Enfoque

RESILIÊNCIA EMPRESARIAL: SUA EMPRESA ESTÁ ESTRUTURADA?

Investidores, empresários e altos executivos desesperam-se ao pensar que possam estar sujeitos a impactos de possíveis “Cisnes Negros”, que em sua grande maioria e, dependendo do tempo de resposta ou das falácias narrativas expostas nas mídias, pode levar a irremediáveis riscos reputacionais. A adequada e preventiva estratégia de gestão de riscos assegura a implementação de planos estratégicos e táticos tanto para mitigar ou reduzir os riscos dessa ocorrência, como para minimizar os impactos de quando eles ocorrerem e, especialmente, se afetarem de forma relevante a sociedade ou o meio ambiente. A estratégia para atuação em casos de ocorrência do evento é um prévio plano robusto e treinado de gerenciamento de riscos.

O tema Cisne Negro é bastante complexo e há diversas interpretações sobre a efetiva existência deste risco. Nassim Taleb traz riqueza de informações e explicações em seu livro “A Lógica do Cisne Negro: o impacto do altamente improvável”. Fatores determinantes para identificá-lo são: i. situações imprevisíveis; ii. impactos profundos; e iii. suscetível a falácias narrativas. Estas por sua vez estão intrinsecamente atreladas aos conceitos da Economia Comportamental, em que tomadas de decisão estão muito mais associadas a emoções do que ao racional. Estas falácias são ancoradas em 3 pontos chaves: trata-se de um argumento, parece ser válido, entretanto, não é válido.

No final do mês de outubro, com o objetivo de discutir sobre a importância de um plano proativo de gerenciamento de crises, estive reunida com mais 2 colegas da Comissão Temática de Finanças e Contabilidade da Board Academy, Altair Braatz e Aloísio do Pinho Oliveira, e com o jornalista Jefferson Douglas da Silva, especialista em comunicação e gerenciamento de crises em umas das afiliadas da Rede Globo no Estado de Santa Catarina que, ano após ano, tem sido vítima de tragédias decorrentes das chuvas e tornados durante o verão.

Ele destacou como a mídia é estruturada e rápida para captura e comunicação de eventos trágicos e desastrosos, sejam por fatores externos e fortuitos ou acarretados por uma imperícia, imprudência ou negligência do setor público ou privado. Portanto, se uma empresa pública ou privada estiver inserida em eventos como este, e não tiver um rápido plano de resposta, ficará por dias na mídia sendo atacada, com impactos ainda maiores em sua imagem e reputação.

Aproveito a oportunidade para trazer a frágil exposição que o setor de varejo está vivenciando desde o início do ano com o Caso Americanas que, há cada momento, demonstra sinais mais claros e irrefutáveis pelos seus números de que foi vítima de uma orquestrada fraude corporativa e práticas antiéticas de seus acionistas majoritários, administradores e altos executivos. E agora, reavivado por notícias recentes envolvendo o Magalu sobre erros de contabilização de bonificações recebidas de alguns de seus fornecedores e, inicialmente, por alguns meses deste ano.

Não fazendo qualquer juízo de valor sobre a existência ou não de práticas antiéticas, gostaria de comentar sobre algumas ações adotadas pelo Magalu relacionadas a um plano estruturado de gerenciamento de crises como parte de sua estratégia de resiliência empresarial, visto que apresentaram:

  • Agilidade na resposta à mensagem do problema veiculada na mídia;
  • Comunicação objetiva, clara e assertiva pelo CFO, reconhecendo o erro na contabilização como decorrência de deficiências de processo e de controles internos; e
  • Postura positiva e proativa demonstrando que já estão realizando mudanças em seu sistema de governança para aprimorar a automatização do respectivo processo e melhora nas atividades de monitoramento.

Fonte: Veja de 17 de novembro de 2023, edição 2868)

Os fatores acima identificados na comunicação pelo Magalu em conjunto com meu conhecimento pregresso e às 8 dicas relevantes em cenários de crise abaixo listadas, apresentadas pelo jornalista Jefferson Douglas da Silva durante nosso fórum de discussão, são os fatores que balizaram a minha opinião sobre a existência da resiliência empresarial no Magalu. Não significa, contudo, que asseguro que, de fato, tudo seja conforme comunicado, visto que não realizei trabalho de investigação e análise.

8 dicas relevantes em cenários de crise

  1. Crises representam ameaça para a vida, finanças, ambiente ou reputação; 
  2. A dúvida não é “se” uma crise vai acontecer, mas “quando”;
  3. Agir sempre com calma e objetividade; 
  4. Tempo é fermento para a crise;
  5. Mantenha a equipe engajada e tenha uma postura positiva; 
  6. Comunicar de maneira clara e assertiva;
  7. Planejamento, antecipação de cenários e pensar em como agir; e 
  8. Estar preparado aumenta a chance de resolução.

Associado à minha experiência corporativa e, como especialista em gerenciamento de riscos, gostaria de adicionar ao item 7 a realização de diversos ensaios e testes de efetividade do plano desenhado.

