Famílias empresárias buscam permanentemente alternativas de investimento com bons retornos para proteger e expandir o patrimônio familiar. É muito comum que nesse esforço elas estejam voltadas puramente aos ativos tangíveis, ao capital financeiro, como se o patrimônio familiar estivesse restrito a bens, imóveis, aplicações e afins. O patrimônio familiar vai muito além disso e sua semente está na própria família.
Sendo a família o principal ativo, o “negócio” que tornará viável a sobrevivência de todos, é preciso estabelecer o equilíbrio nas relações familiares. Para isso, é imprescindível viabilizar a realização pessoal de cada membro, pois a preservação do patrimônio depende da harmonia da família. São muito comuns os casos em que as disputas ou divergência de interesses na família, muitas vezes sobre aspectos externos aos negócios, acabe por destruir a empresa e/ou o patrimônio construído pelas gerações anteriores.
Os primeiros passos para preservar e ampliar o patrimônio familiar devem ser a definição dos objetivos e do propósito familiar e traçar o cenário em que desejam estar nos próximos 10, 20 ou 30 anos. E ter clara a intenção de perpetuar o partimônio para as próximas gerações e a necessidade de pavimentar a perenidade da harmonia entre os membros da família.
Não é raro encontrar empreeendedores bem sucedidos, com destacada capacidade em gerir seus negócios, definir estratégias, estabelecer, monitorar e analisar métricas que não demonstram a mesma diligência na gestão do patrimônio familiar. Um patrimônio algumas vezes maior ou, pelo menos, muito significativo – e, certamente, muito mais importante, comparado ao da empresa ou grupo. E, importante ressaltar, empresas que, via de regra, seguem as boas práticas de governança corporativa.
As famílias empresárias devem se concentrar no planejamento estratégico de seu principal ativo: a família. Ao avaliar a preservação do patromônio devem priorizar os aspectos intangíveis, levando ao conselho de família a discussão quanto ao legado a ser transmitido às próximas gerações, a constituição e os acordos familiares.
Quanto aos aspectos tangíveis é preciso se dedicar a planejar em longo prazo, definindo cenários para o patrimônio familiar a cada nova década. Avaliar se o desejo da família é preservar o poder de compra de seu capital financeiro para as gerações futuras ou se os membros querem exercer seu direito de consumí-lo em vida. Enfim, chegar a um consenso sobre a aspiração de cada um.
Com estas respostas e definições é possivel traçar o caminho para os obejtivos desejados e se cercar de profissionais devidamente capacitados e habilitados, familiares ou não, por meio da criação de uma estrutura segregada e dedicada a isso, os chamados family offices ou escritório de família.
Numa analogia entre as estruturas de governança corporativa e governança familiar, podemos fizer que a família, ou o conselho de família, tem o papel equivalento ao do conselho de administração, planejando e monitorando a consecução da estratégia e o atingimento dos resultados. Já o family office desempenha o papel da diretoria executiva, realizando o trabalho diário para atingir os objetivos previamente acordados pelo conselho de família. Assim, a família terá sempre a visão estratégica da administração de seu patrimônio.
Ao family office cabe administrar o patrimônio familiar acumulado ao longo das gerações, sejam recursos financeiros, intelectuais ou sociais. Como estrutura independente, é perene e deve ser gerida de forma profissional, com metas e objetivos definidos. É ele também o responsável por alavancar o capital intelectual dos membros da família, não somente ao buscar educação de excelência, mas também definindo o direcionamento de recursos para financiar projetos empreendedores das gerações futuras.
Capital intelectual é a maior herança
As gerações futuras devem ser sempre consideradas como se fossem a primeira geração, aprendendo a navegar num ambiente de dificuldades e adversidades. Características, aliás, presentes no contexto enfrentado pelos grandes empresários da história em diferentes épocas. O segredo para a formação das novas gerações está no equilíbrio entre dar liberdade suficiente para que desenvolvam suas habilidades e o espírito empreendedor e, ao mesmo tempo, prover suporte e apoio familiar. Assim, é possível criar o ambiente desafiador que permitirá a elas desenvolver as capacitações necessárias, mesmo que seja um caminho árduo.
O capital intelectual é a melhor herança a deixar para as futuras gerações. Capital financeiro pode ser obtido, aumentado ou perdido pela habilidade em gerí-lo, mas também em consequência de conjunturas econômicas ou políticas ou mesmo de situações que fogem totalmente ao nosso controle e, às vezes, a qualquer previsão, haja vista a atual crise global provocada pela eclosão da Covid-19. O capital intelectual, entretanto, não se perde. Ele é o principal responsável por viabilizar ganho financeiro, se este for o objetivo.
Somente tendo clareza sobre o propósito, os objetivos e o cenário de onde se deseja chegar, alinhando os interesses dos membros e estabelecendo a harmonia na relação familiar,e provendo as condições para que as próximas gerações se desenvolvam com o apoio necessário é que as famílias empresárias terão êxito no processo de preservação do patrimônio familiar e, consequentemente, da empresa.
Leonargo Wengrover
é membro do conselho de ddministração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), co-autor do livro “Patrimônio x Liberdade – Estratégias de preservação patrimonial e realização pessoal para família bem-sucedidas” e CEO e sócio fundador da W Advisors.
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