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Quando ocorre um “escândalo”, como o da Americanas... chega uma hora, por mais que os acionistas majoritários tentem esconder, que a conta aparece e aí não tem jeito, a caixa preta tem que ser aberta e a pergunta que fica é sempre a mesma: quem vai pagar a conta? Por isto, estabelecem-se regras de Governança tais como as propostas nos códigos de melhores práticas do IBGC, que tentam proteger os minoritários e demais “partes interessadas” (stakeholders).
O tema correlato mais em voga atualmente no mercado de capitais é o ESG - em inglês, Environmental, Social e Governance, para tentar frear o furor pelo lucro financeiro. O caso da Americanas foi obviamente um exemplo de má governança e mais do que isto, a meu ver, falta de integridade.
Quero destacar três pontos neste artigo: i) governança corporativa, seja pública ou privada, começa por integridade; ii) o eixo econômico não pode estar separado do socioambiental nas empresas, ou seja, não vale relatório ESG “para inglês ver”. Da mesma forma, o eixo fiscal não está dissociado do socioeconômico no modelo de um ente público. iii) Precisamos, portanto, de melhores processos, controles e indicadores de desenvolvimento, que mensurem retornos ESG e econômicos conjuntamente, tanto para as empresas quanto para os governos, no curto, médio e longo prazo, através de um modelo multifatorial de otimização dinâmica. Apresenta-se o IPS, índice de progresso social – já implantado na cidade do Rio - o conceito de “comunitarismo” e o modelo de desenvolvimento territorial (MDT).
A inflação não é uma boa forma de se acomodar as demandas do Congresso, mas também não podemos regredir em determinadas pautas represadas pelo governo anterior. A pergunta remanescente é quanto cada um dos stakeholders está levando do “bolo”? Temos que abrir a caixa preta e construir consensos mínimos para o futuro, com responsabilidade fiscal, social e acima de tudo, ética e transparência. Rumo a uma trajetória que gere confiança, saber escolher os indicadores certos, uma meta comum.
Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de economia, já antes do coronavírus, alertava para as três crises existenciais que o mundo vinha passando: uma crise climática, uma crise de desigualdade e a crise da democracia. As perguntas que ele fazia na ocasião eram:
“Seremos capazes de avançar sem ultrapassar os limites do planeta? A economia moderna poderá oferecer prosperidade compartilhada? As democracias resistirão, caso as economias fracassem? São questões críticas, e mesmo assim as medidas hoje aceitas para aferir o desempenho econômico não dão absolutamente nenhum sinal de que podemos estar enfrentando problemas. Cada uma dessas crises reforça o fato de que precisamos de ferramentas melhores para avaliar o desempenho econômico e o progresso social. O mal-estar social alastra-se, o colapso da natureza avança e a democracia declina. Se ainda assim o termômetro que afere o ‘sucesso’ das sociedadesnos diz que tudo vai bem - então, é preciso trocá-lo por outro”.
O PIB per capita não é uma boa métrica para medir o grau de desenvolvimento de um país, muito menos Estado ou cidade. O PIB é muito impactado por atividades relacionadas à indústria extrativa, sem penalizar a desigualdade nem o desgaste do meio ambiente, além de não computar adequadamente a economia criativa. A alternativa proposta por Amartya Sen, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), é muito adequada para ranquear os países ou mesmo municípios, mas não tão boa para avaliar os resultados de política pública num prazo mais curto, pois as varáveis contidas no IDH - renda média, expectativa de vida e nível de escolaridade - demoram muito a reagir.
Para avaliar os resultados das políticas públicas lá “na ponta”, ou seja, os impactos reais nos territórios, foi criado por Michael Porter, o IPS (índice de progresso social), que aborda aspectos sociais, ambientais e de direitos humanos e hoje é atualizado pela Rede de Progresso Social. Foi inicialmente proposto para a escala global, mas tem sido aplicado para diferentes realidades, inclusive implantado na cidade do Rio em 2015. Ele baseia-se num modelo holístico e rigoroso com indicadores em 12 componentes e três dimensões: Necessidades Básicas, Fundamentos do Bem-Estar e Oportunidades. O IPS mede os resultados que importam para a vida das pessoas, e não o custo ou os esforços para alcançá-los, ou seja, é um indicador de resultados integrados das políticas públicas nos territórios, tais como: acesso à água canalizada, população vivendo em favelas não-urbanizadas, homicídios e roubos de rua, na dimensão de Necessidades Básicas; dados de abandono escolar, quantidade de áreas não urbanizadas e acesso à internet, na dimensão de Fundamentos do Bem Estar e indicadores como homicídios por ação policial, violência contra a mulher, vulnerabilidade familiar e acesso a nível superior por negros e indígenas no âmbito de Oportunidades. No IPS Rio são calculados os resultados para os 36 indicadores que contemplam as três dimensões da metodologia nas 32 Regiões Administrativas da cidade de dois em dois anos desde então.
O único caminho que me parece viável para mantermos a democracia é uma radical descentralização do poder. Do governo federal para os Estados e municípios e dos prefeitos, territorialmente para os bairros, favelas e dando mais poder à sociedade civil. Uma espécie de “comunitarismo” através de um modelo de desenvolvimento territorial (MDT). O MDT é composto por três etapas. A composição de um conselho de atores envolvidos e comprometidos com o desenvolvimento do território; a pactuação de metas de desenvolvimento holísticas; e, uma matriz de responsabilidades para se alcançar e monitorar as metas. Para dar certo, depende de representatividade dos atores, informação qualificada e empoderamento do conselho. Precisamos de uma meta, um guia; daí a importância dos indicadores econômicos e sociais. São eles que pautam toda a informação, a composição do saber da sociedade e os rumos dos países e entes subnacionais.
Propõe-se então que indicadores de resultados das políticas públicas tais como o IPS sejam usados nas estatísticas junto aos indicadores econômicos usuais tais como Renda, Inflação, PIB, nível de atividade e desemprego.
Eduarda La Rocque
é Doutora em Economia pela PUC-Rio.
eduarda@usinapensamento.com.br