Além deste exemplo, adiciono os eventos da greve dos caminhoneiros e da pandemia COVID-19 em nosso passado recente, e somente aqueles que possuíam uma adequada frente de gestão de riscos, anteciparam-se e se prepararam para operar em momentos de crise, conseguiram passar ilesos ou pelo menos com menor impacto econômico, financeiro e operacional.

Resiliência Empresarial é chave para riscos reputacionais, relevante para questões regulatórias e operacionais e de extrema importância para oportunidades estratégicas.

Escutei uma vez que tudo na vida é gerenciamento de riscos, desde que nascemos até nossos últimos dias. Tendo a concordar com esta frase e extrapolar para o corporativo. Pense em um risco relacionado a sustentabilidade ambiental, como a escassez de água. Ações para endereçar o risco da escassez geram oportunidades, como iniciativas de redução de gastos, que trazem mais eficiência operacional e melhora o “valuation” das ações da empresa. Essa dinâmica funciona para qualquer outro risco identificado, com foco em oportunidades e não no negativo relacionado a gastos adicionais e burocracias.

Exercer um bom gerenciamento de riscos significa atuar buscando as melhores alternativas de execução visa vis potenciais barreiras que aparecem, como também não se omitir frente a situações possíveis de ocorrerem. Se isto é tão simples e aparentemente tão óbvio, porque a maior parte das empresas não possuem uma frente especializada para atuar nos desafios com demais líderes funcionais na identificação e planos de mitigação, compilação e na criação de uma cultura proativa de resiliência?

A despeito da obviedade, importante destacar a relevância da Resiliência Empresarial na era da incerteza, fragilidades e complexidades marcadas pela pandemia, crescente crise climática, guerra na Ucrânia e outros tantos choques externos vivenciados. E por que não configurados como grandes cisnes negros? Estes temas são debatidos constantemente em todos os fóruns globais existentes. Em 2022, o Fórum Econômico Mundial propôs a criação de um Consórcio da Resiliência, juntando ministros, chefes executivos de algumas corporações globais e líderes de organizações internacionais, tendo como resultado a aceleração de ações coletivas com direcionadores chaves para o impacto econômico global.

A principal meta deste consórcio é criar uma base para que todas as instituições participantes entendam melhor como antecipar, preparar e reagir a futuras rupturas. E para isto baseiam-se em 4 objetivos:

  1. Desenvolver uma metodologia comum de resiliência, tanto para o setor público como privado, para atingir um crescimento sustentável e inclusivo (elementos para uma nova musculatura de resiliência).
  2. Construir entendimento comum e compartilhado dos direcionadores de resiliência e uma agenda priorizada e alinhada com as iniciativas públicas e privadas.
  3. Identificar mais parcerias público-privadas para construir sociedades e economias mais resilientes e tomar ações coletivas para suportar o crescimento inclusivo e sustentável, priorizar investimentos e soluções de escala para mitigação de futuros cisnes negros.
  4. Realizar uma mudança cultural nas organizações e sociedades por meio de lideranças chaves nos setores públicos e privados a fim de que a sociedade se distancie de ações estreitas e focadas somente no curto prazo, para que foquem em ações que criem valor a longo prazo.

No tocante a demais tipologias e relevância da gestão de riscos, gostaria de reforçar a importância de 4 ações simples que, de forma tangencial, nutrem e apoiam o gerenciamento de todo o universo de riscos e protege os negócios.

  • Conduta ética e “compliance” a normas, políticas e regulamentos que existem para trazer equilíbrio e assertividade ao princípio da igualdade, considerando os direitos e deveres de todo e qualquer cidadão ou empresa dentro de suas especificidades.
  • Cultura organizacional com o adequado tom que vem de cima, ou seja, ter práticas consistentes com aquilo que se coloca como valores e comportamentos esperados por todos em uma sociedade ou empresa.
  • Visão questionadora e desafiante ao “status quo” e a possíveis fatores externos, a fim de que não tenham impacto pela omissão ou desconhecimento de uma situação que possa acarretar um risco.
  • Monitoramento periódico dos indicadores e dos objetivos de controle definidos como chaves para seu negócio ou para a sociedade.

Ademais, como sustentabilidade é a palavra-chave em todos os fóruns mundiais, seja no âmbito ambiental, social ou econômico, temos uma evolução da Matriz de Riscos para a Matriz de Materialidade, a qual se apoia em oportunidades para definição das prioridades para a empresa e seus stakeholders, de extrema importância para empresas resilientes, cujos benefícios merecem ser explorados no próximo artigo.

Os pontos discutidos e detalhados nesse artigo mostram a importância de se estabelecer organizações resilientes por meio de uma metodologia e linguagem simples e alcançável.


Regina Biglia
é Conselheira Consultiva, Advisor e Mentora em gestão de negócios, governança corporativa e liderança humanizada. Foi executiva de finanças e controladoria de grandes multinacionais e auditora de uma das Big 4 e atualmente é sócia fundadora da Bigglia Consultoria e Treinamentos com o propósito de conectar mentes e organizações em alta performance. É vice-coordenadora da Comissão Temática de Finanças e Contabilidade da Board Academy, diretora de relacionamentos do W-CFO Brazil e membro do Grupo Mulheres no Conselho e mentora de empoderamento feminino na rede Angel.Us.
regina.biglia@gmail.com


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