Desenvolvimento Sustentável

CONSELHEIROS E DIRIGENTES PELA AMAZÔNIA: NEGÓCIOS SUSTENTÁVEIS NA BIOECONOMIA

O desenvolvimento de um novo ecossistema de negócios, que concilie a conservação ambiental e o desenvolvimento socioeconômico, precisa ser fomentado na Amazônia. Soluções baseadas na natureza possibilitam uma visão integrada que considera pessoas, infraestrutura, ordenamento territorial e soluções sustentáveis para problemas complexos e sistêmicos. São novos modelos de negócios que compreendem os riscos e o “custo Amazônia” para operar, baseados em oportunidades econômicas e de crescimento a longo prazo.

Para isso, é fundamental o engajamento dos conselheiros de administração e executivos na agenda de negócios sustentáveis na Amazônia. A bioeconomia amazônica apresenta-se como uma abordagem de negócios promissora, baseada na geração de riqueza compartilhada, com foco na redução dos impactos socioambientais, nas melhores práticas de sustentabilidade e na criação de oportunidades de negócios na economia circular, regenerativa e de baixo carbono. O fortalecimento das cadeias produtivas da sociobiodiversidade, baseado nas vocações territoriais, é uma das premissas de uma bioeconomia inclusiva.

O fomento da bioeconomia na Amazônia demanda ação coletiva de diferentes atores públicos e privados, governança compartilhada, marcos regulatórios, políticas públicas, fontes de financiamento, ciência, tecnologia e inovação para promover um novo modelo de desenvolvimento socioeconômico que considere o bem-estar humano, os limites e a capacidade de resiliência dos ecossistemas. As empresas, por meio de seus conselheiros e executivos, são fundamentais na construção dessa agenda de desenvolvimento socioeconômico.

Bioeconomia Inclusiva na Amazônia
O conceito de bioeconomia inclusiva na Amazônia se relaciona com atividades econômicas baseadas na produção, comercialização e distribuição dos ativos ambientais da sociobiodiversidade, possibilitando a interiorização do desenvolvimento e promovendo o empoderamento das comunidades tradicionais e dos grupos de extrativistas para aprimorar a sua qualidade de vida e seu bem-estar. Trata-se de uma bioeconomia de gente. Se a população tem emprego, renda e bem-estar, há condições para conservação da natureza.

Métricas e indicadores de acompanhamento dos resultados e impactos das atividades produtivas na bioeconomia amazônica são fundamentais para o planejamento de políticas públicas transversais e integradas e para o fomento de negócios com visão de longo prazo. É preciso dar transparência aos resultados alcançados – da narrativa à prática – por meio de resultados e impactos positivos nos negócios e na sociedade.

Tradicionalmente, as empresas medem seu desempenho por meio de indicadores econômico-financeiros. Na agenda ESG (Environmental, Social and Governance – Meio Ambiente, Social e Governança), o desempenho sustentável das organizações é medido por indicadores mais holísticos e baseados na redução dos riscos por meio da mitigação das externalidades socioambientais.

No pilar Social, processos participativos e o bem-estar das comunidades, a segurança alimentar, sanitária e física são indicadores estruturantes na bioeconomia. Pode-se acrescentar também o pilar Econômico, em que geração de emprego e renda, distribuição justa de benefícios e pagamento por serviços ambientais devem ser medidos. Em Meio Ambiente, as taxas de desmatamento, restauração de áreas degradadas e emissões medem a redução dos riscos climáticos e ambientais. E, por fim, indicadores no pilar Governança devem ser baseados em processos de rastreabilidade e monitoramento contínuo, métricas, sistematização de práticas replicáveis e arranjos de implementação do sistema de governança.

Negócios e Biodiversidade Amazônica
O potencial de negócios na região amazônica é significativo na bioeconomia. A economia baseada na floresta em pé envolve diversos setores com alto potencial de consumo regional e internacional. Um exemplo de mercado promissor e pouco explorado é o de superfoods, alimentos caracterizados pela forte presença de vitaminas e minerais, como açaí, castanha, cumaru, cacau e peixes.

