Targeting

TARGETING: BUSCANDO NOVOS ACIONISTAS

Uma das tarefas que mais demanda atenção e tempo de um especialista em Relações com Investidores é a busca por novos acionistas. Trata-se de uma atividade incessante e necessária na geração de liquidez e criação de valor. Como se busca um investidor “alvo”, por assim dizer, tal atividade é conhecida pelo seu nome em inglês: Targeting.

Assim que o “targeting” é muito ciência, mas temos um componente de inspiração, faro e tino também. Isso por motivos distintos. Por exemplo, muitas vezes a companhia pode ter em seu seio investidores que seriam um pouco fora da curva esperada, ou investidores que a princípio não estariam interessados em determinado papel, passam a ter interesse em algo “novo”, por diferentes razões, muitas destas técnicas.

Numa enquete recente da IHS Markit, foram identificadas as quatro maiores preocupações de RIs nos EUA e na Europa, e obtivemos algumas respostas de como lidar com as mesmas. A primeira delas advém dos recursos finitos para o engajamento com a comunidade de investidores e seu entorno. Como o acesso deve ser priorizado, o exercício de targeting tornou-se a mola mestra dos atuais programas de RI. Um RI europeu entrevistado, afirmou que “temos gasto muito tempo com targeting. Nossa estratégia pressupõe um maior conhecimento em relação aos investidores com quem nos encontramos. Fazemos mais análises sobre atividades e engajamentos anteriores, e observamos atentamente nosso calendário e atividades em relação a nossa base acionária”.

Na parte prática e teórica temos dois tipos distintos de exercícios de targeting que podem ser observados. Um que se chama “peer” targeting, e o outro, “fundamental” targeting. Esse primeiro se refere a um exercício e atividade que corretoras e as próprias companhias costumam executar. A de buscar investidores familiarizados com o setor ou a região onde se encontra a companhia, e ver seus investimentos em pares (competidores) da mesma. Isso parece bastante intuitivo. Vemos a evidencia de duas formas. Ou o investidor tem ação de duas companhias no setor e na região, ou ele vende (ou vendeu) ações de um par para iniciar um investimento na companhia.

Mas esse tipo de abordagem tem algumas limitações. Podemos ter alguma seletividade por parte do investidor ao ter a ação da companhia e de pares ao mesmo tempo. Ou ao vender as ações de um par para comprar ações de sua companhia. Mas o modelo se esgota por aí. Por exemplo, se metade, ou mais, de investidores, não tiverem uma ação de um par, então fica impossível qualquer tratativa junto a estes para que se interessem por sua companhia.

Em um outro estudo recente ainda da IHS Markit, ficou confirmada essa percepção. Em 73% dos casos analisados, a base acionária de uma companhia era composta por investidores que não detinham ações em pares. Durante o período de observação do estudo, não foi encontrado um caso sequer onde o investidor vendia a ação de um par para comprar uma ação da companhia sendo observada. O grupo de investidores que possuía a ação da companhia, mais a de pares, não passou de 2% de 57% (um pouco mais da metade) dos que tinham ações de ambos, na amostra observada. Se tirarmos os grandes fundos passivos, que detém ações de tudo e todos, como Blackrock, Fidelity, e Vanguard dentre outros, esse número cai ainda mais.

O estudo foi feito com cerca de 50 gestores, no qual metade não tinha ação de um par, um pouco menos, 48%, tinha pelo menos um par no portfólio, e daí em diante os números eram decrescentes. Na minoria de portfólios onde encontramos pares, o investimento no grupo dos mesmos era menos de 2% do que a maioria dos mesmos (57%). Na mesma amostragem, apenas 11 dos 50 gestores (22%) detinha mais de um par.

Esses números, se pararmos para uma reflexão mais profunda, não surpreendem. Se pensarmos na nossa inclinação pessoal, obtemos uma resposta para o fenômeno. É muito provável, que caso algum amigo ou um corretor, te dê uma dica sobre uma ação, você vai comprá-la, mas não se preocupará em comprar um par da mesma. Em segundo lugar, caso você leia sobre um setor da economia que poderá se beneficiar de certas características macro do momento, você em geral entra no seu computador, vai ao homebroker, e compra apenas uma companhia, das quais você escolhe ser a mais preparada do setor. Ou a companhia certa para aquele momento, por diversos fatores. Quase nunca ocorre de a pessoa comprar dois competidores diretos em uma sentada. Isso ocorre também no plano institucional, como os dados nos mostram. O estudo mostra que os setores financeiros e de recursos naturais tinham um pouco mais de investimentos cruzados em pares. Somente um pouco. E isso porque talvez são setores onde há ainda mais concentração.

UMA ABORDAGEM ALTERNATIVA
Uma análise de targeting fundamentalista representa uma alternativa para entender melhor as decisões do investidor. Essa abordagem preocupa-se em identificar o gosto e preferência de investidores por diferentes níveis de crescimento, avaliação (valuation), aversão a risco, e rentabilidade, dentre outros fatores. Os gestores selecionam ações de forma consistente, ou seja, com características que estejam presentes nos fundamentos e que denotem sua estratégia de investimento. Agregar pares vai, de certa forma, contra o princípio básico de diversificação. Mas companhias de diferentes setores podem ter muitas características parecidas, em suas histórias como uma alternativa de investimento.

Na IHS Markit utilizamos uma qualificação, ou nota, de compatibilidade (suitability score) que vai de 0-100. Fizemos um teste com 50 companhias e 33 dentre estas tiveram uma nota de 96 ou mais. Ou seja uma análise fundamentalista, em targeting também, vai dar conta de 5% a 10% das instituições que cobrem a maioria dos investimentos.

Concluindo, podemos dizer que um targeting de pares parece muito intuitivo. Por que não falar sobre a Coca-Cola para um investidor da Pepsi-Cola? As corretoras e mesmo as companhias devem expandir sua busca e estratégia, como nos mostra a evidência. A tendenciosidade, no bom sentido, do sell-side muitas vezes é mais setorial. E as companhias podem ter melhores reuniões ao suprimir o desejo de competir diretamente com pares por capital. Não que isso não tenha relevância de todo. O que os dados parecem mostrar é que a maioria da racional utilizada para um investimento na companhia “A” não será bem explicado por um eventual investimento em seus pares. Portanto, a previsão sobre a evolução da base acionaria deve levar, e muito, em conta esse fator.


Fernando G. Carneiro
é diretor de vendas corporativas para a América Latina da IHS Markit.
fernando.carneiro@ihsmarkit.com


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