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O QUE SERÁ DA ECONOMIA GLOBAL NOS PRÓXIMOS 20 ANOS?

Há mais ou menos 20 anos, a internet estava tomando corpo para uso econômico e comercial e para uso pelas redes sociais. Não havia sequer antivírus adequados para neutralizar a invasão dos vírus. Nesse embalo os algoritmos modernos ascenderam. Foi o frisson das empresas administradoras de database que vendiam dados de clientes, de forma irresponsável. O resultado final foi a bolha da internet que quebrou centenas de empresas virtuais e balançou o mercado de capitais americano. Mas a Internet se recuperou e nada se faz sem ela hoje atualmente.

O primeiro telefone celular foi lançado em teste há 40 anos, dando continuidade ao processo de criação de aparelhos portáteis, iniciado há 60 anos atrás, com o lançamento do rádio portátil transistorizado. E hoje junto nada fazemos sem o celular.

No campo dos transportes, saímos do modelo Ford T até os dias de hoje para o carro elétrico, cuja produção é toda vendida, antes de sair da fábrica, seja no Japão, Europa ou Estados Unidos. O carro sem motorista será o próximo frisson. E não desacreditem que a dependência do automóvel particular possa diminuir até 2050. Estamos entrando na era dos drones e talvez nos próximos 20 anos estaremos, quem sabe, vivendo a era dos Jetsons, pelo menos no transporte de cargas.

O que esperar daqui a 100 anos, que será a expectativa de vida daqueles nascidos hoje na data de sua aposentadoria aos 65(?) anos.

A China, há 40 anos atrás, iniciava sua reforma econômica evoluindo quase que ininterruptamente até 2008, em patamares elevados, chegando a 14% a.a. Daí em diante, desacelerou rumando para práticas de taxa de crescimento na faixa de 6-7% a.a... Transformou-se na locomotiva do mundo e não deseja perder esse protagonismo.

No Brasil, o Plano Real mudou a forma do Brasil pensar economicamente caracterizando-se no último pacote econômico implementado pelo Governo depois de 30 anos de pacotes e mudanças de moeda Cruzeiro Novo, Cruzeiro, Cruzado, Cruzado Novo, novamente Cruzeiro, Cruzeiro Real e finalmente (espero que assim seja) Real, retomando o nome original da época da colonização (no plural Réis).

Há vinte anos, na esteira do Plano Real, a Vale do Rio Doce, o setor siderúrgico e a Embraer eram privatizados, a Telebrás era desmembrada e privatizada e com isso a telefonia celular explodiu. Na área de petróleo, terminava o monopólio da Petrobras.

O processo de privatização exigiu concomitantemente que fossem estabelecidos princípios de Governança Corporativa que resultou na criação do IBGC e no lançamento do primeiro Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. Daí em frente evoluiu até chegarmos ao Novo Código Brasileiro de Governança Corporativa.

Há 20 anos era assinado o Protocolo de Kyoto (dez 1997) estabelecendo as primeiras orientações visando a estabelecer mecanismos para redução do GHG em 5% comparado aos níveis de 1990. A Rio 92 globalizou os objetivos de redução de GHG, inicialmente restrita aos países desenvolvidos.

O Acordo de Paris de 2015 tornou todos os países signatários responsáveis e deu início às discussões sobre mecanismos de implementação em uma forma mais abrangente, com a participação do mercado de capitais.
Há 100 anos, a produção de petróleo começou a alavancar fortemente, junto com o carvão, a economia, mas trazia consigo os efeitos da poluição. No meio desse caminho nos anos 60, há quase 50 anos atrás, o Clube de Roma formado por políticos, empresários, economistas, diplomatas, cientistas sociais, etc., estavam preocupados com a falta de limites para o crescimento econômico e da população. Curiosamente, os primeiros a levantar a questão foram empresários de empresas do ramo automobilístico.

A realidade é que a sociedade humana, com todo esse dinamismo, estabeleceu padrões de crescimento e de mudanças de perfil demográfico jamais registradas em sua história em tão curto espaço de tempo.

Esse contexto de desenvolvimento baseado no crescimento acelerado e de avanço da ciência e tecnologia exige muito do meio ambiente. A conta da externalidade está muita alta. Vamos pagar essa conta nos próximos 20 anos, 40 ou até o fim do século. Hoje é a reforma da previdência, amanhã será a internalização de custos sociais e ambientais. Pior ainda se o aquecimento global ultrapassar aos 2º.

Pagar essa conta pode acontecer pelo velho imposto proposto por Arthur Pigou, em 1912, ou via mercado de carbono, cuja viabilidade exige que cheguemos a um preço de carbono em futuro próximo ou através do financiamento das mudanças de processos via mercado de capitais. Se o mecanismo de preço e os novos títulos verdes não forem suficientes para financiar as mudanças pretendidas por cada pais, é inevitável que o indesejado imposto venha compensar as falhas do processo econômico.

