Em Pauta

O IMPACTO DA TRANSFORMAÇÃO DIGITAL NAS EMPRESAS

Decifra-me ou te devoro.
O mesmo Dilema da Esfinge é o que as empresas em todo mundo enfrentam hoje quando o assunto é Transformação Digital. Além de precisarem encarar o processo que vai muito além da adoção de novas tecnologias, passando por mudanças profundas de processos e cultura, há o medo do erro e a necessidade de apresentar resultados de curto prazo.

A Transformação Digital é muito mais “transformação” do que “digital”. Na verdade, envolve a integração da tecnologia digital a todos os aspectos da empresa. Para isso, é preciso ter uma mente aberta para o novo, procurar ser ágil e atender melhor o cliente. “É uma nova forma de agir. A tecnologia vem como se fosse uma bússola para dizer onde você quer ir. Os dados e as plataformas mostram um caminho, mas sem atitude digital, ágil e transformadora, a empresa vai continuar trabalhando como trabalhava. É preciso trabalhar em prol da jornada do consumidor, independente da área em que você está na empresa”, define Norberto Tomasini, sócio da PwC.

Com a explosão no desenvolvimento tecnológico e digital houve uma aceleração significativa na mudança de mercados, criando um mundo muito mais complexo e ambíguo para as companhias atuarem. “Esse contexto tem exigido uma capacidade cada vez maior de adaptação e resiliência por parte das empresas, que só é possível através do desenvolvimento de habilidades essenciais de inovação”, observa, Marcelo Nicolau, líder da Play Consultoria, que busca dar suporte a empresas para concretização de iniciativas de inovação de forma prática e tirar projetos do papel.

A Gartner Inc., líder mundial em pesquisa e aconselhamento sobre tecnologia, destaca que as mudanças já são sentidas pelas empresas brasileiras. Levantamento realizado ao final de 2018, mostra que 30% dos empresários brasileiros afirmaram ter aumentado a atenção para tecnologias digitais, número 12% maior ante o ano anterior. Dos brasileiros que responderam à pesquisa, 46% acreditam que o modelo de negócios de suas empresas já foi modificado ou se encontra em processo de mudança.

Mas, para os especialistas em Transformação Digital, de boas intenções o inferno está cheio e a Transformação Digital é questão de vida ou morte. “Ainda vemos que há muito chão pela frente. A transformação não é somente a digitalização é a mudança inteira na maneira de pensar da organização. É olhar como a empresa interage com seus stakeholders e atrai tecnologia. Por muito tempo, as empresas mantiveram o mesmo modo de trabalhar e agora precisam encarar esta nova onda baseada em tecnologia”, ressalta Manoel Lemos, sócio da Redpoint Eventures.

Na camada de negócios, os CEOs do Brasil estão razoavelmente alinhados com suas contrapartes globais em relação às prioridades de negócios e aos avanços. “Isso indica uma direção sólida para a transformação digital e a mudança do modelo de negócios”, diz Ivar Berntz, analista sênior da Gartner, ao citar a pesquisa “2019 CEO Survey: Brazil CEOs Need Guidance in Their Digital Initiatives - CIOs, Take Action!”.

Ele complementa, entretanto, que na camada de execução, as respostas dos CEOs do Brasil à facilitadores de negócios e iniciativas de otimização de operações são inconsistentes com suas perspectivas de negócios e com suas contrapartes globais. Isso indica que o modelo operacional subjacente não suportará adequadamente essas novas iniciativas de negócios. “Os CEOs do Brasil não identificam consistentemente informações e tecnologia como facilitadores-chave para iniciativas comerciais e operacionais.

É fato que o comportamento da economia brasileira, nos últimos anos, não ajudou que investimentos efetivos fossem feitos nesta área. Mesmo assim, avanços ocorreram. “Apesar de um ambiente difícil, o Brasil está avançando na Transformação Digital. Quando perguntados se tinham uma iniciativa de gestão ou programa de transformação para tornar os negócios mais digitais, 81% dos CEOs deram uma resposta afirmativa (acima dos 52% do ano passado), comparável aos 82% globais deste ano (acima dos 62% do ano passado)”, detalha Berntz.

Com os últimos anos marcados pela recessão econômica ou baixo crescimento, os investimentos em digitalização no Brasil foram voltados para a busca de aumento da eficácia e eficiência dos negócios, mas não para o cerne da Transformação Digital. Como resultado, Tomasini destaca que a Transformação Digital brasileira está de 3 a 4 anos atrás em comparação com a Europa e EUA.

