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O mercado de capitais brasileiro precisa de mais leis ou de enforcement (capacidade de aplicação das leis)? Durante o “Café com a CVM”, evento organizado pelo IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), no último dia 6 de agosto, como parte das comemorações dos 20 anos do Instituto, a segunda alternativa teve forte presença nos debates.
Participaram da mesa de debates o atual presidente da CVM, Leonardo Pereira e os ex-presidentes Marcelo Trindade, Francisco da Costa e Silva e Roberto Teixeira da Costa, um dos fundadores da entidade. Pelo IBGC, a presidente de seu Conselho de Administração, Sandra Guerra, colocou as questões e coordenou a mesa, que também abordou temas como governança nas estatais e atuação da CVM.
Para Leonardo Pereira, atualmente o enforcement é mais importante que criar mais leis e a questão é sua prioridade à frente da CVM. Este é o elemento que pode fazer diferença no mercado de capitais e na atuação da CVM, acrescentou.
“Não adianta ter punições previstas em lei se elas não são aplicadas,” afirmou Costa e Silva para quem o enforcement é fundamental para a CVM. Na avaliação dele, a pessoa tem que temer a punição para que não surjam desvios de comportamento. Costa e Silva lembrou ainda o fato de existirem uma série de aparatos legais que precisam ser melhor utilizados.
Como exemplo citou a Lei 9457/97 que permite uma espécie de acordos de delação premiada que podem ser feitos pela CVM, mas que não são utilizados. Em síntese, a lei alterou a configuração do conjunto de normas relativas ao mercado de capitais para adaptá-las à nova realidade regulatória.
Teixeira da Costa, observou que o aparato legislativo do Brasil é bom, o problema está na execução das leis. Na avaliação dele, o enforcement deve ser prioridade da CVM em questões como o insider trading. Em relação a atração de mais investidores, ele diz que existem fatores mais importantes que o enforcement, como criar mais previsibilidade e confiabilidade.
“O Brasil não precisa de mais leis. O problema do mercado de capitais hoje está fora do mercado.” Para ele, a fraqueza de nosso mercado vem de questões éticas e culturais. “As recomendações de fundos de investimentos tem menos de 20% para carteiras de investimento em ações, quando nos Estados Unidos é de no mínimo 60%”, acrescentou.
Nas exigências dos investidores o enforcement não é o primeiro colocado da lista. Segundo Sandra Guerra, na consulta a investidores minoritários feita pelo IBGC para o lançamento da quinta revisão do Código de Boas Práticas de Governança, a alteração campeã de pedidos pelos investidores é a que dá a cada ação um voto.
Governança nas estatais
Embora estejam entre as melhores do mundo, as regras de governança vigentes no Brasil não impediram a prática desenfreada de atos lícitos – como mostra a corrupção na gestão da Petrobras e de outras companhias estatais, que agora estão sendo reveladas.
Na avaliação de José Guimarães Monforte, ex-presidente do IBGC, que atuou como Conselheiro de Administração da Petrobras, o enforcemenet é importante, mas é tardio sobretudo no caso da estatal. A Petrobras tem o melhor conjunto de governança entre as empresas abertas, diz ele, mas isso não evitou a corrupção desenfreada na sua gestão.
O escândalo Petrobras abriu um armário de esqueletos assustadores, mas o modo como estão sendo encarados não deixa de apontar mudanças importantes na aplicação da lei que se estenderá para um maior rigor na prática da governança.
“Acho que o país vai ser diferente depois da aplicação de punições àqueles que se achavam inatingíveis como está acontecendo com as pessoas investigadas pela operação Lava a Jato. O que está acontecendo mostra que o país tem instituições fortes”, observou Costa e Silva.
Para Trindade, a operação Lava a Jato criou uma oportunidade de discutir a falta de preparo de pessoas levadas à gestão das companhias estatais e essa é uma oportunidade que não pode ser perdida. As estatais no Brasil, disse ele, conseguiram o pior de dois mundos: a companhia é tocada pela administração, o governo que é controlador não cuida da companhia a não ser quando precisa tirar proveito.
Em junho deste ano, o senador Aécio Neves (PSDB) apresentou projeto de lei, cujo objetivo é dar um ‘upgrade’ na administração das estatais. O projeto, que foi coordenado por Trindade e pelo ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, cria impedimentos para indicações meramente políticas para cargos de gestão das estatais e regras para que as pessoas escolhidas tenham capacidade para estar naquela função.
Também com o objetivo de melhorar as práticas de governança das estatais, a equipe de regulação da BM&F Bovespa, com apoio da CVM, elaborou o Programa de Governança de Estatais, com o objetivo de aprimorar as práticas relativas à prestação de informações e à estrutura de governança das empresas estatais.