Outros setores com alto potencial de geração de negócios na Amazonia são: gestão de resíduos sólidos na bioeconomia circular, agronegócio sustentável por meio da utilização de áreas degradadas e adoção de sistemas agroflorestais (integração lavoura-pecuária-floresta), ecoturismo, produção de fármacos, cosméticos e químicos baseados em bioinsumos, iniciativas de recuperação de áreas degradadas e geração de créditos de carbono. Adicionalmente, investimentos em saneamento, infraestrutura logística, construção civil, energia renovável, produção de biocombustível, concessões de parques e reservas são outras áreas de expansão nos próximos anos.

A Amazônia é uma região de oportunidades, pois abriga uma rica biodiversidade e recursos naturais valiosos, além do conhecimento das comunidades tradicionais. A bioeconomia, baseada no uso sustentável dos recursos naturais, apresenta promissor potencial de negócios para as empresas. O desenvolvimento dos territórios amazônicos é estimulado por abordagens empresariais que valorizam a conservação da biodiversidade, o fortalecimento de cadeias produtivas sustentáveis e a inclusão social. Tudo isso contribui para o desenvolvimento local, regional e nacional, além de reduzir o desmatamento e mitigar emissões. Todos ganham com essa agenda.

Estratégias Empresariais na Bioeconomia Amazônica
Há diferentes tipos de empresas que possuem negócios relacionados com a região amazônica: as empresas que operam no bioma; as exportadoras de produtos da sociobiodiversidade; as multinacionais sujeitas à legislação do país-sede; as empresas de todos os portes com compromissos e metas ESG na região; e as empresas detratoras das prioridades socioambientais.

Essas empresas deveriam ter a bioeconomia amazônica como fio condutor de estratégias competitivas no longo prazo. O bem-estar humano, a geração de renda e empregos intensivos em conhecimento, assim como o investimento em ciência, tecnologia e inovação no uso sustentável da biodiversidade deveriam ser premissas de negócios das indústrias que atuam na região.

Ações Relativas à Governança Corporativa: A responsabilidade dos Conselheiros e Dirigentes
O incentivo ao desenvolvimento de uma postura mais consciente das lideranças empresariais e dos conselheiros de administração sobre as oportunidades de negócios sustentáveis na Amazônia demanda estratégias de engajamento. Todos que operam negócios na Amazônia deveriam conhecer os territórios e comunidades locais. Nesse caso, recomendamos um conjunto de cinco ações prioritárias em relação à governança corporativa:

1. Conhecer a realidade amazônica, seus agentes e seus desafios
Conhecer localmente a Amazônia, suas vocações territoriais e oportunidades são premissas básicas para quaisquer lideranças executivas e conselheiros de administração de empresas que atuam na região. É preciso conhecer o bioma, inserir-se na realidade local e aprender com seus agentes sobre os desafios enfrentados. É muito difícil conhecer e apreender a realidade local e os desafios da região amazônica sem mergulhar nos territórios presencialmente.

2. Engajar especialistas amazônicas com métricas de resultados e impactos
Engajar-se no trabalho das empresas especialistas amazônicas com o conhecimento das métricas de resultados e impactos para a modelagem de negócios da organização. O que a empresa pretende alcançar? Em quanto tempo? Quais são os critérios de priorização dos novos negócios? Em quais territórios? Quais indicadores de acompanhamento, resultado e impacto serão monitorados e reportados periodicamente?

3. Engajar conselheiros(as) com conhecimento e vivência na região Norte
As empresas que estão efetivamente envolvidas na construção de um futuro sustentável para a Amazônia devem ter conselheiros com conhecimento e vivência na região Norte. Esta é a melhor forma de conhecer para apoiar a tomada de decisões e definir os indicadores-chave de desempenho. Uma boa gestão dos riscos e oportunidades de negócios na bioeconomia demanda lideranças e conselheiros com conhecimento e vivência na região.

