Desenvolvimento Sustentável

DO BNDE AO BNDESG: UMA REFLEXÃO SOBRE SUA TRAJETÓRIA ESG

Desde a aprovação de sua primeira política ambiental em 1999, o banco vem avançando de forma estruturada, mas ainda há grandes desafios.

Com os 69 anos recém completados, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) acumula uma extensa lista de serviços prestados ao desenvolvimento sustentável do Brasil. Desde 2009, por exemplo, contabiliza mais de R$ 1,3 trilhão desembolsado, em especial para infraestrutura e desenvolvimento industrial.

Nos aspectos ambientais, sociais e de governança (ESG), o BNDES é pioneiro, especialmente por esta agenda ter emergido no banco a partir do conceito de responsabilidade socioambiental. Ou seja, vai além das preocupações com riscos e oportunidades financeiras, que ainda são o foco da agenda ESG da maior parte de investidores tradicionais.

Como instituição financeira de desenvolvimento (IFD), esta postura é necessária. Aliás, isso demanda que o banco siga acelerando em termos de políticas e processos, ainda que seja reconhecido como um dos destaques nacionais no tema.

Os primeiros passos
Fundado em 1952, como BNDE, sua missão inicial era ser o órgão formulador e executor da política nacional de desenvolvimento econômico, com foco na industrialização. Em 1982, seu nome ganhou um “S”, e o tratamento de temas sociais e ambientais cresceu nos anos seguintes. A primeira unidade dedicada ao meio ambiente foi criada em 1989, vinculada à Área de Planejamento. No final dos anos 2000, o banco fortaleceu a institucionalização desta agenda como algo transversal, com uma Política Socioambiental indicando procedimentos para as diferentes etapas do processo de concessão de crédito. Também efetuou mudanças na sua estrutura organizacional, com a criação de uma área de Meio Ambiente, que elevou o status da temática ambiental, anteriormente limitada a um departamento.

A questão social também se fortaleceu por meio de estratégias focadas em inclusão produtiva, apoio direto a governos locais e fomento a arranjos produtivos locais. Por outro lado, o envolvimento em projetos de grande porte atraiu críticas da sociedade civil sobre os impactos sociais adversos.

A Reponsabilidade Socioambiental
Em 2010, o banco aprovou sua Política Corporativa de Responsabilidade Social e Ambiental (PRSA), que foi atualizada em 2014, à luz da regulação do Conselho Monetário Nacional. A PRSA serviu como um guia da agenda socioambiental no banco, e avanços foram notórios – como o compromisso de não financiar novas usinas termelétricas a diesel, e as diretrizes socioambientais para apoio financeiro à mineração.

Foi criado um plano plurianual para implementação progressiva da PRSA, cobrindo a governança do tema, gestão do risco socioambiental e processos de diálogo e prestação de contas. Tal documento estabeleceu uma primeira agenda de trabalho, para o período 2015-2017. A maior parte das ações foi implementada, conforme análise independente realizada à época. Na sequência, um novo plano foi criado para 2018-20.

A PRSA ganhou nova versão em 2019, desta vez com consulta pública, e o banco passou a analisar e divulgar a correlação dos recursos concedidos com os 17 ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. No G do ESG, aliás, o BNDES avançou e certamente é um dos mais transparentes do mundo, entre centenas de IFDs nacionais e regionais.

Porém, a sociedade civil ainda tem acesso limitado a informações de impactos socioambientais das operações de apoio financeiro, ao contrário do que ocorre em algumas IFDs internacionais. Instrumentos de monitoramento de impactos socioambientais com transparência e participação de grupos afetados pode permitir ao banco decisões mais tempestivas sobre a mitigação, compensação e reparação de eventuais danos naqueles projetos de alto risco.

No tema socioambiental, a histórica atuação do BNDES também passa por produtos financeiros dedicados a corrigir distorções. Nos últimos meses, o destaque positivo foi a mobilização do banco para iniciativas de combate aos efeitos sanitários e econômicos da Covid-19. Por outro lado, o Fundo Amazônia – grande exemplo de transparência e efetividade de recursos –, segue travado desde 2019, evidenciando que o G do ESG ainda pode esbarrar em questões políticas de seu controlador. Diversas organizações da sociedade civil divulgaram uma Carta Aberta ao banco cobrando a liberação de mais de R$ 2 bilhões parados no Fundo Amazônia, Fundo Clima e Fundo Social.

ESG é o caminho?
Embora o BNDES conte hoje com um arcabouço de normas e compromissos socioambientais, os emergentes desafios socioambientais brasileiros, o crescimento da agenda ESG no país e a nova estratégia do banco – reduzindo seu aporte financeiro direto e ampliando seu papel como estruturador de projetos e promotor do mercado –, demandam novas competências e compromissos.

Mais de 50% de sua carteira de crédito direta está em projetos de economia verde e desenvolvimento social, mas seu papel estruturador vem crescendo e demanda avanços nas diretrizes socioambientais de sua “Fábrica de projetos”; e na sua atuação no mercado de capitais, fomentando e priorizando fundos e gestoras com boa performance ESG e teses de impacto positivo.

Não é necessário mudar de nome, nem cair no clichê de repetir que “o ESG está no DNA”. Se o caminho se faz caminhando, a trajetória do BNDES seguirá sendo reflexo das medidas que o banco lançar mão enquanto indutor do desenvolvimento sustentável - inclusive por meio do ESG - no país.

Guilherme Teixeira e Júlia Ferrato
são, respectivamente, gerente e analista de finanças sustentáveis na SITAWI Finanças do Bem.
www.sitawi.net


Continua...