Apesar de bem vindos, os esforços para ampliar a governança nas estatais coloca questões que precisam ser avaliadas com cuidado. Para Pereira, a exigência de práticas específicas para as estatais pode criar assimetria no mercado. “Não podemos exigir mais das sociedades de economia mista que de outras companhias abertas privadas. O desafio é fazer da governança corporativa algo que valha para todo mundo.”
Outra questão importante para a melhoria da governança na gestão é criar melhores condições para a atuação do Conselho de Administração. Segundo Costa e Silva, uma das prioridades é dar mais tempo para que os conselheiros possam avaliar as demonstrações contábeis. “Hoje em dia as demonstrações são entregues no dia da reunião do conselho”.
Falando sobre a administração da Petrobras, Monforte acrescenta que é preciso uma revisão de todos os procedimentos e controles da estatal. A recomendação dele é dar mais tempo para que os conselheiros possam comprovar se a companhia de fato está praticando as regras a que está sujeita.
O principal desafio da governança é passar da teoria à prática, observou Teixeira da Costa. Não adianta ter as melhores regras se elas não forem implementadas na prática. “Estamos vivendo mais um movimento de inflexão da história do mercado de capitais.”
CVM e SEC
Respondendo a questão sobre qual o diferencial de atuação da CVM quando comparada a sua correspondente no mercado americano, a SEC (Securities Exchange Commission), em favor de maior governança, Teixeira da Costa ressaltou que ao contrário da SEC, que atua num mercado poderoso em volume de recursos, a CVM não dispõe de recursos suficientes para acompanhar o mercado e sua evolução.
Apesar de poderosa, a SEC não pode tudo como se imagina por aqui. Não tem poder, por exemplo, de desfazer decisões de assembleias quando o direito de voto é questionado, com muitos aqui desejam que a CVM tenha. Trindade observou ainda que além de ser muito criticada no mercado americano, a SEC vive uma série de conflitos com outros órgãos reguladores.
Ao contrário do que ocorre aqui, lá quando os investidores se sentem lesados pelo controlador, a prática comum é irem a justiça reclamar seus direitos. Aqui ele não vai porque a justiça é muito lenta. Mas o investidor de empresas do Nível 2 e do Novo Mercado tem a arbitragem para decidir questões de direito e voto e outras. E a lei brasileira ainda prevê indenizações, acrescentou Trindade.
A CVM tem limitações e vai ser sempre muito difícil responder a tempo e a hora as demandas do mercado. Mesmo assim, na avaliação de Costa e Silva, precisa de aprimoramentos que estão ao seu alcance. Entre eles, cita mais celeridade nas respostas ao mercado e mais rigor na assinatura de Termos de Compromisso.
A proliferação desses termos tem prejudicado a percepção do mercado com relação à punição dos infratores, afirmou. Em 2014 foram assinados 36 termos de compromisso, conforme dados do site da CVM.
Outro ponto que a CVM deveria reavaliar, na avaliação de executivos, é o conceito de participante do mercado. Recentemente um membro do PC do B falou na mídia sobre o pré-sal, dando informações que prejudicaram as cotações das ações da Petrobras na bolsa de valores.
Se fosse considerado um participante do mercado seria autuado pela entidade. No entanto por ser apenas membro de um partido, entendeu-se que ele não era participante do mercado. E nada aconteceu.
Para o atual presidente da CVM a cobrança é positiva. “Hoje estamos tentando nos comunicar melhor com todo o mercado. Estamos sendo mais claros nas nossas decisões.” Para ele, porém, uma coisa é primordial para a CVM: preservar sua independência.
Fechamento de capital
O número de empresas que fecharam capital em bolsa supera o número de novas empresas listadas desde 2007. O fechamento de capital também foi tema do evento “Café com a CVM”, realizado pelo IBGC.
Para o ex-presidente da CVM, Marcelo Trindade, o fechamento do capital é da natureza do mercado. “Não haveria entrada se não houvesse saída”. Segundo ele, a saída de empresas do mercado é absolutamente normal frente a um momento econômico difícil como o atual. “Hoje esse movimento vem mais de uma decisão empresarial do que algo com que se deveria preocupar”.
Para Roberto Teixeira da Costa, quando uma empresa não vê respostas as suas necessidades sob o aspecto de custo de manter uma companhia aberta ela fecha o capital. O problema é que não está havendo abertura de capital. Este ano, apenas uma empresa abriu o capital. Em 2014, o mercado também registrou a entrada de apenas uma empresa.
Na avaliação de Francisco da Costa e Silva, o problema são os fechamentos disfarçados que são feitos através de incorporações, que tem trazido prejuízos para os acionistas minoritários.
Trindade discorda e diz que o Brasil é o país que mais protege os minoritários. “A lei no Brasil é uma das mais protetoras do mundo”, afirma.