A gestão eficiente, transparente e bem-sucedida das empresas estatais brasileiras, sejam as públicas ou as sociedades de economia mista, é fundamental para que elas cumpram com seu propósito no desenvolvimento sustentável. Essas organizações cresceram e se multiplicaram sob a justificativa de atendimento a demandas sociais não supridas pela iniciativa privada. Hoje, impactam fortemente o orçamento e a alocação de recursos públicos, a oferta de produtos e serviços relevantes para a qualidade da vida e o bem-estar, os investimentos de pessoas físicas e jurídicas, setores estratégicos e o ambiente de negócios em geral.
É muito importante que as estatais tenham um modelo de gestão especialmente robusto, congruente com a magnitude de suas atividades e suas externalidades. Por isso, neste momento em que precisamos unir todos os esforços possíveis para colocar em definitivo o País na direção do desenvolvimento sustentável, líderes e técnicos dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, além dos próprios administradores dessas empresas, devem assumir compromisso inequívoco e efetivo com o avanço da governança.
Espera-se que os órgãos e agentes do governo zelem pela eficiência na administração de recursos públicos, pelo cumprimento da legislação em vigor e pela observância do princípio constitucional – atender aos objetivos de políticas públicas previstas em lei – de criação e manutenção de empresas públicas e de sociedades de economia mista.
Para que a resposta a esse desafio seja bem-sucedida, há recomendações pertinentes e consistentes, expressas com clareza na sexta edição, recentemente lançada, do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa (IBGC, 2023), que define: “Governança corporativa é um sistema, formado por princípios, regras, estruturas e processos, pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas com vistas à geração de valor sustentável para elas próprias, para seus sócios e para a sociedade em geral”.
A boa governança corporativa é alicerçada nos princípios da integridade, transparência, equidade, responsabilização e sustentabilidade. Esses são elementos essenciais para promover a confiança e o alinhamento de interesses entre os diversos agentes e, assim, viabilizar os resultados esperados.
A importância da boa governança para as estatais é evidente. Para uma empresa pública ou uma sociedade de economia mista, contribuir para impactos sociais positivos é mais do que um propósito aspiracional. Trata-se de obrigação definida em lei para satisfazer um interesse coletivo ou imperativo de segurança nacional, conforme determina o artigo 173 da Constituição Federal. Sem princípios, regras, estruturas e processos para dirigir e monitorar a estatal, não há como garantir o alcance de um objetivo como esse, tão desafiador, amplo e com múltiplos impactos.
O respeito aos princípios e a adoção consistente das melhores práticas de governança propiciam maior efetividade no planejamento estratégico, no gerenciamento de riscos, na prestação de contas e na consideração das partes interessadas, dentre outros benefícios tangíveis e intangíveis em curto, médio e longo prazos.
O conselho de administração tem papel-chave nesse contexto, pois deve atuar como guardião do propósito, dos valores, do objeto social e do sistema de governança da organização. Ele é o órgão colegiado encarregado da definição da estratégia corporativa, da avaliação de sua execução pela diretoria e da conexão entre a gestão e os acionistas.
Para que funcione adequadamente, o conselho de administração depende de uma composição muito bem pensada e planejada. Seus integrantes devem ter competências técnicas e comportamentais compatíveis com o cargo e a capacidade para tomar decisões com autonomia e isenção, sem interferência de interesses pessoais, de acionistas ou grupos específicos.
O compromisso do conselho deve ser com o interesse da empresa. Por mais contraditório que pareça, nem sempre a vontade dos acionistas, que elegem os conselheiros, coincide com o que é o melhor para a empresa. É por isso que os processos de indicação e seleção de membros de conselhos de administração são fatores críticos de sucesso, exigindo aprimoramento constante na mitigação de conflitos de interesses para a valorização de critérios técnicos.
Mais do que refletir sobre quem deve estar nos conselhos, vale a pena prosseguir com uma agenda de reformas que ganhou força, mas que se estagnou após os primeiros anos da edição da Lei das Estatais (13.303/2016). Há recomendações de referências nacionais e internacionais para a evolução da governança nesse campo, como a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), o G20, o Banco Mundial, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e a Transparência Internacional.
Na Agenda de Governança Corporativa, que o IBGC apresentou às equipes das campanhas eleitorais dos candidatos à Presidência da República em 2022 e tem levado aos representantes do governo atual, são elencadas as seguintes medidas:
O atendimento a essas recomendações significaria avanço expressivo e condizente com a representatividade das companhias estatais na economia e na sociedade. Para dimensionar seu tamanho, basta verificar que, no âmbito no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), anunciado em agosto pelo governo federal, os investimentos das empresas públicas e de economia mista somarão R$ 343 bilhões em quatro anos, montante muito próximo dos R$ 371 bilhões previstos para a administração direta da União.
Não restam dúvidas de que os princípios e práticas de governança corporativa contribuirão para que essas organizações - cujo principal acionista, a rigor, é o povo brasileiro – exerçam efetivamente sua missão em uma agenda sustentável de Estado.
Pedro Melo e Danilo Gregório
são, respectivamente, diretor-geral; e gerente de Relações Institucionais e Governamentais do IBGC.
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