Títulos Verdes para Fomentar o Agronegócio Sustentável
O agronegócio é um dos principais motores econômicos do Brasil, representando 21,6% do Produto Interno Bruto (PIB) e sendo responsável pela geração de um em cada três empregos no país. No cenário internacional, o agronegócio faz do Brasil o celeiro do mundo, na qualidade de maior exportador líquido de alimentos.
O incontestável protagonismo econômico do agronegócio brasileiro, entretanto, deve ser ponderado com o elevado nível de emissões de gases de efeitos estufa (GEEs) das atividades que o compõem.
Aliado a isso, é crescente a demanda de consumidores agrícolas por produtos alinhados a padrões internacionais de sustentabilidade, conservação ambiental e metas climáticas, o que deverá influenciar de modo relevante a forma como as atividades agropastoris são conduzidas no país.
Em um cenário de restrição, ou mesmo impossibilidade, da alocação de recursos públicos e muitos questionamentos acerca da utilização de subsídios fiscais, o aumento da participação do setor privado no financiamento do setor é fundamental para permitir a diversificação de políticas agropecuárias, estimular a competição na concessão de crédito e assegurar o aporte de recursos de uma maior e mais heterogênea gama de investidores para o desenvolvimento sustentável do agronegócio.
Nessa ótica, o crescimento do mercado brasileiro de títulos “verdes” tende a ser um eficaz instrumento para alavancar essa modernização, tendo em vista que são títulos de dívida destinados a projetos benéficos ao meio ambiente e que possibilitariam aproximar agropecuaristas da crescente demanda de investidores de impacto.
A diversidade de instrumentos financeiros disponíveis no mercado brasileiro que são suscetíveis a serem enquadrados como títulos “verdes” possibilita que todo integrante da cadeia produtiva, a despeito do seu tamanho, seja um captador de recursos em potencial. Isto ocorre, pois os títulos mais rotineiros no financiamento do agronegócio, tais como debêntures, notas promissórias, Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) podem ser estruturados como títulos “verdes”.
Ainda assim, apesar da pluralidade de enquadramentos jurídicos disponíveis, o número de emissões “verdes” destinadas ao agronegócio ainda é muito pequeno. No mercado doméstico, a única emissão de títulos “verdes” foi realizada pela Ecoagro, por meio de CRAs lastreados em recebíveis da Suzano Papel e Celulose, no valor de R$ 1 bilhão. Já no mercado internacional ocorreram outras oito emissões de títulos “verdes” por meio de green bonds: BRF (1 emissão no valor de € 500 milhões), Suzano Papel e Celulose (3 emissões no valor global de US$ 900 milhões), Fibria (1 emissão no valor de US$ 700 milhões) e Klabin (3 emissões no valor global de US$ 1,2 bilhão).
Esse cenário, combinado com o apetite cada vez maior por investimentos alinhados a critérios ASG, por investidores internacionais e locais, além das condições ambientais regulatórias do setor estabelecidas pelo código florestal, sinalizam que ainda há uma grande lacuna a ser preenchida por títulos “verdes” emitidos por companhias do agronegócio brasileiro.
Por tal razão, é fundamental que haja a conscientização de agropecuaristas e investidores sobre os benefícios sobre emissões “verdes” no agronegócio, mais especificamente sobre o CRA “verde”, em decorrência do seu potencial de crescimento no mercado brasileiro.
Diante desse contexto, o Laboratório de Inovação Financeira (LAB), em parceria com o Mattos Filho, elaborou a cartilha “Desmistificando os Títulos “Verdes”: CRA “Verde” com o objetivo de disseminar o conhecimento sobre emissões “verdes” no agronegócio, mais especificamente sobre o CRA, em decorrência do seu potencial de crescimento no mercado brasileiro.
A cartilha, cujos termos se encontram sumarizados abaixo, será compartilhada com agropecuaristas e possíveis emissores de CRA “verde”, visando aumentar o nível das emissões desses títulos, pode ser acessada na íntegra através do sítio eletrônico do LAB (www.labinovacaofinanceira.com).
Desmistificando os Títulos Verdes: CRA “Verde”
O que é um CRA? Os Certificados de Recebíveis do Agronegócio ou “CRA” é um título de renda fixa, com incentivo fiscal por meio da isenção de imposto de renda para o investidor pessoa física, lastreado em recebíveis originados de negócios entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, cujo objetivo é servir de fonte de financiamento complementar ao agronegócio.
