plano de carreira, e sim um olhar atento a efetivamente como as pessoas se comportam e à capacidade de execução dessas pessoas. Dessa forma, podemos afirmar que o plano de carreira tradicional e linear está em processo de extinção?
Diego Barreto: A resposta é sim para todos os cargos e posições que envolvam efetivamente esse processo de mudança dentro de um modelo de negócios, bem como os novos produtos e serviços que aparecem dele. A resposta é não para aquilo que tem um caráter mais linear como por exemplo uma linha de produção de uma fábrica. Então quando você pensa em uma linha de produção de uma fábrica, quando pensa em uma empresa de engenharia que precisa formar um engenheiro experiente ao longo do tempo, aí sim existe um plano de carreira que deve continuar por muito tempo. Mas para todo o restante, que envolve um nível de flexibilidade muito grande, de dinamismo e mudança muito grandes, sem dúvida alguma o plano de carreira está em processo de extinção.
RI: Em seu livro, você afirma que “na Nova Economia, não se pede licença, e sim desculpa. Se assim não for, ninguém vai tentar, ninguém vai ousar”. Como você percebe a mudança das relações humanas, em especial dos padrões éticos nesse cenário?
Diego Barreto: Acho que aqui tem dois pontos interessantes, o primeiro é: o fato de não pedir licença e sim desculpa não implica você não ter um comportamento ético, adequado, educado, respeitoso, entre outras coisas. Essa frase fala muito com ímpeto, do instinto animal de ter coragem, de testar, de arriscar dentro dos padrões, dentro daquilo que é estabelecido nas relações de uma empresa. Quando a gente fala de ética é um cenário de mudança grande, quando você pensa que hoje existe um desenvolvedor, produzindo um código neste exato momento de um carro que não vai ter motorista, vai dirigir por conta própria, esse desenvolvedor está nesse exato momento pensando “o que acontece com esse carro em uma situação que ele não consegue frear, ele tem uma criança e um idoso em uma faixa de pedestre, e ele precisa fazer uma escolha porque ele não tem outra opção sobre quem atropelar”. Veja é um dilema ético que até então não aparecia no mundo dos negócios porque essa responsabilidade estava transferida para o consumidor que comprou o carro e estava dirigindo. Então as relações vão mudar sim, a ética vai mudar, complexo, muitos dilemas, e isso vai levar um bom tempo ainda para ser definido e dar tranquilidade para todo mundo envolvido nisso.
RI: Na sua entrevista para a Época Negócios em abril/2021, você afirma que “há um ciclo virtuoso de reinvestimento entre empresas, em busca sempre de outras ótimas ideias caracterizando um “ecossistema” vibrante, em contraponto ao ritmo linear de operação da velha economia”. Sabendo que o profissional de RI tem papel central nas organizações, quais os principais conselhos que você pode fornecer ao RI que almeja o protagonismo em companhias que convergem para a Nova Economia? Como será o profissional de RI e o papel estratégico da área de Relações com Investidores no futuro, o RI imerso na Nova Economia?
Diego Barreto: Olha existe um completo redesenho, primeiro as empresas da Nova Economia precisam de pessoas extremamente identificadas com a sua marca, seu projeto, seu propósito, portanto aqui tem uma discussão sobre o tipo de profissional que efetivamente você traz, a característica dele. Segundo ponto, a comunicação ela fica muito mais complexa, a começar pelo fato de que na Nova Economia você trabalha de uma forma mais solta, mais flexível, portanto, você considera outros canais. Quando você pensa por exemplo nos influenciadores digitais, eles são hoje uma parcela muito importante para poder atingir o varejo, por isso a forma de se comunicar, de se estabelecer novos canais, é diferente. Terceiro, é menos ligado a questões burocráticas, o que você espera um processo de digitalização de tudo o que é transacional para que o profissional de RI possa se dedicar efetivamente a questões de relacionamento com a base de investidores, mas em especial se dedicar de uma forma especializada. Empresas da Nova Economia elas têm uma característica natural de ter uma base de acionistas muito diferente de empresas da velha economia, uma base que nasce por exemplo com um empreendedor que é diluído ao longo do tempo de forma mais expressiva, mas que mantém o poder na empresa porque nele fica aquele ímpeto animal de levar a empresa a um processo de escala, de amplitude muito maior.
RI: Para finalizar, quais conselhos, Diego Barreto, 38 anos, CFO e VP de Finanças e Estratégia do iFood, daria ao Diego Barreto, 22 anos, estudante de Direito na PUC-SP?
Diego Barreto: “Passarinho que voa com morcego, acorda de cabeça para baixo”. O grande conselho que eu daria é vá andar com a sua tribo, vá andar exatamente com as pessoas que compreendem a sua linha de pensamento e andem com as pessoas que você compreende e se identifica e, portanto, escolha, e não se deixe ser escolhido para definir os caminhos que vão construir a sua carreira.
André Vasconcellos
é executivo de Relações com Investidores (RI); diretor-adjunto RJ do IBRI; especialista em Direito Societário e coordenador da pós-Graduação em “Direito e Mercado de Capitais” da Verbo Jurídico.
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