Poucas mudanças em conselhos de administração repercutem tanto quanto a chegada de celebridades. Não é só Brasil e não é de hoje. Em 1968, Cary Grant, estrela de Hollywood que trabalhou com Alfred Hitchcock, Katharine Hepburn e foi a referência de Ian Fleming na idealização do personagem James Bond (papel que recusou representar), tornou-se conselheiro da empresa de cosméticos Fabergé. Grant não foi o primeiro e depois dele muitos outros vieram. Recentemente, o fenômeno passou pelo Brasil e deixou o mundo corporativo agitado.
E por que tamanho burburinho? Arrisco dizer: quando uma celebridade chega ao posto de conselheiro, arrasta com ela sua fama e todos nós, fãs ou críticos, entusiastas ou céticos, nos vemos imersos em um intenso debate sobre governança corporativa.
É uma boa oportunidade para relembrarmos e refletirmos sobre as boas práticas de composição do conselho de administração. O Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC exemplifica uma série de características abonadoras da qualificação de um conselheiro: alinhamento e comprometimento com os princípios, valores e código de conduta da organização; visão estratégica; disposição para defender seu ponto de vista a partir de julgamento próprio; capacidade de comunicação; disponibilidade de tempo; capacidade de trabalhar em equipe; conhecimento das melhores práticas de governança corporativa; capacidade de interpretar relatórios gerenciais, contábeis e financeiros e não financeiros; conhecimento sobre a legislação societária e a regulação; conhecimentos sobre gerenciamento de riscos.
Somente a qualificação, no entanto, não basta. Como ensina o código do IBGC, o conselho é um órgão colegiado “cujo desempenho depende do respeito e da compreensão das características de cada um de seus membros, sem que isso implique ausência de debates de ideias”.
Nesse sentido, a diversidade de perfis é uma vantagem competitiva, pois propicia a pluralidade de pontos de vista e o exercício do contraditório, fatores fundamentais para a robustez do processo decisório, para a consideração efetiva de impactos ambientais e sociais das decisões, para a inovação e a disrupção.
Questões de gênero e raça estão em evidência, mas a lista de categorias de diversidade tem crescido: conhecimentos, experiências, competências, comportamentos, aspectos culturais, faixa etária, origem geográfica, orientação sexual, étnica, dentre tantas outras.
Precisamos ampliar cada vez mais os debates sobre o papel das empresas e de seus conselheiros, sobre propósito e o conceito de sucesso, sobre todas as nuances de diversidade e seus benefícios. Essa pauta também inclui vieses inconscientes, ética, potenciais conflitos de interesse. Discutimos intensamente todos esses pontos nos últimos dias e vale enfatizar: tudo isso é governança corporativa.
Não existe uma fórmula pronta. E é isso que faz da governança corporativa um sistema vivo, dinâmico e moderno. Conselhos diversos também serão diversos entre as diferentes organizações. O importante é que o mix dessa composição atenda às necessidades de cada empresa. Afinal, um conselho de administração continua sendo um órgão de administração. Cabe ao conselho decidir os rumos estratégicos do negócio, monitorar, avaliar e estabelecer os incentivos corretos para a diretoria, além de zelar pelos princípios e valores da organização.
Pedro Melo
é diretor geral do IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.
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