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As bolhas financeiras ocorrem quando muito dinheiro se concentra em poucos ativos, geralmente, super avaliados, excedendo, em muito, os seus fundamentos. Alguns sinais podem nos dar pistas de que estamos diante de uma bolha. Um bom indicador é quando começam a pulular explicações, as quais se pretendem absolutamente coerentes, para justificar a rápida elevação no preço de algum ativo, seja a ação de uma empresa, seja o valor dos imóveis.
Embora não exista uma explicação definitiva e universalmente aceita de como as bolhas se formam, de vez que cada escola de economia tem sua própria visão, pode-se dizer que, geralmente, elas nascem em períodos em que a atividade econômica apresenta baixas taxas de juros, regulamentações frouxas e liquidez monetária excessiva no sistema financeiro (crédito fácil), induzindo padrões de empréstimos negligentes ou inadequados por parte dos bancos.
As bolhas se formam em economias, valores mobiliários, bolsas de valores e setores de negócios devido a uma mudança no comportamento dos investidores. Isso pode ser uma mudança real, como visto na bolha econômica do Japão, na década de 1980, oportunidade em que os bancos foram parcialmente desregulados, ou, ainda, pode ser uma mudança de paradigma, tal como a que ocorreu durante o boom das pontocom, no final dos anos 90 e início dos anos 2000. A bolha da internet ou das empresas pontocom é apenas uma das diversas bolhas de ativos que surgiram nos últimos séculos.
A primeira e a mais estranha delas, a bolha das Tulipas, ocorreu na Holanda, entre 1634 e 1637 e causou uma depressão econômica que durou vários anos e gerou uma considerável desconfiança a investimentos especulativos entre os holandeses.
Não faltaram bolhas depois da bolha das Tulipas: na mesma época, ingleses incautos perderam suas economias em ações suspeitas de companhias que se ofereciam para caçar tesouros submarinos. Ainda na Inglaterra, em 1720, ocorreu a Bolha do Mar do Sul. Depois, em 1845, milhões de libras viraram fumaça na “bolha de ferrovias” – o equivalente vitoriano da bolha da Internet, de 2001.
A história sugere que não há recuperação rápida para as crises geradas pela explosão das bolhas. Os mercados levaram cerca de 25 anos para se recuperarem do seu pico pré-crise, depois de atingirem o ponto mais baixo durante a Grande Depressão de 1929 (queda de 89%) entre agosto de 1929 a junho de 1932.
A recuperação dos mercados após a Segunda-Feira Negra de 1987 (-31%) ocorreu depois de dois anos. Já a recessão dos anos 2000 (-34%), entre dezembro de 1999 a setembro de 2002, a Nasdaq levou 15 anos para recuperar o valor perdido. Na grande recessão de 2007/2008 (-49%) que se estendeu de outubro de 2007 a fevereiro de 2009, a recuperação dos mercados ocorreu em cerca de quatro anos.
Segundo Nouriel Roubini, formado em Economia pela Universidade Bocconi de Milão, na Itália, e com doutorado em Economia Internacional, pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, que antecipou o estouro da bolha imobiliária dois anos antes de qualquer outro analista, “as crises não são eventos aleatórios”. “São previsíveis e fáceis de identificar porque os sinais da crise sempre aparecem antes”. Sobre tais eventos, alerta que “são cisnes brancos”, desmistificando sua fama de vidente. “A maioria das crises começa com uma bolha, na qual o preço de um ativo ultrapassa seu valor real”. Ainda, de acordo com Roubini, “as bolhas estão associadas a um aumento excessivo do crédito”. “Este pode ser consequência de uma política monetária frouxa ou da supervisão ou regulação negligente do sistema financeiro”.
Diferentemente do que apregoa Nouriel Roubini, Nassim Nicholas Taleb, em seu livro de 2007, “The Black Swan” (O Cisne Negro), diz que as crises são eventos inusitados e transformadores e que não aparecem no radar. Taleb, professor do Instituto Polítécnico da New York University e da Universidade de Oxford, além de consultor do Fundo Monetário Internacional, defende, em sua obra, a tese de que a evolução da ciência não tem que ver, principalmente, com aquilo que os cientistas, seguindo determinado padrão, conseguem prever. O Cisne Negro é uma metáfora dessa fuga ao padrão e ao previsível, fuga essa que, quando acontece, acaba tendo um extraordinário impacto sobre o conhecimento. No livro, o autor escreve que é impossível tentar antecipar e prever o futuro, já que aquilo que conhecemos é muito menor em relação ao que desconhecemos.
Taleb usa alguns exemplos históricos para ilustrar os cisnes negros, tais como o atentado de 11 de setembro ao World Trade Center, o surgimento da Internet, a 1ª Guerra Mundial, entre outros.