“Hoje a nossa maturidade para Transformação Digital é um pouco menor que nesses países. As empresas usaram a Transformação Digital ou as tecnologias digitais visando melhoria de performance e eficácia para redução de custos e se defender da crise. O movimento é um pouco diferente do que você vê lá fora que são as empresas indo entender melhor o cliente utilizando big data ou analytics para aumentar as vendas”, diz.

Para Tomasini, será somente em 2021 que as empresas vão acelerar sua Transformação Digital buscando melhorar o atendimento ao cliente “A demora do movimento pode prejudicar a competitividade das empresas brasileiras no mercado externo”, afirma.

Além da conjuntura econômica, outro fator que impacta na decisão das empresas a adotarem a nova forma de pensar é o medo de errar. Segundo uma pesquisa da McKinsey, as estratégias de Transformação Digital dão errado em aproximadamente 70% das empresas isso ocorre, principalmente, pela falta de um planejamento eficiente que priorize aspectos que vão muito além dos processos simplesmente, mas que englobam uma forte mudança cultural, tanto do coletivo quanto do individual, escolhas corretas quanto a perfis de profissionais, conhecimento técnico, análises de consumidores e concorrentes, e parceiros de negócios que detenham um conhecimento profundo do segmento.

“Muitas empresas ainda apresentam grandes dificuldades em desenvolver habilidades e concretizar iniciativas de inovação. Algumas dessas barreiras derivam de um apego ainda muito grande ao negócio atual, como o foco exclusivo em resultados de curto prazo, na otimização de processos e estruturas já existentes, e manutenção de uma cultura de aversão ao risco. Outras barreiras derivam mais da ausência de algumas competências ou recursos, como habilidades específicas para desenvolvimento de novos projetos ou falta de recursos humanos específicos para essa função”, diz Nicolau.

A falta de mão de obra qualificada para fazer a Transformação Digital é um dos grandes impasses. “As empresas precisam investir em preparar colaboradores. Além disso, há a dificuldade grande de reter talentos. Sem as pessoas certas não é possível fazer, mesmo que a empresa tenha a melhor tecnologia”, detalha Tomasini.

Primeiros passos
Não há receita de bolo sobre como se tornar uma empresa digital de sucesso, mas algumas pistas são dadas em relação aos primeiros passos. “Difícil dizer. Cada organização tem a sua própria jornada e nem uma ou outra estão certas. Podem estar certas em diferentes vieses”, lembra o líder de Transformação Digital da KPMG no Brasil, Oliver Cunningham.

Alguns conselhos dos especialistas, entretanto, são assertivos. Primeiramente, é preciso começar o mais rápido possível através de uma auto-análise e, segundo, torna-se necessário limitar o tamanho dos erros porque a jornada da transformação também é feita deles.

Como não poderia ser diferente, o empresário, deve primeiramente, entender onde está pisando, ou seja, observar como o seu negócio será impactado pela digitalização da economia. Neste sentido, algumas perguntas são válidas. O que significa escalabilidade para uma indústria de ar condicionado ou qualquer outra? O que significa monetização de conhecimento?

Há uma série de características do mundo digital que não estão claras para a realidade do empresário. “É verificar o que você faz e as tecnologias que estão disponíveis e que podem modificar o seu negócio. É preciso fazer um trabalho interno que modifique a forma de pensar. Uma coisa que tem que se colocar na cabeça é de que tudo pode ser automatizado. Como qualquer arma, a eficácia da tecnologia é determinada pela mão que a utiliza. Esse é o grande ponto”, destaca Fernando Flauto, da Crowe Auditoria e Consultoria.

Cunningham concorda. “A maior falha que tenho visto é do lado cultural da transformação. A gente está vendo muita facilidade em investir naquilo que é óbvio, tangível, e não necessariamente fazendo o preparo dos modelos mentais associados. É preciso ir além do óbvio”, ressalta.

Ao definir que rumo tomar, a empresa passa a ver quais as ações que deve lançar mão para atingir o seu objetivo. “Há muita gente pensando no como, o que também é válido. Mas não pode faltar direção e rigidez no controle do processo”, observa Flauto.

Para Cunningham, a primeira fase pode não ser a resposta sobre como se vai chegar lá, mas simplesmente o que a empresa deseja ser. “A Transformação Digital é um caminho. Não é igual a um projeto em que se coloca metas no tempo, em dois ou três meses. Pelo contrário, é um processo de inovação intensiva, constante e de alto impacto”, complementa.

