Fórum Abrasca

SOPA DE LETRINHAS ESG: PADRONIZAR É PRECISO!

Nos últimos anos, um dos grandes desafios das áreas de Sustentabilidade e ESG - sigla para questões: Ambientais, Sociais e de Governança - têm sido encontrar um padrão entre os inúmeros reportes, relatórios e métricas que existem no mundo atualmente. Compreender e abordar as questões ESG que são mais importantes para o negócio da companhia reduz vulnerabilidades e identifica oportunidades de crescimento. É bom para os negócios, bom para as pessoas e bom para o meio ambiente.

Novos tempos exigem novas métricas e, cada vez mais, o valor gerado pelas empresas transcende questões financeiras tradicionais. Isso porque deve-se levar em consideração também o impacto do negócio na sociedade e olhar das novas gerações, futuros investidores.

Esse impacto causado pelo negócio pode se manifestar de diferentes formas, dentre eles, inclusive, acontecimentos naturais. Pode levar também a reflexões importantes, como foi o caso da pandemia ocasionada pela Covid-19, que deu visibilidade para questões como desigualdade social, tratamento de minorias e exploração do meio ambiente, fazendo com que as empresas trouxessem a temática para o debate.

Outros fatores que contribuem para essa mudança de mentalidadeda sociedade e consequentemente influenciam na decisão dos investidores em optar por fundos sustentáveis são os compromissos firmados em acordos globais.

A Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas) tem acompanhado todas essas movimentações e, em especial, em parceria com a AMEC (Associação dos Investidores do Mercado de Capitais) e a B3 (bolsa brasileira), criou o Fórum ESG Investidor & Empresa, no qual debateu os principais relatóriosmundiais sob a ótica dos investidores e das empresas.

Os debates trouxeram a percepção de que é indiscutível a relevância que os temas relacionados à ESG têm dentro e fora das empresas e do quanto eles vêm transformando rapidamente as organizações e sociedade.

As empresas têm aprimorado a sinergia entre as diversas áreas, suas equipes e processos, a agilidade nas oportunidades de novos negócios, o atendimento às expectativas dos stakeholders e de mercado para atender a demandas em ESG.

No entanto, há um desafio inerente que é a falta de padronização de métricas. Há uma dificuldade em aferir dados, além da preocupação com questões como, por exemplo, capital humano, preservação da natureza, reputação corporativa, que são aspectos que geram valor financeiro para o negócio e não necessariamente são medidos pelos modelos tradicionais.

No quesito de report financeiro de informações ESG, a contabilidade ESG tem sido objeto de esforços para padronizar as métricas ESG e os relatórios. Diversos organismos internacionais e nacionais, incluindo a Organização Internacional de Padronização (ISO), o Conselho de Normas Contábeis Internacionais (IASB) e a Iniciativa de Relato Global (GRI), trabalham na padronização das métricas ESG.

É Importante ressaltar que a Fundação das Normas Internacionais de Contabilidade (IFRS Foundation) deu um passo rumo à criação de padrões internacionais de transparência e registro de informações de sustentabilidade, a começar pelas questões climáticas.

Durante a COP26, realizada em Glasgow na Escócia em 2021, a entidade anunciou a formação de um Comitê Internacional de Parâmetros de Sustentabilidade (ISSB, na sigla em inglês), com o objetivo de desenvolver uma base global para os mercados financeiros globais.

Ressalta-se que aqui a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicou a resolução 59 que entrou em vigor em janeiro de 2023, a qual orienta que as empresas de capital aberto no mercado brasileiro divulguem informações relacionadas a práticas ESG, da preparação de relatórios específicos de atividades com esse fim até o cálculo de inventário de emissão de gases de efeito estufa.

A avaliação de riscos e tomada de decisões também são incluídos nesse contexto. A contabilidade ESG é útil na avaliação de riscos ESG. Os investidores, analistas e outras partes interessadas podem usar informações ESG para avaliar o risco potencial de uma empresa em relação a suas questões. Isso inclui riscos como multas regulatórias, dano à reputação, impacto ambiental, entre outros. Já na tomada de decisão as informações ESG fornecidas pela contabilidade ajudam a tomar decisões sobre investimentos, empréstimos, aquisições e outros negócios.

Assim, para tangibilizar as ações ESG, as companhias precisam inseri-las em sua estratégia corporativa. O fato inescapável é que o ESG precisa fazer parte do propósito e dos valores da empresa. Neste sentido, é importante ressaltar a importância da liderança neste processo. O conselho de administração de uma empresa deve desempenhar um papel fundamental na supervisão dos esforços ESG da empresa, incluindo garantir que a empresa tenha controles e procedimentos apropriados de divulgação ESG e que ele esteja integrado à estratégia da empresa.

Além disso, para alcançar a integração, é essencial medir corretamente as iniciativas ESG da empresa. No entanto, a tarefa de medir o progresso dessas ações e comparar diferentes empresas não é simples. O desafio reside no fato de que cada setor possui características distintas e requer ponderações específicas para os diferentes aspectos ESG, uma vez que a importância de cada indicador varia de acordo com o segmento. Cada setor enfrenta seus próprios riscos e oportunidades, que se refletem nos indicadores ESG.

Aumentar a maturidade ESG das empresas vem do entendimento do que é relevante para cada companhia e onde cada uma delas se encontra nesse processo. Não se trata de algo transversal, e sim único para cada segmento e até mesmo empresa, uma vez que as características e a relevância de cada indicador podem ser radicalmente diferentes.

Um grande desafio nesta seara é determinar o que deve ser reportado e como fazer isso. A expressão comumente utilizada é "sopa de letrinhas”, popular por ilustrar a grande variedade de reports no mercado. Não ter uma centralização destes questionamentos em um único, ou pelo menos em poucos reports, resulta em alto custo de observância, além do tempo necessário em um processo que poderia ser otimizado por meio da padronização dessas métricas.

A Abrasca acredita que se a organização adotar uma abordagem clara e eficiente para medir sua sustentabilidade, esses aspectos podem ser incorporados ao processo de investimento e, ao mesmo tempo, impulsionar o valor de mercado da própria organização. À medida que as empresas avançam em suas práticas ESG, a necessidade de padronização se torna cada vez mais urgente e essencial. Essa é uma tarefa significativa e, portanto, deve ser tratada como prioridade.


Pablo Cesário e Fernanda Claudino
são, respectivamente, presidente-executivo; e gerente geral das comissões técnicas e líder ESG da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).
abrasca@abrasca.org.br


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