Comunicação | Educação Financeira | Em Pauta | Enfoque |
Espaço Apimec | Fórum Abrasca | Governança Corporativa | IBGC Comunica |
IBRI Notícias | Opinião | Orquestra Societária | Ponto de Vista |
Sustentabilidade |
Existem hoje algumas importantes ameaças rondando a governança corporativa no Brasil. E esses riscos surgem sob diversos formatos: de aberturas de capital levadas adiante como fins em si mesmas e de um já famoso ESG (sigla em inglês para fatores: ambientais, sociais e de governança), só para ficar em dois exemplos. O que, em tese, seria benéfico para o mercado de capitais pode afastar as companhias das práticas da verdadeira governança, aquela fundamentada na cultura corporativa.
Essa dinâmica pouco produtiva está refletida em alguns modismos que parecem ter tomado conta dos ambientes corporativo e de investimentos no Brasil nos últimos anos. Esses pontos, por sinal, sustentam uma análise bastante pertinente feita por Mauro Rodrigues da Cunha, que recentemente compartilhou suas percepções na live MESA AO VIVO. Profissional com ampla experiência nos assentos de conselhos de grandes empresas e em entidades do mercado, com destaque para um longo período na presidência da Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), ele coloca entre esses modismos o ESG, a diversidade, o compliance, a independência dos conselheiros de administração, a autorregulação e os IPOs. Mas aqui cabe uma ressalva: as críticas são direcionadas aos processos de implantação e não aos conceitos em si — eles continuam essenciais para o desenvolvimento do mercado de capitais.
Começando pela onipresente sigla ESG. Nesse recorte feito por Rodrigues da Cunha, é temerário que o conceito seja adotado pelas empresas de maneira superficial, como uma forma de simplesmente oferecerem uma resposta às demandas que vêm de todos os lados — dos investidores, da imprensa, das agências de rating, dos bancos. Bem ao contrário disso, as companhias deveriam antes se questionar sobre o que é ou não viável e favorável tendo em vista sua situação particular. Esse exercício pode mostrar se o ESG de fato faz parte da cultura corporativa. Nesse racional, o conceito só funciona se for intrínseco à companhia. Algo muito diferente da realidade de muitas empresas, que chegam ao ponto de colocar o ESG sob a alçada da área de marketing, enquanto claramente deveria ser uma bandeira do conselho de administração.
Assunto correlacionado ao ESG, a diversidade igualmente estaria sujeita aos malefícios da superficialidade. Antes de preencher de maneira mecânica vagas de conselhos com pessoas de origens distintas, seria recomendável que as companhias refletissem sobre a razão pela qual demandam diversidade. E o motivo mais razoável é a variedade de “moldes” de pensamento, que ajuda a minimizar os vieses e favorece a tomada de decisões melhores. Reflexão também é aconselhável quando se trata de compliance, um outro modismo perigoso se mal empregado. A companhia precisa saber se pretende apenas “tirar 10” no cumprimento de regras e códigos ou se é mais importante o compliance funcionar como um agregador de valor.
A tal independência dos conselheiros também tem suas facetas obscuras. O conceito pode disfarçar interesses ou submeter a companhia a conselheiros que, mesmo independentes, não estão devidamente engajados no trabalho. Sob esse ponto de vista, seria muito mais efetivo para as empresas, em vez de um “check” num determinado percentual de independentes, apostar em independência de atitude, o que levaria a ética para o centro dos processos decisórios dos conselhos.
Autorregulação, nessa análise, é outro aspecto que pode ter dois lados. Como diz Rodrigues da Cunha, a ideia é ótima “até que se observe a cozinha”. O risco, aqui, é as regras serem desenhadas e a fiscalização ser estruturada de maneira a proteger alguns grupos influentes em detrimento de outras partes interessadas. Subversão de objetivos também pode aparecer nos IPOs, que perigosamente em alguns casos têm sido montados como fins em si mesmos. Essa dinâmica está longe da função que deveria ser a primordial de aberturas de capital: a geração de valor para um negócio. Não por acaso, no Brasil hoje a demanda é tanta que leva muitas empresas a querer estruturar governança do zero ao Novo Mercado em três meses. Algo muito distante da essência da boa governança, aquela arraigada na cultura corporativa.
Fato é que a governança corporativa hoje no Brasil enfrenta a alta barreira da gestão por “checklist”, que empobrece as boas práticas e fragiliza as companhias no longo prazo. As empresas precisam, nesse cenário, se defender investindo em boas e genuínas práticas, estratégia capaz de garantir sua perenidade.
Luiz Marcatti
é presidente da MESA Corporate Governance e membro de Conselhos de Administração.
luizmarcatti@corporategovernance.com.br
Herbert Steinberg
é presidente do conselho da MESA Corporate Governance.
contatosite@corporategovernance.com.br