O início da Transformação Digital passa pelo entendimento do seu público-alvo e de suas necessidades. “O primeiro passo para uma empresa é conhecer a jornada do seu consumidor. É preciso entender quais são as interações que o cliente tem com ela e quais são os pontos de atrito”, diz Tomasini, da PwC. Conhecer o cliente envolve adotar uma base de dados eficiente e é um movimento caracterizado por ondas.

Muitas empresas que buscam adotar a Inteligência Artificial para a análise de seus dados, por exemplo, ainda não têm sistemas digitalizados ou transformados digitalmente. “Normalmente a Transformação Digital passa por três grandes ondas. A primeira é a digitalização da operação que significa sair do mundo analógico, do offline para o online. Aqui quando falamos para ir para o mundo online falamos da mesma experiência do consumidor que ele tem no mundo offline para o mundo digital”, explica o diretor da Neurotech, Rodrigo Cunha. Sair do analógico para o digital requer um armazenamento apropriado dos dados para que se possa, no futuro, usar a Inteligência Artificial de forma adequada e aprimorar a experiência do cliente em todo seu ciclo de relacionamento com a empresa.

A segunda onda, denominada de business inteligence, consiste em, a partir dos dados armazenados, contar com um analista que proverá os primeiros relatórios gerenciais a partir do cruzamento das informações. “Isso pode até ser feito manualmente com o objetivo de encontrar padrões. Se começa a amadurecer a operação a partir do momento em que se faz esse cruzamento de variáveis e informações”, explica Cunha.

A terceira onda é marcada por uma grande quantidade de variáveis para analisar. É nesta fase que entra Inteligência Artificial. A máquina trabalha em cima dos dados e gera insights para o ser humano. “Há uma série de técnicas de IA aplicadas em cima dos dados para que a partir desse cruzamento de infinitas possibilidades voltem insights para os seres humanos. Então ele vai descobrir que a combinação de 60 variáveis irá fazer com que ele venda três vezes mais. Assim, a ordem inverteu e você acaba otimizando esses insights”, diz Cunha.

Para Tomasini é preciso acrescentar valor na jornada do cliente para garantir que ele vá ser bem atendido em toda sua experiência com a organização. “É mais do que algo somente operacional. Muitas vezes, a pessoa é atendida por diversas áreas da empresa e grande parte das organizações é formada por departamentos. Há o silo de marketing, o da operação comercial, o financeiro... O cliente navega em vários. Você pode fazer uma jornada comercial espetacular, porém pode cair numa área financeira que não está nem um pouco preocupada com a experiência dele e detona tudo”, diz.

Portanto, a empresa que quiser entender o cliente não deve focar somente na área que tem mais contato com ele. “O que acontece muitas vezes é que a gente faz essa parte de experiência do usuário e uso de dados, porém somente na área de marketing e comercial. Isso é internalizado pela empresa que precisa adotar modelos de atendimento que não são mais hierárquicos, mas que trabalham de forma coordenada para atender a jornada”, explica.

Uma transformação assim pode demorar de 5 a 8 anos e, apesar de não ser linear, pode significar a diferença entre a vida e a morte, mesmo que esta não venha imediatamente. “O que aconteceu com os taxistas no Brasil e agora o que acontece com o Uber quando você coloca patinetes elétricos? O Uber está perdendo as corridas de baixo distância, com a disrupção dos patinetes Tanto que comprou uma startup em São Francisco que já tinha roubado 25% do mercado dele. Não importa se você é uma empresa tradicional ou da nova economia, a jornada do consumidor tem que estar na agenda. Não é mais o peixe grande que come o peixe pequeno é o peixe rápido que come o peixe lento”, ressalta Tomasini.

Para ser o peixe ágil, é preciso que a empresa quebre as estruturas internas e monte uma cultura de agilidade com foco no cliente. “Esse é o final da jornada digital. Criar produtos e serviços é só o primeiro passo da jornada. Os outros consistem em entender toda a jornada do consumidor em todas as áreas da empresa e elas se voltarem para isso. Poucas empresas estão preparadas para isso”, alerta o executivo da PwC.

O papel do RI
A bolsa induz os investidores a olharem para os resultados trimestrais, quando acontecem as teleconferências com os RIs e gestores. “Isso leva os investidores a terem uma visão de curto prazo e a Transformação Digital não é algo que ocorra logo. Uma empresa de capital aberto é gerenciada para ter resultados no curto no médio e no longo, mas a transformação é algo que vai muito além da automação e da ansiedade do acionista”, diz Cunningham.