Os Estados Unidos não estão satisfeitos com taxas de crescimento de 2,5 a.a., mesmo com 6% da população tendo ¼ do PIB mundial. Apesar dessa dimensão gigantesca, o atual presidente insiste em "tornar a América grande de novo". A China quer chegar à condição de primeira potência em tamanho de PIB mantendo o patamar de 6% a.a., tendo 20% da população global e a Índia caminhando para uma população superior à China quer manter patamares superiores a 7% a.a. A aritmética é simples. O que queremos não cabe na Terra.

As únicas fontes ilimitadas de recursos naturais são o sol e o vento, mas as formas de captação dessas fontes exigem recursos finitos. Por essa razão, um freio natural acontecerá mesmo com a evolução para processos de produção limpos. A pressão sobre os recursos minerais e das terras raras continuará e sua recomposição não se dará no timing das necessidades humanas.

O passado não vai necessariamente ser replicado no futuro, mas certas tendências históricas são reveladoras e uma delas é que a natureza humana não aceita retrocessos. A produção de carvão cairá nos próximos "20 anos" (apesar de o atual presidente dos EUA insistir no retrocesso), nesse período o petróleo deve ter uso mais restrito na área de transporte, mantendo-se como fonte relevante para o setor petroquímico e mesmo assim haverá concorrência com outras fontes alternativas mais limpas. O automóvel terá como fonte de energia, os biocombustíveis, hidrogênio e energia elétrica, mas a forma de uso será diferente e a energia elétrica virá de fontes nunca antes imaginadas e "não servirá apenas para acender lâmpadas".

Até os países do Oriente Médio estão reformulando suas matrizes energéticas pois estão antevendo o fim da dominância do petróleo.

Há verdade em tudo que foi previsto? Verdade propriamente não sabemos, pois não existe certeza sobre o futuro, mas existe boa probabilidade de que aconteçam. Se aprofundarmos sobre pesquisas e números de evolução do setor energético, entenderemos o futuro do setor energético.

A respeito do Brasil, haverá vários desafios para os próximos 20 anos. O exercício social terá de começar algum dia. Será difícil sair de nossa cultura de curto prazo, mas...

  • O Brasil deve continuar adotando políticas de estabilidade econômica e política introduzindo a visão de longo prazo, respeitando os princípios em que se apoiaram o Plano Real.
  • Temos de caminhar para uma maturidade política aprendendo com a operação Lava Jato e seus desdobramentos. Pensar o contrário é dar um tiro no pé e enquanto pensarmos ao contrário os caminhos da corrupção e ineficiência fiscal e tributária estarão sempre abertos.
  • Seguir a trilha da maturidade exige um Estado menor focado no seu papel essencial que não é de ser empresário.
  • Ciência e Tecnologia têm de começar a ser levado a sério. Precisamos investir nesse campo, assumir um protagonismo e livrar-se da eterna dependência tecnológica, indo além das conquistas no campo da agricultura e da extração de recursos naturais não renováveis.
  • O Brasil com todos os seus problemas estruturais será um pais visado para novos investimentos em agricultura e energias limpas e renováveis e para tal será necessário se estruturar, ser um país confiável a longo prazo, para receber essas novas fontes de financiamentos. Mas devemos ir além.
  • Seguindo a tendência mundial, as empresas de petróleo deverão se transformar em empresas de energia.
  • É necessário adequar nosso sistema educacional para atender a todas essas perspectivas de mudanças inclusive da Revolução 4.0 que vai mudar os alicerces da economia, com mudanças do perfil de empresas, do trabalho e dos costumes sociais. Vários empregos já estão sendo eliminados pela robotização ou virtualização de vários serviços relevantes (Fintechs, telemarketing, transportes de pequenas cargas, etc)
  • O processo de mudança na previdência vai nos fazer ver o futuro de outra forma e devemos nos preparar para geração de poupança adicional, pois os regimes públicos e privados não serão suficientes para manutenção do padrão de vida na 4ª idade.

    A empresa que pensar a longo prazo, observar as tendências, manter-se atualizada tecnologicamente e estiver pronta para se adequar às mudanças sociais, deve ser a empresa a investir no longo prazo.

Da mesma forma, gestores e analistas deverão mudar sua forma de analisar, recomendar e decidir sobre investimentos em valores mobiliários não mais apenas baseado na taxa de retorno de curto prazo, mas na capacidade de gerar retorno a longo prazo e na escolha de empresas que mostrarem maior grau de resiliência às crises. E nesse aspecto as informações não financeiras serão variáveis relevantes nos modelos de análise.

Mas todos os objetivos acima não poderão ser alcançados entendendo que o Meio Ambiente estará será sempre disponível para o suprimento de recursos naturais. Ao contrário ele será, cada vez mais, uma restrição à obtenção dos resultados empresariais, devendo ser compreendido de forma transversal.

Não existirá Plano B...

Eduardo Werneck
é vice presidente da Apimec Nacional.
eduardo.werneck@apimec.com.br


Continua...