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GOVERNANÇA BRASILEIRA BEM POSICIONADA EM ESTUDO INTERNACIONAL

O Brasil figurou no segmento superior em recente estudo elaborado pela ACCA - Association of Chartered Certified Accountants e pela KPMG que buscou traçar um panorama global dos padrões de governança corporativa aplicáveis a emissores de títulos e valores mobiliários. 

No total, 25 jurisdições foram analisadas em relação à observância dos princípios recomendados pela OCDE, segundo 15 temas predefinidos. Foram avaliados 10 países considerados desenvolvidos – UK, US, Cingapura, Austrália, Hong Kong, Taiwan, Coreia, Nova Zelândia, Canadá e Japão – e 16 em desenvolvimento – os cinco BRICS e mais 11 países asiáticos, região de destaque entre os emergentes.

A ACCA é uma entidade que reúne 170 mil contadores em 180 países e existe há mais de 100 anos. Promove educação e pesquisa internacional com o objetivo de evidenciar o valor da contabilidade para a sociedade e assegurar que a profissão continue a crescer em reputação e influência. O estudo foi realizado pela ACCA Cingapura em parceria com a KPMG e analisou dados sobre a Governança vigente em cada país em setembro de 2014.

Dentre os códigos pesquisados, a grande maioria se tratava de códigos obrigatórios (63%), em segundo lugar vieram os códigos voluntários, adotados em 25% das jurisdições pesquisadas e, em terceiro, os códigos ditos principiológicos, com enforcement baseado no conceito de “aplique ou explique” (modelo adotado pelo Código Abrasca), adotados em apenas 12% das jurisdições.

Os quatro “pilares” da boa governança analisados pelo estudo, e ordenados por seu grau de importância na média dos diversos códigos, foram: (i) Liderança e cultura; (ii) Estratégia e performance; (iii) Compliance e supervisão e (iv) Engajamento de stakeholders. Sob cada um desses pilares foram analisados quinze temas e a cada um deles atribuído um nível percentual de observância aos princípios preconizados pela OCDE.

Os quinze temas tratados no estudo, conforme seu nível de importância apurado nos códigos de governança, foram: (i) Comitê de Remuneração, (ii) Comitê de Auditoria, (iii) Independência da Diretoria, (iv) Regramentos do Conselho de Administração, (v) Comitê de Indicação; (vi) Estruturas Remuneratórias; (vii) Composição do Conselho, (viii) Direitos dos Acionistas; (ix) Abertura de Informações; (x) Seguros; (xi) Recursos e dedicação da Administração; (xii) Avaliação de Performance; (xiii) Política de Riscos; (xiv) Engajamento de Stakeholders; e (xv) Diversidade do Conselho.

Nesse sentido, as 25 jurisdições foram ranqueadas segundo sua posição relativa à média dos mercados desenvolvidos e à média dos mercados em desenvolvimento que fazem parte do grupo total analisado. Dentre elas, 10 se posicionaram acima da média dos mercados desenvolvidos, incluindo o Brasil, 10 abaixo da média dos mercados emergentes e 5 foram considerados mercados de scoring médio.

Mais do que isso, o mercado de capitais internacional é, em última instância, um espaço de disputa dos emissores pelos recursos dos investidores internacionais para fazer frente às suas necessidades de investimentos. Nesse sentido, a jurisdição sob a qual está submetido o emissor é um determinante importante das práticas de governança corporativa adotadas pelas companhias. E é sua posição relativa que importa: como ela está posicionada perante as demais jurisdições.

O estudo mostrou que 16 dentre os 25 mercados possuem códigos alinhados em pelo menos 80% com os princípios preconizados pela OCDE. Chama a atenção o fato de que o Canadá está desalinhado em mais de 50% com o regramento de governança corporativa da OCDE, embora seja uma jurisdição que possui uma bolsa de valores pujante, que oferece capital de risco a micro-empreendedores e que tem financiado investimentos que propiciam uma taxa média de crescimento do PIB de 2,5% ao ano ao longo dos últimos 35 anos.

O Brasil foi classificado como uma das 10 melhores jurisdições do estudo (9º lugar no ranking global), à frente da China e da África do Sul, entre os BRICS, e dentro do grupo que atingiu média superior àquela observada dentre os mercados desenvolvidos do grupo de 25 jurisdições analisadas (4º lugar no ranking dos países em desenvolvimento). No Brasil, foram considerados para avaliação os dispositivos da Lei 6404, as regras de listagem do Novo Mercado e o Código do IBGC.

Os 15 principais temas de governança corporativa tratados em cada jurisdição foram ordenados e os três principais fatores de força da jurisdição brasileira, conforme ressaltado no estudo, são: (i) diversidade dos conselhos de administração e fiscal, (ii) transparência e abertura de informações e (iii) política de gestão de riscos.

No outro extremo, os temas em que a jurisdição apresenta menos força são: (i) regramentos para o conselho de administração, (ii) estruturas de remuneração e (iii) independência dos conselheiros.

Assim, o estudo também desenha um caminho para a evolução da governança corporativa no Brasil, qual seja a definição mais clara dos papéis e responsabilidades dos conselheiros, dos momentos e situações de impedimento e definição de uma política de conduta e ética aplicável aos órgãos colegiados.

O estudo também deixa claro que dentre os modelos de enforcement pesquisados, aquele baseado no princípio de “aplique ou explique” possui um volume bastante superior de exigências que os códigos de governança mandatórios ou voluntários. Nesse sentido, ressalta o estudo, os códigos chamados principiológicos são uma poderosa ferramenta para indicar tendências em governança corporativa, contribuindo para um sustentável incremento dos padrões de governança praticados.

Outra importante sinalização que o estudo traz é que o risco de desalinhamento das exigências e regras dos padrões de governança é tanto maior quanto mais numeroso o conjunto de códigos e regramentos coexistente em uma jurisdição. O relatório completo do estudo pode ser encontrado no site da ACCA: www.accaglobal.com em Research & Insights - “BALANCING RULES AND FLEXIBILITY”

Considerando as conclusões do estudo, é acertado o movimento que vem sendo liderado pela CVM junto às entidades autorreguladoras para que haja um alinhamento dos três principais regramentos de governança empresarial brasileiros: (i) o Novo Mercado da BM&FBovespa, mandatório para todas as companhias participantes; (ii) o código de autorregulação da Abrasca, principiológico e com enforcement das regras baseado em “aplique ou explique”; e (iii) o código do IBGC, de adoção voluntária.

O resultado final desse esforço será a compilação de um código nacional de governança corporativa, baseado no conceito de “aplique ou explique” introduzido no Brasil em 2011 pelo Código Abrasca de Autorregulação e Boas Práticas das Companhias Abertas.

A jurisdição brasileira ainda está aquém de jurisdições desenvolvidas como Reino Unido, EUA, Cingapura, Austrália e Hong Kong e, em desenvolvimento, como Malásia, Índia e Rússia. Ou seja, muito ainda precisa ser feito. As comemorações pelos 50 anos das leis 4.595/64 e 4.728/65, que criaram os fundamentos modernos do mercado de capitais no Brasil, nos remetem ao atual nível de maturidade dos principais marcos regulatórios brasileiros e à necessidade de avançarmos ainda mais.

Nesse sentido, uma CVM forte, autônoma e bem equipada é fundamental, sendo que o papel das entidades do mercado de capitais é apoiar de forma construtiva as iniciativas da autarquia, além de valorizar e respeitar todos os participantes do mercado de capitais.


Antonio D. C. Castro
é presidente da ABRASCA - Associação Brasileira das Companhias Abertas.
abrasca@abrasca.org.br


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