4. Vincular o bônus dos dirigentes à metas ESG
A remuneração variável baseada em metas ESG é uma ferramenta poderosa de incentivo aos dirigentes de empresas (e alguns conselheiros) para induzir as ações e as estratégias voltadas para a sustentabilidade, que pode ter um vínculo positivo, neutro ou negativo no desempenho sustentável das organizações. O incentivo pode ser vinculado às metas estratégicas e/ou metas de engajamento por meio da proposição de novos projetos. O intuito é assumir o compromisso da direção em cumprir metas socioambientais por meio da política de remuneração.

5. Credenciar conselheiros(as) para a Amazônia
Entendemos que o IBGC pode ser um importante agente catalizador da bioeconomia amazônica, por meio da formação de conselheiros e oferecimento de jornadas técnicas na região. Adicionalmente, considerar a oferta de um programa de credenciamento “Conselheiros para a Amazônia”, com profissionais que possuem as qualificações necessárias para integrar conselhos cada vez mais engajados com a proteção da Amazônia, gerando desenvolvimento socioeconômico e bem-estar para as comunidades locais na agenda de negócios sustentáveis, competitivos e inclusivos.

A proposta destas cinco ações é primordial para apoiar as organizações na construção de visões de futuro sobre as oportunidades na bioeconomia amazônica, com conhecimento e embasamento para que boas decisões sejam tomadas nos negócios. A construção de uma bioeconomia inclusiva demanda humildade, visão de longo prazo e multidisciplinaridade.

A Bioeconomia que queremos
A falsa dicotomia entre preservação e desenvolvimento precisa ser desconstruída na região. O ciclo da destruição da maior e mais biodiversa floresta tropical do mundo pode ser contido. E isso demanda um novo paradigma de negócios que precisa ser construído na Amazônia, a partir da bioeconomia inclusiva, baseada em formas mais sustentáveis de produzir e consumir produtos da sociobiodiversidade. As oportunidades devem emergir de novos modelos de negócios e soluções baseadas na natureza.

As oportunidades estão aí. É preciso construir uma economia próspera como alicerce para combater o desmatamento e repensar o modelo de desenvolvimento da Amazônia que a comunidade almeja, com foco em renda, trabalho e geração de riqueza para o Brasil e o mundo. Conselheiros de administração e executivos são determinantes na condução dessa agenda nas empresas, considerando a bioeconomia como uma oportunidade de negócios.

A Amazônia exige ambição e trabalho de muitas gerações para construir um futuro melhor. O tempo da natureza é medido em bilhões de anos; o tempo das empresas é medido no relatório financeiro do próximo trimestre. Como conciliar essas temporalidades? Esse é o nosso desafio, e o futuro está em nossas mãos. Por mais conselheiros de administração e executivos preparados para fomentar negócios sustentáveis na bioeconomia Amazônica.

Nota: Esse artigo integra o Projeto “Conselheiros pela Amazônia” do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), que nasceu da necessidade da construção de diálogos e debates sobre desenvolvimento sustentável e conservação da Amazônia. Amparado em mesas de discussões temáticas, o IBGC tem como propósito atuar como agente articulador do tema, convidando conselheiros de administração e executivos para a ação em prol da governança climática. O texto é de responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do IBGC. 

Jacques Marcovitch
é professor emérito da Universidade de São Paulo e conselheiro de administração. Dedica-se ao estudo da bioeconomia inclusiva na Amazônia, governança ambiental e climática, métricas nas universidades e pioneirismo empresarial no Brasil. É coordenador do Projeto Bioeconomia Inclusiva na Amazônia (https://bioeconomia.fea.usp.br/).
jmarcovi@usp.br

Vanessa Pinsky
é especialista em Sustentabilidade. Conselheira consultiva, membro externo em comitês ESG de empresas e da Comissão de Sustentabilidade do IBGC. Consultora, palestrante, professora e pesquisadora pós-doutoranda em governança na bioeconomia Amazônica na FEA-USP.
vanessa.pinsky@usp.br


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