Nostradamus dizia ver o futuro numa bacia de água. Todavia, não há dúvidas, hoje, de que os modelos econômicos são infinitamente mais complexos do que um litro de água numa bacia. “Nós nunca teremos um modelo de risco perfeito”, escreveu o ex-presidente do banco central americano, Alan Greenspan, explicando por que foi tão difícil prever o tamanho da crise financeira de 2008. O futurólogo incorrigível e economista chefe do Goldman Sachs, Jim O’Neill, diz: “Infelizmente, a economia é uma ciência social, embora os economistas finjam que não é”. Diz, ainda: “Nós gostamos de achar que sabemos mais que os outros, mas esse, claramente, não é o caso”.
Como diz, ironicamente, Paul Samuelson, prêmio Nobel de Economia, “os analistas do mercado previram nove das duas últimas recessões”. A crise nos mercados financeiros da Ásia, por exemplo, que afetou as economias do mundo inteiro, pegou os economistas totalmente de surpresa. A imensa maioria deles recomendava investimentos nos Tigres Asiáticos até minutos antes do crash. Na verdade, a missão dos economistas e analistas é muito ingrata, pois tentam fazer algo que, talvez, seja quase impossível: antever o futuro.
Para os céticos, a busca permanente por indicadores “proféticos” é mais um sintoma das fragilidades inerentes à previsão econômica. Como diz Christopher Dembik, diretor de pesquisa econômica do Saxo Banque, “há uma vontade de encontrar o Santo Graal, o indicador que permitirá prever tudo”.
Uma das principais razões do por que os economistas erram tanto é a visão romântica que os mesmos possuem da economia quando ignoram todas as coisas que possam dar errado. O desprezo sobre tais aspectos importantes é que levam, geralmente, à formação das bolhas, principalmente, quando os reguladores não acreditam em regulação.
A hipótese de mercados eficientes é uma ilusão e os economistas, para errarem menos, terão de aprender a reconhecer a importância do comportamento irracional e, muitas vezes, imprevisível dos mercados, de vez que está comprovado que eles sozinhos não irão resolver todos os problemas.
Na visão do inglês John Maynard Keynes (1883-1946), os ciclos de euforia e depressão da economia não podem ser entendidos sem levar em conta o papel das emoções nos processos de tomada de decisão por parte dos consumidores, das empresas e dos investidores.
A lição deixada por ele foi a de que as oscilações da economia decorrem, em boa parte, da própria natureza humana, regida menos pela lógica e mais pelo “espírito animal” – ou seja, pelos impulsos irracionais. “A lição foi esquecida, e os economistas levaram, ao extremo, a ideia oposta, a de que os mercados são sempre racionais e eficientes”, lembra o americano Robert Shiller, professor da Universidade Yale e autor, em parceria com o Nobel de Economia, George Akerlof, do livro “O espírito animal”.
Para Shiller, os profissionais da área econômica foram, aos poucos, desprezando a natureza humana, para que ela não atrapalhasse seus modelos. Isso implicou no fato de ignorar aspectos psicológicos das causas subjacentes dos fenômenos econômicos e financeiros. Sabe-se que os economistas menosprezam a psicologia, por considerá-la uma disciplina inferior.
Ao se renderem a esse preconceito, eles subtraíram de suas análises componentes vitais da realidade. Tornaram-se vítimas do autoengano de que a sua profissão pudesse funcionar com a precisão da física, passando a enxergar os mercados como instituições perfeitas e previsíveis.
Keynes tinha ensinado que não é bem assim. Os indivíduos, dizia ele, são animados, ou movidos por forças, muitas vezes, irracionais. Sem essa dimensão humana, a economia, como profissão, saiu dos trilhos.
Adam Smith diagnosticou corretamente que, ao buscarem o lucro em seus negócios, os padeiros, açougueiros e cervejeiros de seu tempo eram os responsáveis pelo bom funcionamento da economia.
Eles não agiam por altruísmo, mas por interesse próprio. Na soma dessas ações egoístas, Smith viu uma “mão invisível” que produzia a prosperidade geral da sociedade. Por ser correta, não significa que essa visão seja totalmente abrangente. Essa ideia não considera as razões não econômicas que também impelem as pessoas a agir.
Dessa forma, Robert Shiller conclui que os dois conceitos (“mão invisível” e “espírito animal”) são corretos e complementares. O ideal keynesiano, de dotar a economia de meios para tentar diminuir a brutalidade dos ciclos econômicos, não implica a supressão do capitalismo.
Concluindo, arrisco a dizer que nas próximas décadas nada mudará e, tal como há quatrocentos anos (Bolha das Tulipas), as bolhas continuarão a ocorrer. O “espírito animal”, termo usado pelo economista inglês John Keynes (1883-1946) para explicar a euforia que move os investidores em busca do lucro fácil proporcionado pelo mercado financeiro, infelizmente, nunca deixará de existir, pela simples razão da ganância infindável que é própria do ser humano.
Carlos A. H. Brum
é Economista, Analista de Investimento e autor do livro “Bolsa: Bolhas, Crises e os Gurus - Por que eles erram tanto?
cahbrum@terra.com.br