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O mercado de finanças sustentáveis apresenta oportunidades para o setor produtivo de uso intensivo da terra. As empresas devem traçar planos de ações concretos visando uma transição gradual para um modelo de negócios mais verde e inclusivo, e as operações baseadas em desempenho são uma oportunidade para isto.
Os setores produtivos que fazem uso mais intenso da terra têm potencial de reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa até 14 bilhões de toneladas de CO2 por ano, até 2050. Os custos para isto, conforme também é sinalizado pelo Observatório do Clima, é menos de U$S 100 por tonelada de emissão, considerando que já existem tecnologias que viabilizariam a mitigação por menos de US$ 20 a tonelada.
Essa adaptação se faz urgente frente ao cenário alarmante de que, na última década, observou-se o maior nível de crescimento de gases de efeito estufa até hoje verificado, segundo o Sexto Relatório de Avaliação (AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), lançado no início de 2022. A intensificação das emissões ocorreu apesar do problema já ter reconhecimento em escala global.
A expansão do uso de tecnologias agropecuárias que mantenham um padrão de baixa emissão, contribuam para a conservação da biodiversidade e que gerem resiliências às mudanças do clima necessita da concretização de um ecossistema de finanças que torne exequível essas mudanças, como já previa o Plano ABC (Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas Visando à Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura), criado pelo Governo Federal em 2012. Nesse ínterim, o mercado de títulos rotulados, onde crescem as emissões de green bonds, social bonds e sustainable bonds, vem oferecendo oportunidades, ainda que de maneira tímida, para que os setores agropecuário e florestal possam contribuir mais expressivamente para uma economia verde, inclusiva e sustentável.
Conforme as informações apresentadas no banco de dados da NINT (spin-off do Programa de Finanças Sustentável da SITAWI), que abrange operações rotuladas públicas de empresas brasileiras, o setor agropecuário já realizou 62 operações rotuladas desde 2019, entre bonds (títulos) e empréstimos. No total, essas operações movimentaram cerca de R$ 22,14 bilhões, sendo R$ 4,69 bilhões gerados em 2022 e 2023.
As operações baseadas em desempenho ASG vêm demonstrando-se como ferramentas financeiras capazes de estimular mudanças corporativas – cultural, estrutural e operacional - para os setores altamente poluentes e que, normalmente, não se enquadrariam em emissões com rótulo essencialmente verde. Diferentemente das operações baseadas em uso de recursos que visam financiar projetos ou ativos predefinidos que tenham impactos socioambientais e climáticos positivos, os instrumentos baseados em desempenho possuem uso de recurso livre. Ou seja, o dinheiro captado não necessariamente precisa ser implementado em projetos específicos. Então, se em uma operação verde, por exemplo, o uso do recurso captado vai estar atrelado a implantação de uma tecnologia não intensiva em carbono, uma operação baseada em desempenho vai estar relacionada ao atingimento, por parte do emissor, de metas pré-estabelecidas para indicadores materiais sob o ponto de vista dos stakeholders – como reduzir o nível de emissões de GEE do escopo 1 e 2. Por isto, para muitos investidores, esses instrumentos são uma oportunidade de um discurso ASG virar um incentivo real de mudança e impacto.
As operações de desempenho representam 25% das operações realizadas no Brasil até então, movendo quase metade (46%) do volume total de recursos captados desde 2019. O setor agropecuário representa 23% das operações baseadas em desempenho, com metas atreladas à redução de emissões de GEE, prevenção e controle da poluição, conservação da biodiversidade, eficiência no uso de recursos, redução na geração de resíduos, energia e/ou água e rastreabilidade da cadeia de fornecedores.
A partir desses instrumentos, há oportunidade para que empresas estabeleçam planos de ações concretos para um direcionamento mais direto para um modelo de negócios mais verde, inclusivo e mais maduro em termos de governança corporativa. Assim, o setor intensivo de uso da terra tem espaço para deixar de ser parte das causas da mudança climática, para se tornar, cada vez mais, parte da solução. À medida que velhos setores precisam ser rapidamente descarbonizados e, para isto, largas quantias de investimentos necessitam ser destravadas, o mercado se expande para viabilizar esse caminho com bases científicas confiáveis e compromissos/metas ambiciosas. Apesar de ainda não se serem o mainstream das finanças sustentáveis, as operações de desempenho se constituem em uma tendência para encorajar o setor intensivo em uso da terra a adotar boas práticas ao longo de toda sua cadeia de produção, contribuindo de forma eficiente para os acordos climáticos globais e práticas sociais responsáveis.
Camila Horst Toigo
é consultora senior de Finanças Sustentáveis da NINT.
camila.toigo@nintgroup.com