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“Mesmo que os homens possam ser alçados à condição de deuses ainda somos da idade da pedra”
Yuval Harari
Uma brevíssima visão histórica
A economia da forma do como foi concebida tem raízes na concepção de Francis Bacon, um influente filósofo inglês do século XVI/XVII, a época de ouro do princípio mecanicista que tinha Descartes e Newton como seus símbolos. Bacon considerou a natureza como algo diferente do homem e, portanto, este teria o direito de explorá-la. Esse pensamento foi uma contribuição importante para a concepção de cidades organizadas em torno do processo de industrialização que iria se forma 200 anos depois.
Em 1776, Adam Smith publicou a “A Riqueza das Nações”, propôs uma nova divisão do trabalho, baseado no princípio da especialização de tarefas, com objetivos de organizar o processo produtivo e elevar a produtividade do trabalho. Propôs ainda um sistema de preços que se baseava na “renda da terra, no salário do trabalho e nos proventos dos fundos”. Tecnologia e organização da produção deram as mãos para a 1ª Revolução Industrial.
David Ricardo desenvolveu a “Lei dos Rendimentos Decrescentes”: “à medida que as quantidades dos fatores de produção aumentavam, o retorno marginal renda iria cair a partir do uso de recursos menos eficientes”. Ele ressaltou particularmente a relevância desta questão no uso da terra, pois chegaria um momento em que as terras disponíveis seriam menos férteis.
Marx ressaltou a degradação do solo. Engels defendia, na mesma época, o uso dos dejetos humanos como forma de devolver os nutrientes retirados na produção de alimentos.
Adam Smith e Francis Bacon prevaleceram, mas David Ricardo, Marx e Engels chamaram atenção para questões ambientais como a degradação e desperdício dos recursos. Smith ao estabelecer os fundamentos para a formação do preço das mercadorias como base da ciência econômica, considerou apenas o custo do capital e do salário bem como a renda dos proprietários da Terra, excluindo os custos das externalidades. Francis Bacon, ao estabelecer o direito de exploração da natureza pelo Homem, não reconheceu o valor intrínseco da Natureza.
O sistema de preços definiu os parâmetros para a geração de renda sem a correta precificação dos recursos naturais seja pelo valor de uso e não uso e dos resíduos gerados. Assim se desenvolveu a ciência econômica e a forma como calculamos preços e retorno dos investimentos.
O conceito de eficiência produtiva de Smith no século XXI certamente levaria em consideração as ineficiências ambientais do processo produtivo em especial se ele sobrevivesse à epidemia de peste de Londres do século XIX que matou 40% da população da cidade.
A questão das externalidades sociais e ambientais foram assim transferidas para o ambiente econômico do século XX tentar resolver. Arthur Pigou começou o século propondo, em 1912, um “imposto sobre as externalidades econômicas” citando quase sempre a poluição como referência.
Nicholas Georgesu-Roegen deu um grande salto na compreensão do problema econômico com o livro “Lei da Entropia e o Processo Econômico, 1971” em que criticou com veemência os fundamentos da teoria econômica.
Apesar dos expressivos elogios de Paul Samuelson à obra, um problema foi criado: a teoria econômica teria de ser revista inteiramente, o que era considerado inadmissível pelos economistas americanos na época.
Georgescu foi intelectualmente exilado na Universidade de Vanderbilt, mas o sistema de formação de preços e o princípio do crescimento começaram a ser questionados, apesar de ainda prevalecentes. Questões como custo de reconstituição dos recursos naturais, limites do de carga do planeta, internalização de custos, redução de desperdício e reciclagem de materiais passaram a fazer pressão sobre a forma de pensar na economia.
Fica então a pergunta: como as externalidades estão serão consideradas na estrutura de preços relativos? Este é o grande debate para o século XXI.
Voltando ao século XXI
Vimos que a história, nos últimos 500 anos discutiu a questão econômica partindo da cultura filosófica do século XVI. As sementes plantadas na época formaram raízes sólidas que estão sendo replantadas em todos os segmentos. As discussões dos últimos 50 anos entre a ecologia e a economia ocorriam em um ambiente tenso tendo o sistema de formação de preços, crescimento econômico, equilíbrio ecológico e direitos humanos como elementos centrais da discussão.
Do ponto de vista macroeconômico, o Meio Ambiente não fazia parte, de fato, como Política Pública de Estado e por consequência integrante da Política Fiscal. Se assim estivesse, não haveria interferências de natureza política e ideológica. Seus fundamentos poderiam estar determinados como clausula pétrea da constituição. De acordo com especialistas, a legislação ambiental brasileira é bastante avançada, mas não é cumprida totalmente cumprida. Vejamos o exemplo da Lei 12.305 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos e é flagrantemente descumprida até pelo poder público.
