Com o futuro marco regulatório, projeta-se que deve reduzir de cerca de 900 para pouco menos de 100 o número de empresas no bilionário mercado de apostas esportivas online. A notável capacidade de fiscalização das instituições brasileiras favorece a tendência de forte direcionamento das apostas para os canais regulamentados, ainda que o valor estimado para a outorga, R$ 30 milhões, seja um desafio para as empresas nacionais.
Fica um ambiente propício para investidores e M&A, em coligações atentas ao nosso mercado regulado, com poucos players, escalável nacionalmente, e com a perspectiva de fundar as bases para a regionalização na América Latina.
O Governo Federal, a Câmara dos Deputados e o Senado debatem o bilionário mercado de apostas esportivas online, também conhecido como mercado das Bets ou de aposta por quota fixa. A regulamentação deste setor exigirá das empresas práticas de compliance e de jogo responsável, mirando a formação de um ambiente propício aos apostadores e ao crescimento sustentável de toda a indústria. A legislação em construção ambiciona uma arrecadação anual que, segundo projeções da Fazenda, poderá alcançar R$ 12 bilhões. Além de rigorosa prática de fiscalização, diversas portarias detalharão os procedimentos para obtenção da outorga, uso dos meios de pagamento, jogo responsável e integridade, além das regras para anúncios e patrocínios.
Segundo a International Betting Integrity Association, há cinco parâmetros para analisar a possibilidade de um mercado como este ser viável: regulamentos de entrada no licenciamento, carga tributária, variedade de produtos, sistemas de garantia de integridade e restrições equilibradas na publicidade. Elementos como a acessibilidade por canais físicos e online, o processo de concessão de licenças, a eficácia das salvaguardas para os jogadores, uma tributação justa e uma oferta de produtos abrangendo diversas opções de apostas desempenham um papel crucial em determinar até que ponto os consumidores são orientados a optar por empresas regulamentadas, em vez de se voltarem para o mercado não regulamentado no exterior, também conhecido como mercado cinza.
No cenário brasileiro, projeta-se a tendência de forte direcionamento das apostas para canais regulamentados, impulsionada pela notável capacidade de nossas instituições em supervisionar as transações entre empresas e usuários. O valor da licença, uma barreira de entrada importante, estimado em R$ 30 milhões para o período de cinco anos, aponta como um desafio para as empresas de porte médio e pequeno de origem nacional (estimadas entre 400 e 800 entidades). Em contrapartida, a desvalorização de nossa moeda amplia o interesse de agentes estrangeiros, abrindo caminho para investidores e coligações empresariais por meio de fusões e aquisições. O ambiente operacional pós-regulação tende a permanecer robusto, apesar das pressões do Governo Federal por taxas e encargos que superam padrões internacionais. Analistas especulam uma consolidação do mercado com a emissão de 70 a 100 licenças.
Nesse contexto, vários grupos internacionais acompanham o mercado brasileiro, e se posicionam para vultuosos investimentos, entusiasmados com a promessa de escalabilidade decorrente da expectativa consolidação das bets, e de alta canalização em um ambiente saudável com poucos concorrentes. Além disso, a disponibilidade empresas locais com capazes de aportar know-how e gerar sinergia operacional favorecem a possibilidade regionalização com alavancagem estratégica na América Latina.
Para as empresas nacionais que buscam atrair investidores, será necessário posicionar sua marca como um selo de qualidade, honestidade e seriedade, que transmite confiança inequívoca aos consumidores. Este movimento inclui a adequada promoção da personalidade e da proposta de valor da marca, além de seu posicionamento em relação aos concorrentes. A empresa também deve comunicar sua capacidade de compreender a cultura brasileira e de se conectar com os clientes, criando espaço para a combinação de know-how global, produtos internacionais e tecnologia de ponta, com uma execução adaptada à realidade local, incluindo acesso, comunicação, mensagem e interação adequados. Uma abordagem integrada é essencial para o sucesso da empresa que almeja alavancar-se com coligações internacionais estratégicas.
Conforme previsão na regulamentação federal, as empresas reguladas deverão promover o jogo responsável e mitigar os riscos de ludopatia (vício aos jogos) - cerca de 3% dos clientes são considerados jogadores agressivos. Essa abordagem envolve diretrizes destinadas a criar um ambiente seguro e saudável, incluindo a educação e conscientização sobre os riscos associados ao jogo, e a identificação de sinais de comportamento problemático. Estas práticas devem garantir acesso fácil a informações sobre regras, chances de ganhar e histórico de jogos, além de oferecer mecanismos de autoexclusão permanente de plataformas de jogos, e a possibilidade dos usuários estipularem limites para gastos e tempo jogado. Por outro lado, os jogadores moderados e iniciantes exigem grande esforço de conversão, ressaltando a importância da educação sobre os produtos e serviços oferecidos.
Na esfera das Relações Públicas é essencial estabelecer uma sólida interlocução com organizações especializadas no setor e colaborar ativamente com as autoridades regulatórias. Também será primordial garantir a publicidade responsável, evitando mensagens enganosas e promovendo o jogo responsável. A regulamentação brasileira, no momento, caminha para uma parceria com o CONAR, em vistas à definição de um código de autorregulamentação publicitária para o setor.
O compromisso com o compliance e a integridade, seguindo uma ética sólida e responsabilidade social, é vital para conquistar de investidores. Os princípios da boa governança - integridade, transparência, equidade, responsabilização e sustentabilidade – têm terreno fértil de evolução neste segmento. A boa governança requer a elaboração de acordo entre os sócios, recurso pouco comum nesta indústria, bem como a devida prestação de contas - relembrando que até a regulamentação, empresas de apostas esportivas online podem operar no Brasil, mesmo sediada offshore.
Em meio às discussões, e com a perspectiva de alterações nos parâmetros apresentados pelo governo, um novo capítulo se descortina para esse setor em franca expansão e a aguardada regulamentação da Lei nº 13.756/2018 traz consigo a promessa de conferir confiança e segurança aos apostadores, mediante rigorosa fiscalização. Nesse contexto de fluidez normativa, as centenas de empresas de apostas nacionais devem estar preparadas para se adaptar a novos cenários, readequando estratégias e operações conforme as diretrizes governamentais se confirmem, e preparadas para uma onda de M&A.
Nesse contexto de expectativa e transformações, as empresas de apostas precisarão equilibrar cautela e ousadia. A incerteza traz consigo um ambiente fluido, onde o risco de tomar decisões precipitadas é real. O atual momento exige o enfrentamento dos desafios com sensatez e visão estratégica.
Alexandre Oliveira, PhD, CCA
é Conselheiro de Administração com foco em Estratégias e Riscos da Transformação Digital. Membro da Comissão de Estratégia do IBGC, da Agroven (Smart Money for AgTechs) e CEO da Cebralog Consultoria. Doutor em IA nas Decisões Corporativas (Unicamp), pós-graduado Negócios Digitais (MIT) e em Finanças (Unicamp). Mestre em Supply Chain (Cranfield University).
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