O maior problema é que o risco de não fazer nada na era da Transformação Digital é maior de todos e mesmo quem busca inovar e transformar não tem garantia de que vá acertar. “Pelo contrário, a garantia é de que você vai errar. Isso traz uma questão de quão bem uma companhia de capital aberto pode aprender a errar, visto que ela tem parâmetros de performance muito curtos e as métricas que os investidores estão costumados a ver, muitas vezes, na transformação digital, podem não capturar o sucesso da transformação”, explica Cunningham.

Pode ser que numa primeira curva a empresa se depare com certa perda de receita, mesmo que esteja se preparando para vir muito mais forte num segundo momento. “Há o caso clássico da Adobe, que deixou a vender CD para vender assinatura. Eles passaram meses explicando que haveria perda de receita momentânea, mas retomada num segundo momento. Mesmo assim, a companhia teve perda num primeiro momento e depois retomou seu valor de mercado”, observa.

Ao mesmo tempo, hoje em dia, muitos investidores têm olhado para o outro lado, com a preocupação com sustentabilidade dos negócios no longo prazo. “Se você não é capaz de fazer um projeto de Transformação Digital e anunciar, também será penalizado de qualquer forma. Porque os investidores estão esperando que você se adapte ao novo momento. O problema é que uma empresa não digital se transformar em uma empresa digital é uma “dor de barriga” imensa e raramente simples e tranquila”, diz Cunningham.

Ao trazer transparência aos investidores para comunicar como será o processo de Transformação Digital, o que a empresa já tem feito e quais são os próximos passos, o profissional de RI consegue minimizar as incertezas quanto ao desempenho futuro da organização. A questão é como conciliar as expectativas dos investidores com os resultados de curto prazo com a necessidade de investir em iniciativas que gerarão ganhos no médio-longo prazo e garantirão a sustentabilidade dos negócios.

“Empresas de capital aberto muitas vezes têm investidores com pouca paciência para a obtenção de resultados financeiros. Isto contrasta com os investimentos tidos como especulativos em empresas que não parecem focar-se em lucros e sim em crescimento, como a Amazon. Ademais, a grande maioria dos indicadores financeiros é do tipo ‘lagging’, focados em posições finais, como que olhando no retrovisor, em vez de ‘leading’, focados em medir eventos ou atividades que precedem resultados financeiros e com os quais tem relação causal, por exemplo, em captura de mercado”, diz Berntz da Gartner. Em sua visão, o profissional de RI pode desempenhar um papel importante na educação dos investidores sobre o período de maturação de investimentos digitais e os progressos obtidos até o momento.

Para Cunningham, a transformação digital oferece uma oportunidade do profissional de RI influenciar também as atividades de dentro da companhia. “Há uma questão que chamamos “teatro da inovação”. Existem empresas que fazem todo o movimento de inovação. mas não permitem que o core do negócio seja reposicionado. O RI se torna um termômetro. Se ele enxergar que a inovação não esteja sendo feita de forma aprofundada, ou seja, se há o “teatro da inovação” que gera somente a percepção da inovação sem provocar impacto real no tempo, isso vai penalizar a empresa”, alerta. Neste caso, o mercado vai multiplicar por dois sua desconfiança da organização. “O profissional que deve ir além do óbvio, pois existe uma percepção rasa de Transformação Digital que, na verdade, não vai muito além do que a gente chama de automação, que é o que fazemos há anos. O profissional de RI deve ser capaz comunicar tanto para dentro, qual é a perspectiva do mercado, quanto para fora os movimentos realizados”, afirma.

Tecnologia domina IPO`s
As ofertas públicas iniciais de ações (IPOs) em todo o mundo, desde 2011, têm sido fortemente influenciadas pelo surgimento de empresas da "nova economia". Os setores de tecnologia e finanças dominaram a atividade de listagem nas principais bolsas entre 2016-18, segundo a pesquisa Capital Markets 2030, publicada pela PwC. Dentre os destaques estão o IPO do Softbank, que levantou US$ 21,3 bilhões na Bolsa de Valores de Tóquio em dezembro de 2018, o IPO de US$ 5,2 bilhões da Siemens Healthineers e os US$ 4,4 bilhões captados pela Knorr-Bremse na Deutsche Börse.

Para 2030, a PwC antecipa que a tecnologia permanecerá o setor mais importante nas ofertas públicas. Segundo a pesquisa, historicamente, o mercado dos EUA tem sido o ambiente mais atraente para empresas de tecnologia, com melhores avaliações e uma base de investidores mais informada, atraindo parte dos IPOs de tecnologia chinesa, incluindo o IPO de US$ 25 bilhões recorde do Alibaba em 2014. No entanto, o aumento dos esforços para conquistar tais empresas continuarão a intensificar a concorrência entre Nova York e China.