Por meio da emissão de CRA, os produtores conseguem obter uma antecipação do fluxo de caixa de seus recebíveis, cujo preço é descontado em relação ao valor nominal, a partir de uma taxa de desconto que reflete o risco da operação.
O que é um CRA “verde”?
O CRA “verde” faz parte do conceito de “títulos verdes”, que são títulos de dívida com as mesmas características de um título de dívida comum, com a única particularidade de que os recursos captados pela emissão devem ser destinados, exclusivamente, ao financiamento de projetos e empreendimentos que gerem benefícios de mitigação e resiliência às mudanças climáticas ou impactos ambientais positivos.
O CRA “verde”, portanto, distingue-se de um CRA ordinário em função da destinação de recursos, que necessariamente deverá ser alocada para uma atividade que seja alinhada com padrões de sustentabilidade ambiental.
Quais são os benefícios de um CRA “verde”?
Como caracterizar um CRA como “verde”?
Há diferentes formas de caracterizar um título como “verde”, como, por exemplo, por meio de autodeclaração, opinião externa, verificação, certificação, rating, entre outros. A decisão de qual parâmetro utilizar fica a critério do emissor, em vista do público e mercado alvos da emissão. Algumas das formas mais comuns são a opinião externa, também chamado de “parecer independente de segunda opinião” (second opinion party), e a certificação.
O que pode ser financiado pelo CRA “verde”?
A diferença primordial entre, por exemplo, um CRA ordinário e um CRA “verde” é que a destinação dos recursos deste último deve possuir atributos positivos do ponto de vista socioambiental. Portanto, toda atividade do agronegócio que gere benefícios ambientais pode ser financiada por CRA “verde”.
Dentre os exemplos de atividades elegíveis, há aquelas relacionadas a agricultura de baixo carbono; biofertilizantes; inovações tecnológicas no manejo de pastagens; compostagem para tratamento de resíduos agropecuários; pulverização localizada; plantio de florestas, entre outras.
Conclusão
De modo cada vez mais intenso e perceptível, sustentabilidade e mitigação de impactos ambientais e climáticos serão pautas consideradas por consumidores de produtos agrícolas, países importadores e instituições financeiras no momento de negociação e contratação com empresas e agropecuaristas do agronegócio brasileiro.
Nesse contexto, empresas desalinhadas com padrões de sustentabilidade e com a legislação socioambiental poderão ser negativamente percebidas pelos seus stakeholders e assim perder competitividade no mercado.
O investimento na modernização do agronegócio com o objetivo de aumentar a eficiência produtiva e reduzir as emissões de GEEs é fundamental para preservar a confiança e qualidade dos produtos agrícolas brasileiros, devendo ser considerado por agropecuaristas como uma estratégia corporativa de captura de oportunidade e de crescimento econômico.
Dentro do rol de medidas possíveis, a utilização do CRA “verde” é uma das medidas mais acessíveis ao empreendedor do agronegócio em direção a esses objetivos, tendo em vista que operações de crédito são práticas rotineiras dentro do mundo corporativo.
Laboratório de Inovação Financeira (LAB)
Este artigo foi preparado pelo Laboratório de Inovação Financeira (LAB), sob a coordenação do Mattos Filho Advogados, tendo por objetivo informar os destinatários sobre temas relacionados ao mercado de títulos verdes e finanças sustentáveis, desenvolvidos ou em desenvolvimento no âmbito dos diversos Grupos de Trabalho do LAB, como reprodução sintética dos debates levados a cabo entre membros, parceiros, consultores e colaboradores do LAB e não revelam, necessariamente, a opinião institucional dos órgãos ou pessoas jurídicas a que pertençam ou representem, tampouco refletem o julgamento ou opinião do conjunto de entidades diretivas do LAB ou de seus membros, parceiros, consultores e colaboradores individualmente. O LAB, seus membros, parceiros, consultores e colaboradores não oferecem consultoria ou recomendação com relação a qualquer produto financeiro ou de garantia, mecanismo de investimento, empresa ou título. Portanto, este documento não pretende ser a única base para qualquer avaliação da viabilidade de produtos ou iniciativas eventualmente mencionados no artigo, não constituindo, ademais, uma proposta ou recomendação de investimento, ou de participação em qualquer estratégia de negociação, nem confirmação, oficial ou não, dos respectivos termos (Laboratório de Inovação Financeira: Brasil, 2020).
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