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Na última semana de fevereiro iniciei as aulas em quatro turmas de Finanças Pessoais na Universidade Federal de Santa Catarina. Nelas estão matriculados cerca de 170 alunos de diversos cursos da UFSC pois, a disciplina é optativa para todos os cursos da universidade. Na primeira aula, visando integrar a turma, solicito que cada aluno diga o seu nome, o curso que frequenta, algo interessante sobre ele e finalmente alguma coisa que gostaria de mudar em si mesmo. Neste semestre pouco mais da metade dos alunos disse que gostaria de ser menos ansioso.
O resultado da pergunta reforçou minha percepção de que o nível de ansiedade dos alunos não para de aumentar. A cada ano que passa observo mais alunos reclamando de ansiedade e sei que muitos utilizam largamente ansiolíticos no dia-a-dia.
O medo é uma característica biológica do ser humano e de outros animais, ele é a resposta emocional a uma ameaça iminente real ou percebida, já a ansiedade é a antecipação da ameaça futura. Tanto o medo como a ansiedade foram e são fundamentais para o homo sapiens, eles nos preparam para lutar ou fugir dos perigos da vida. Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais, os transtornos de ansiedade compartilham características de medo e ansiedade excessivos e perturbações comportamentais relacionados. Portanto, não podemos diagnosticar que a maioria dos alunos tenham transtorno de ansiedade, mas apenas que o excesso de ansiedade lhes incomoda.
Mas o que tem levado tantos jovens a se considerar ansiosos?
Sociedade de excessos
Em um lapidar artigo: “Angústia do excesso”, do Dr. Ercy Soar, médico psiquiatra e doutor em ciências humanas e longos anos de prática de terapia familiar, Soar descreve que vivemos “um tempo de pouco tempo e de muitas oportunidades”.
Segundo o psiquiatra, estamos migrando de uma sociedade de consumo para uma “sociedade de excessos”. Nesta sociedade existe excesso de informações, de opções e de alternativas, gerando um novo fenômeno que ele denomina “angústia do excesso”, onde o excesso de escolhas se torna fonte permanente de ansiedade. Ele apropriadamente afirma que “não ter opções é um problema. Tê-las demais, outro”.
O custo das escolhas
Na história da humanidade sempre tivemos que tomar decisões e fazer escolhas. Estas decisões, em geral, eram muito mais dramáticas do que as atuais. Uma escolha errada e poderíamos nos tornar presa de algum animal ou morrer de fome. Porém nunca tivemos tantas escolhas a fazer quanto agora.
O processo de tomada de decisões é altamente complexo e envolve diversos sistemas cerebrais diferentes. Ocupando apenas 2,5% de nossa massa corporal, o cérebro consome até 25% da energia total do nosso corpo. Quanto mais decisões tomamos, mais energia e capacidade cognitiva gastamos. A cada escolha que fazemos precisamos abrir mão de outras opções. E temos imensa dificuldade em trabalhar as perdas resultantes das escolhas.
O professor de economia comportamental do Massachusetts Institute of Technology (MIT), Dan Arielly, fez um experimento simples para demonstrar como temos dificuldade em aceitar perdas. No experimento, os participantes são colocados a frente de um computador. Na tela aparecem três portas: uma vermelha, uma azul e outra verde. Cada participante tem direito a cem cliques. Após abrir cada porta com um clique, o participante entra em uma sala com objetos que, ao serem clicados, dão recompensas que variam de um a dez centavos de dólar.
Cada sala virtual tem diferentes retornos médios e compete ao participante descobrir qual delas oferece a melhor gratificação. Espera-se, depois, que ele permaneça na sala escolhida. Foi o que fez a maioria dos participantes: após quatro ou cinco cliques em cada sala, eles escolhiam uma que consideravam a mais apropriada, e permaneciam ali até terminarem os cem cliques.
Mas em um segundo grupo, os pesquisadores alteraram o experimento. Cada porta passou a perder um doze avos do tamanho depois de cada clique em outra porta. Se a porta não fosse aberta depois de 12 cliques, ela desapareceria da tela do computador. O que aconteceu, então? As pessoas passaram a não ficar mais na sala que julgavam ser a melhor. Ao contrário, faziam o máximo para não permitir que nenhuma das portas desaparecesse. Para manter todas as portas abertas, os participantes acabavam tendo uma remuneração final 15% menor do que aqueles que não tiveram que lidar com as portas que sumiam.
Depois disso, os pesquisadores alteraram novamente o experimento. Cada clique para manter uma porta aberta passou a custar três centavos de dólar. Os participantes continuaram a desperdiçar cliques, tempo e dinheiro tentando evitar que as portas desaparecessem.
A pesquisa do professor Arielly leva a pensar sobre como esta dificuldade de escolher interfere em nossa vida pessoal e financeira.
A ansiedade das escolhas
Conhecendo a realidade socioeconômica da maioria dos meus alunos não acredito que os perigos reais sejam a fonte de medo e ansiedade, prefiro acreditar nas explicações do Dr. Ercy e do Professor Dan Arielly. O que tem levado meus alunos a níveis anormais de ansiedade é o excesso de escolhas que a vida lhes apresenta.
Basta retrocedermos poucas décadas, um piscar de olhos em termos evolutivos, para encontrarmos jovens que tinham menos escolhas durante a vida. Tínhamos um ou dois carros acessíveis, viajar quando muito era para alguma cidade próxima dentro do nosso próprio país. Até as carreiras a seguir eram limitadas.
Atualmente ao abrir qualquer rede social os jovens das classes mais favorecidas podem ver seus contatos nas mais diferentes partes do mundo, passando pelas mais diferentes experiências que possam imaginar. O mundo do consumo e das experiências se descortina e tudo parece estar ao alcance.
O progresso material da sociedade abriu portas para a aquisição de novos produtos e conhecimentos, porém temos limites cognitivos e de tempo, o que nos impede de aproveitar todas as maravilhas desta nova sociedade. Assim, ensina Dr. Soar, precisamos aprender, e principalmente ensinar aos nossos filhos a escolher o que não queremos saber e, especialmente, o que não queremos experimentar. Ou seja, escolher quais portas queremos deixar de gastar recursos para manter abertas.
Jurandir Sell Macedo
é doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
jurandir@edufinanceira.org.br