A China inaugurou, ao final de julho deste ano, a bolsa “Star Market”, com foco em ciência e tecnologia. Ao todo participam 25 empresas e, no primeiro dia de negociações, algumas ações dispararam mais de 500%. "O importante papel da nova bolsa é fornecer um canal de captação de recursos para a inovação científica e tecnológica da China", declarou à imprensa local o economista Lu Zhengwei, do Industrial Bank, em Xangai.

“Os IPOs de maior valor continuam sendo de empresas de tecnologia. A relevância da tecnologia no mercado de capitais é bastante grande. O setor financeiro está vinculado com o novo mundo digital e o modo como as instituições operam está sendo revolucionado pela fintechs”, resume Kieran McManus, sócio da PWC.

Governança Corporativa versus Transformação
A governança corporativa e a Transformação Digital são independentes, mas uma pode ser usada em benefício da outra. “O que é uma boa governança corporativa? É quando a empresa é transparente, presta contas, é responsável por suas ações e atitudes junto a todos os seus stakeholders, se comunicando constantemente com eles, tratando a todos com equidade”, define Valéria Café, diretora de Vocalização e Influência do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

O principal agente de governança é o Conselho de Administração, visto tradicionalmente como o órgão que monitora, acompanha e vê se a organização está no caminho certo. Na conjuntura atual, o Conselho não perde este papel, mas também precisa ter a função de pensar constantemente e ser um consultor efetivo para a organização. “Para isso é preciso estimular a conversa com os gestores sobre a questão da Transformação Digital. Não estamos falando apenas de usar a ferramenta, ela é somente um meio. O conselho tem que entender quem é seu cliente e quais são as dores deste consumidor. Como eu posso melhorar o meu processo e que produtos eu posso entregar para ele a partir do meu propósito e dos meus objetivos. Como ajudar o consumidor neste processo?”, complementa Valéria.

A maioria dos conselheiros já tem consciência de que as tecnologias disruptivas vão impactar as companhias nas quais têm assento, como demonstra a pesquisa Global Director Survey Report, publicada pelo Global Network of Director Institutes junto com o IBGC. Entretanto, diversas perguntas ficam em aberto: Como os conselheiros tomam decisão? Eles utilizam Big Data ou IA para isso? Como ele implementa isso, com quais ferramentas? Como funciona o ecossistema da empresa em que ele atua? Quais são as startups que estão surgindo? Como o conselheiro participa de tudo isso e como pode se relacionar com estas startups ou até fazer aquisição. Como o Conselho ajuda a gestão para que o corpo diretivo da empresa valorize ideias inovadoras? Como embutir uma cultura de inovação dentro da empresa?

Todos estes fatores fazem parte de um debate estratégico que precisa entrar na agenda do Conselho. “O papel do Conselho e do corpo diretivo da empresa é como incluir a inovação dentro deste debate. É isso que precisa acontecer”, destaca Valéria Café. Para cumprir este papel é preciso que o Conselho seja composto por pessoas diversificadas e que tenham a visão de olhar da Transformação Digital. “O Conselho não pode ter apenas o financeiro. Tem que ter, por exemplo, a pessoa de tecnologia, com o olhar do consumidor. Quanto mais diverso for o Conselho, melhores serão os resultados que ele terá. Tem que ter várias idades e uma diversidade para conseguir construir e pensar de forma inovadora”, diz. No entanto, a realidade ainda está longe disso.

Outro papel importante do Conselho de Administração dentro da Transformação Digital é enxergar a questão da gestão de risco. “É preciso ter um equilíbrio entre garantir resultados de curto prazo, porque é uma empresa listada e precisa sobreviver, e ao mesmo tempo ter esse olhar de longo prazo e pensar diferente”, afirma a executiva. Além disso, é preciso garantir que essa cultura de inovação não fique somente acima, mas que permeie toda a organização e que sejam valorizadas as novas ideias. “É preciso quebrar as hierarquias porque se você quer o jovem e o novo é preciso fazer a disruptura até em termos de olhar”, resume Valéria.

A executiva destaca ainda que novos indicadores de desempenho que abranjam as novas ideias precisam ser construídos. “Os indicadores de desempenho atuais estão muito ligados ao curto prazo e, às vezes, inovar também é falhar. É errar para também aprender em cima do erro. Os investidores, principalmente os institucionais, vêm pedindo para as empresas mais diversidade e um olhar mais sustentável e inovador. A resposta é: diálogo! As empresas precisam melhorar o diálogo com os investidores. Eles ficam pedindo isso”, observa. 


Continua...