A Lei 12334 que institui a Política Nacional de Segurança de Barragens de 2010 também é cumprida de forma precária, pois, vamos ser realistas, Meio Ambiente não é prioridade do ponto de vista de política pública. Vejam os episódios da Vale em Mariana, do derramamento de óleo pela Petrobras na Baía de Guanabara em 2000, do vazamento da barragem da mineradora Cataguazes em Miraí, em 2007, o vazamento da Chevron na Bacia de Campos em 2011, e mais um acidente da Petrobras em 2018 na Bacia de Campos (Brumadinho acabou de acontecer e estamos colhendo informações a respeito). O que mais vai ter de acontecer para que o Meio Ambiente faça parte como prioridade pública nos três poderes.
A atuação em biomas como o da Amazônia não pode estar sendo discutido baseado em direitos de exploração, mas em deveres de preservação. Definir direitos e deveres, comparando com o que outros países fizeram, é desconhecer o que é importante para a atividade econômica e equilíbrio do planeta sendo fundamental para a sobrevivência da agricultura brasileira.
O fato é que existem atualmente caminhos de considerável poder institucional como o Acordo do Clima de Paris, Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável participando de forma cada vez mais ativa na agenda de discussões e ações público-privado somando-se aos esforços do Pacto Global e do PRI-PSI. Os ODS permitem, através de seus indicadores para 2030, a interação progressiva de governos, setor privado e sociedades para a obtenção dos resultados, contemplando inclusive o Acordo do Clima e os compromissos voluntários de todos os signatários.
O futuro é incerto, mas acima de tudo será de maior complexidade com a evolução demográfica significando 10 bilhões de habitantes em 2060 com uma proporção de pessoas idosas proporcionalmente crescentes. O Brasil terá um padrão de primeiro mundo. Por essa razão a reforma da previdência não é mais uma questão de “se” mas de “quem” terá de participar do sacrifício e em que proporção.
A Previdência está atrasando a solução dos problemas de vários setores destacando-se, em termos de políticas públicas, saúde, saneamento e educação, além de dificultar a modernização da atividade econômica. Está tudo travado. Reduzir as desigualdades de nossa seguridade social é urgente.
O maior desafio, entretanto, será compatibilizar o conceito de crescimento econômico inclusivo e trabalho decente com a ascensão da indústria 4.0. Vivemos à sombra de uma disrupção tecnológica que sempre nos força a perguntar: que tipo de geração de emprego teremos? é possível para todos? A educação terá condições de antecipar o futuro e suas necessidades nessa corrida tecnológica. Do lado do uso sustentável dos recursos, como vamos lidar com a pressão crescente sobre o uso dos recursos minerais em especial os metais nobres e terras raras, cuja extração gera impactos ambientais expressivos.
Existem, portanto, grandes questões nacionais e globais, todos interconexos. Não há mais condição de explicarmos tudo baseado nos direitos de exploração ambiental.
Muitas empresas estão assumindo novas posturas com relação às externalidades, definindo novos modelos de investimentos com novos conceitos de produção, sempre em evolução, com a gestão de riscos, em todos os níveis assumindo um papel central.
Assistimos ao World Economic Forum abraçando o discurso da sustentabilidade. Para quem viveu a cultura do FMI nos anos 70/80, ouvir a Diretora-Geral Christine Lagarde falando em crescimento inclusivo e mudanças climáticas mostra uma evolução considerável na integração das questões ambientais e sociais ao pensamento econômico contemporâneo.
Os recém agraciados William Nordhaus e Paul Romer, com o Prêmio Nobel de Economia de 2018, pelos seus estudos sobre Mudanças Climáticas e seus efeitos sobre a atividade econômica mostram o envolvimento da academia. Nordhaus vem estudando o tema desde os anos 70, chegando a criar a expressão “o ser humano está jogando dados com a natureza”. Escreveu ainda junto com James Tobin, “Is Growth Obsolete?”, em que escreveu sobre “Uma Medida de Bem-Estar Econômico.
As grandes questões econômicas para o futuro incluem a conciliação dos limites de carga do planeta com o crescimento econômico e como torna-lo inclusivo em um contexto de substituição, em larga escala, do emprego por robôs e novos perfis de emprego que desconhecemos, com o avanço da Industria 4.0.
São questões que impactam a rentabilidade das empresas, o retorno dos investimentos e o risco dos negócios. O caminho é esse. Participar intensamente de todos os fóruns de discussão trazendo tanto quanto possível os resultados para o mercado de capitais.
No Brasil, o Laboratório de Inovação Financeira da CVM, com apoio do BID e ABDE é um fórum importante para o debate sobre o meio ambiente para o crescimento sustentável e o debate sobre mecanismos de financiamento para investimentos “verdes”. Mas existem muitos outros bons fóruns.
Eduardo Werneck
é vice presidente da Apimec Nacional.
eduardo.werneck@apimec.com.br