Targeting

ABORDAGEM STOCK PICKER

O Brasil, antes visto como a grande esperança para a economia da América Latina, vislumbra uma nuvem negra por sobre suas perspectivas. Com a desaceleração econômica, a inflação elevada e o aumento dos custos das empresas, alguns executivos de Relações com Investidores ainda lamentam o futuro perdido. E lá se vão os dias de crescimento estelar do PIB, os valuations fáceis e os roadshows lotados de investidores.

Mesmo os bons ativos hoje estão sob pressão. O desempenho do mercado acionário continua bem distante daquele do período pré-crise, e os banqueiros que tinham filas de IPOs agora enfrentam um ano inteiro sem operações. A moeda brasileira está relativamente sobrevalorizada e ainda é uma das mais caras entre as nações emergentes.

No entanto, há luz no fim do túnel. Uma pesquisa recente do BNY Mellon mostra que os investidores estão adotando a abordagem stock picker ao lidar com o Brasil: estão dispostos a ignorar o risco do cenário macro por empresas que demonstrem sólido crescimento dos lucros, atuem em um nicho forte ou sejam uma história de turnaround. A proporção de investidores ativos também está aumentando, o que evidencia que o Brasil está sendo examinado comparativamente aos mercados emergentes com uma lente de longo prazo, e que esses investidores estão buscando altos retornos, mais uma vez, após a crise de crédito.

E as empresas parecem reconhecer isso. Os conselheiros de empresas brasileiras estão interagindo cada vez mais com investidores. Para se ter uma ideia, no Brasil, as companhias relatam que houve um aumento de 38% dessas conversas ao longo dos últimos cinco anos, todas abordando estratégia – em comparação com um crescimento de apenas 29% das empresas em todo o mundo, segundo a pesquisa mundial do BNY Mellon. Essa dinâmica foi repetida ao longo de toda a cadeia: o número de reuniões com investidores, domésticas e internacionais, realizadas pelos RIs brasileiros, excede o de seus pares globais.

Mas ainda há trabalho a ser feito. Não muito diferente da descrição popular que fala das cinco fases do luto, muitos RIs foram além da negação e da raiva – 1a e 2a fases – contra o pano de fundo econômico, mas ainda têm que abraçar a 5a fase – a aceitação. Ao invés de procurar se ajustar, proativamente continuam a negociar com o destino – esperando por um alinhamento de astros políticos e econômicos que pode nunca vir a acontecer.

Mas a economia não pode ser nem o bode expiatório nem o salvador da pátria. Enquanto as empresas dizem que a economia do Brasil influencia a demanda numa proporção maior do que os fundamentos da empresa, os RIs devem se concentrar no que pode ser controlado e no que isto transmite aos investidores. Significa deixar para trás a esperança de vitórias fáceis, adaptando sua mensagem para tempos econômicos com menos certezas.

A seu favor, as evidências apontam a disposição dos investidores em avaliar empresas caso a caso. Investidores decididos a apoiar companhias brasileiras têm alguns requisitos comuns. Por exemplo, seis estudos de percepção recentes realizados com profundidade para clientes pela MBS Value Partners, consultoria internacional de RI e comunicação financeira, mostra que esses investidores são altamente sensíveis a preço.

Plenamente conscientes do risco macroeconômico do Brasil, preferem as melhores ações de cada segmento, ao invés de conglomerados com diversas empresas. Eles estão à procura de foco em tempos econômicos difíceis. Este é o chamado para que os RIs sejam mais pró-ativos, articulem bem o posicionamento de mercado de suas companhias, para ajudar os investidores a entenderem o potencial futuro, e transmitam os benefícios de uma reestruturação, melhorando a rentabilidade; em suma: façam o que seja preciso para se sobressaírem perante os concorrentes pelo capital, sejam eles locais ou globais.

Os estudos da MBS Value mostram que esses investidores com perfil de valor (value investors) estão procurando movimento: estão dispostos a apoiar empresas que tomaram medidas difíceis para se reestruturar, modernizar e se reorientar. Da mesma forma, os investidores reconhecem as empresas que são estrategicamente fortes, mas que acabaram sendo atingidas pelo cenário macro. Isso sugere um futuro incerto para aquelas empresas confrontadas com a necessidade de se ajustar. Como sempre, os fundamentos se aplicam ao perfil das empresas a serem cortejadas pelos investidores: aquelas com balanços sólidos e potencial superior de crescimento dos lucros continuarão a ser as favoritas.

Outra área em que os RIs brasileiros podem ser mais estratégicos é na atividade de targeting. Uma das principais metas dos RIs americanos, de acordo com o BNY Mellon, é aprimorar o engajamento com a atual base de acionistas e aumentar a liquidez. Mas a organização de inúmeras reuniões com investidores tem seus limites. Numa abordagem mais ampla, o foco deve ser na qualidade das reuniões, não apenas a quantidade.

De fato, a estratégia e as mensagens podem ser adaptadas para cada grupo específico. Os value investors estão entre os mais dispostos a apoiar as empresas listadas em momentos difíceis, de acordo com a MBS. Eles estão localizados em bolsões geográficos, como o meio-oeste americano, terra de Warren Buffett, e não devem ser negligenciados até que um roadshow de alguma operação venha a surgir, mas devem ser ativamente cortejados por empresas de mercados emergentes que possam demonstrar uma trajetória de crescimento.

O estudo recente do BNY Mellon sobre Corporate Access mostra que esses investidores se ressentem da falta de acesso regular a equipes internacionais de gestão. Uma vez conquistados, esses investidores, normalmente pacientes, se tornam ainda mais próximos que muitos outros grupos, e vale a pena o esforço de embarcar em um non-deal roadshow somente para visitá-los. Investidores europeus também tendem a concentrar-se no longo prazo e na qualidade da gestão.

Ficar preso à 3a fase do luto, a barganha, significa deixar a desejar quando se trata de envolvimento com investidores globais. A diversificação da base de investidores de uma empresa é muito importante, levando-se em conta o status do Brasil como um membro dos chamados "cinco frágeis” dos mercados emergentes – e mesmo assim apenas 43% dos RIs locais distribuem seus comunicados e releases fora do mercado doméstico. Isso considerando que 94% dos RIs brasileiros nomearam os Estados Unidos como o país de maior importância estratégica para novos investimentos nos próximos cinco anos, com o Reino Unido e Cingapura atingindo 50% na mesma base. Mais uma vez, uma abordagem mais estratégica de targeting de investidores deve render dividendos.

Conclusão
O atual cenário econômico desafiador no Brasil é uma chamada à ação para as equipes de RI. Para aqueles que se entristeceram com o paraíso perdido, é hora de estar pronto para ajustar a sua estratégia – os investidores ainda estão lá, no meio-oeste dos Estados Unidos ou espalhados em outros locais mundo afora, procurando ações que geram valor. No entanto, esses investidores já não estão batendo nas portas de empresas listadas de mercados emergentes. Em vez disso, eles devem ser procurados por organizações que possam demonstrar uma proposta de valor no ambiente global atual. E como todos os que passam pelo luto, transitando pelas fases de negação, raiva, barganha e depressão, quando finalmente contemplarem plenamente a aceitação, os RIs brasileiros irão perceber todo o potencial da sua empresa.

 

Monique H. Skruzny
é sócia da MBS Value Partners.
monique.skruzny@mbsvalue.com

Karen Bodner
é especialista em Mercados de Capitais do BNY Mellon.
karen.bodner@bnymellon.com
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