Orquestra Societária

DESALINHAMENTO ENTRE PROPRIETÁRIOS: CUSTOS POTENCIAIS & MITIGAÇÃO DE RISCOS

Nas edições no 183 e 184 desta Revista RI, apresentamos, respectivamente: 1) Um conjunto de aspectos principais e não exaustivos que podem impactar o alinhamento de interesses entre proprietários (categorias e respectivas agendas; formas de controle societário e tratamento do pequeno proprietário ou minoritário; princípios éticos e formais de tratamento dos stakeholders; alternativas de retornos presentes versus retornos futuros; e alternativas de fontes de financiamento de projetos); e, 2) Alguns exemplos, também não exaustivos, por meio dos quais se buscou ilustrar como o desalinhamento pode ocorrer.

Neste artigo, o qual completa a sequência iniciada pelos dois textos anteriores, desenvolveremos algumas ideias sobre os custos potenciais do desalinhamento, bem como sobre como mitigar riscos. Inicialmente, discorreremos sobre a questão dos custos, tomando, como exemplos, cinco dos 12 mini-cases relacionados no artigo da edição no 184; para cada caso, apresenta-se breve comentário sobre os possíveis custos associados à divergência entre proprietários:

INDIVÍDUOS x FAMÍLIA
(ESTRATÉGIA E CULTURA FAMILIAR)

Um Grupo Empresarial tem como fundadores e acionistas controladores (majoritários) os membros de uma família, além de outros acionistas não controladores (minoritários). Um dos filhos exerce, no momento, a Presidência Executiva, enquanto outros membros ocupam posições no Conselho de Administração e na Diretoria Executiva. O Presidente tem planos de expandir o Grupo; entretanto, os demais membros da família não concordam com a lógica de crescimento pretendida, a qual pode implicar a necessidade de novos sócios que não sejam membros familiares. Os acionistas não controladores estão alheios às discussões.

Comentário: O principal custo potencial que desponta, no exemplo, é o da oportunidade eventualmente desperdiçada de crescimento, caso seus fundamentos econômicos sejam robustos. Note-se que a resistência ao ingresso de novos sócios constitui o entrave mais visível à oportunidade citada. Ao mesmo tempo, custos adicionais não tão evidentes poderão emergir, como por exemplo, aqueles associados à paralisia de outros planos empresariais, postergados pela indefinição. Todos esses custos onerarão todos os proprietários.

GRUPO EMPRESARIAL x GRUPO EMPRESARIAL
(ENTREGA DE RESULTADOS)

Um Grupo Empresarial tem como acionistas controladores dois outros Grupos Empresariais - Grupo 1 e Grupo 2 -, bem como outros acionistas não controladores. Os Grupos 1 e 2 discordam fortemente sobre manter x destituir alguns executivos. O Grupo 1 entende que os resultados financeiros da Companhia não estão satisfatórios nos primeiros meses do ano em curso e que há necessidade de mudanças imediatas, em função de suas projeções de retiradas de dividendos, superiores aos valores previstos no orçamento aprovado. O Grupo 2, por sua vez, defende que ainda não teria dado tempo de iniciativas aprovadas para aumentar os lucros de curto prazo gerarem os resultados desejados, os quais somente se farão perceber nos anos seguintes. Parte dos acionistas não controladores têm percebido certa tensão entre os Grupos 1 e 2.

Comentário: Sob o prisma do Grupo Empresarial sub judice, vislumbram-se duas situações, cada qual com seus custos potenciais associados. Na primeira hipótese, a percepção do Grupo 1 é a mais adequada e se não houver as mudanças de curto prazo por ele vislumbradas, perder-se-á a oportunidade de agregar valor econômico. Na segunda hipótese, a percepção do Grupo 2 é aquela mais apropriada e se não houver um tempo de maturação das iniciativas em implantação, perder-se-á, também, a oportunidade de agregar valor. Se o desalinhamento influir nas discussões, tornando-as menos eficazes, ao ponto de prejudicar a decisão tomada, a Empresa e, portanto, todos os seus proprietários serão onerados.

CONTROLADOR x NÃO CONTROLADORES
(PRÁTICAS DE GOVERNANÇA)

Um Grupo Empresarial tem como acionista controladora uma Família, fundadora, bem como outros acionistas não controladores. A administração da Companhia é ocupada por membros da Família ou por pessoas por ela indicadas. Os acionistas não controladores não têm qualquer tipo de representação na administração, ainda que a Empresa opere dentro dos limites legais. Os membros da Família controladora têm utilizado, eventualmente, a estrutura empresarial para conforto de suas vidas pessoais (exemplo: veículos, materiais de consumo e serviços de empregados).

Comentário: No exemplo em questão, o uso da estrutura empresarial pelos proprietários controladores tem custo. Os proprietários não controladores arcam com parte desse custo, sem, entretanto, usufruir de seus benefícios.

INTERPRETAÇÕES DISTINTAS SOBRE A LEGISLAÇÃO APLICÁVEL À COMPANHIA E SOBRE A RESPONSABILIDADE CORPORATIVA
(LEGISLAÇÃO E RISCOS)

Um Grupo Empresarial tem um acionista controlador, investidor individual, bem como outros acionistas não controladores. O investidor citado deixa de convocar uma Assembleia Extraordinária de Acionistas - AGE - para aprovar determinadas transações previstas na Lei das Sociedades Anônimas (Lei das S/As), as quais alteram significativamente o futuro organizacional. Algum tempo após, alguns dos demais acionistas questionam, junto ao Poder Judiciário, a não convocação da AGE, bem como as implicações da adoção das transações citadas, em termos da responsabilidade corporativa em relação à Companhia e sua capacidade de honrar compromissos financeiros. Com respeito à convocação da Assembleia, a Justiça entende que os referidos acionistas poderiam, eles mesmos, ter convocado a AGE em questão, com base na própria legislação vigente; já com relação ao risco das transações citadas, a Justiça conclui que as informações prestadas pelos reclamantes não são suficientes para o pleno entendimento do problema ou para caracterizar qualquer tipo de ilegalidade.

Comentário: Em primeiro lugar, destaca-se o custo da opção judicial adotada pelos proprietários não controladores, considerando que o Poder Judiciário não considerou seu pleito razoável. Em segundo lugar, se porventura existirem transações inadequadas aos interesses da Companhia, e se estas prosseguirem, em função da contenda entre proprietários, em tese, todos os proprietários poderão ser prejudicados (não se considera, aqui, a possibilidade de uma agenda oculta do proprietário controlador que lhe faculte vantagens não percebidas pelos demais agentes, o que, em tese, poderia ocorrer).


Continua...