Voz do Mercado

FINANÇAS SUSTENTÁVEIS: O FUTURO É VERDE E DIGITAL!

Os modelos econômicos tradicionais foram desenvolvidos em épocas de abundância de recursos. Épocas nas quais as questões de sustentabilidade estavam colocadas à margem das priorizações e apenas a geração do lucro e a maximização do capital investido eram prestigiadas e valorizadas.

Nos referimos a períodos em que a teoria financeira não atribuía valor aos aspectos ambientais, sociais e de governança (ASG). Da mesma forma, pautas globais relevantes, como o controle de mudanças climáticas, a preservação ambiental e a necessidade de valorização da agenda sustentável no contexto das decisões de investimento e, consequentemente, na alocação de recursos financeiros, não eram, devidamente, apreciadas e valorizadas.

O mundo evoluiu e essas temáticas, antes presentes apenas em debates ambientalistas, foram ressignificadas e adequadas a novos contextos. A lucidez quanto à premência de observância de cuidados para evitar a escassez de recursos naturais, bem como controlar mudanças climáticas e impedir o aquecimento global, trouxeram novas percepções acerca da indispensabilidade de conciliação da sustentabilidade com os preceitos tradicionais das finanças no ambiente de negócios.

Cientes deste cenário, os investidores passaram a considerar não apenas os retornos financeiros. Os impactos ambientais, sociais e de governança das empresas em que investem, inclusive, por conta da necessidade de preservação dos recursos para as gerações futuras, estão cada vez mais em foco, tanto em nível nacional quanto internacional.

No Brasil e no mundo, há o reconhecimento da importância de pautas em prol da transição e da mitigação das emissões de carbono, da mesma forma em que há valorização da economia circular. Neste âmbito, o sistema financeiro é capaz de desempenhar um importante papel, com a distribuição de capital para sua aplicação mais eficiente. A primordialidade de conciliar a sustentabilidade com as finanças tem se mostrado cada vez mais clara e imediata. Com isso, perspectivas positivas começam a surgir para o Brasil.

A demanda por investimentos responsáveis e alinhados com critérios de sustentabilidade ganha força, já que a análise de riscos relacionados a questões ASG tornou-se parte importante das decisões de investimento. Assim, empresas que demonstram (e comprovam!) boas práticas nessas áreas podem ser mais atraentes para os investidores e o Brasil tem condições de ser um dos grandes protagonistas mundiais nesta seara.

Estamos, agora, em uma transição para economia de baixo carbono e mais circular. Nesta esteira, as Organizações das Nações Unidas (ONU) elaboraram a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável de maneira a orientar a transformação em direção ao que é considerado uma economia inclusiva e plural. Mas, afinal, por que as finanças deveriam contribuir para o Desenvolvimento Sustentável?

Elas têm o potencial de desempenhar papel proeminente na distribuição de investimentos para empresas e iniciativas ambientalmente conscientes, acelerando a transição para um modelo econômico mais verde e sustentável. E, sim, podemos afirmar: as Finanças Sustentáveis trazem consigo muitas oportunidades!

Atenta a este cenário, a CVM assinou, em agosto de 2022, junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), acordo de cooperação técnica com objetivo de estimular Inovação Financeira e Finanças Sustentáveis. De maneira a fomentar o diálogo franco e aberto com a sociedade, a CVM esteve presente, em dezembro do mesmo ano, na 1ª Conferência Internacional de Finanças Sustentáveis e Economia Criativa da Amazônia e prepara-se para, em 2024, retornar à Amazônia para a 2ª conferência nesta seara. A Autarquia tem apresentado as Finanças Sustentáveis e a Economia Verde como prioridades, percebendo as tendências e as janelas de oportunidade que se apresentam para o Brasil e para os agentes econômicos do nosso país neste ambiente de negócios.

Por falar em tendências, em 2023, a CVM deu novos e consistentes passos ao publicar sua Política de Finanças Sustentáveis e seu Plano de Ação de Finanças Sustentáveis. Nos documentos, a Autarquia buscou auxiliar no fortalecimento das atribuições, consolidação e organização dos trabalhos de Finanças Sustentáveis do regulador, bem como aprimorar a divulgação e a comunicação dos resultados das atividades.

Especificamente no Plano de Ação, a CVM apresentou 17 iniciativas para desenvolver no biênio 2023-2024. A primeira entrega do Plano – a Resolução CVM 193 – foi um marco em nível internacional. Por meio da regra, a Autarquia estimulou, de forma voluntária, para companhias abertas, fundos de investimento e companhias securitizadoras, a elaboração e divulgação de relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade com base no padrão internacional (IFRS S1 e S2) emitido pelo International Sustainability Standards Board (ISSB). Com isso, o Brasil foi o primeiro país do mundo a adotar relatórios com esta padronização.

Ativa e constantemente, a CVM tem trabalhado para aprimorar o arcabouço existente e desenvolver, de maneira pouco invasiva, normas que incentivem a adoção de práticas sustentáveis no Mercado de Capitais brasileiro. Isso inclui o fomento à emissão de títulos verdes e a consideração de critérios ASG nas decisões de investimento.

Por exemplo, a Resolução CVM 59 inovou ao indicar a importância da disponibilização de informações sobre critérios ASG nos Formulários de Referência, além de justificativas, por meio do modelo “pratique ou explique” sobre a adoção de ações neste sentido. Já na Resolução CVM 175, a CVM reconheceu a possibilidade de os fundos investirem em ativos ambientais como ativos financeiros e trouxe recomendações em relação ao uso de terminologias “ASG” e “Verde”, a fim de evitar o greewashing.

A relação entre Finanças Sustentáveis e o Mercado de Capitais envolve a busca por investimentos alinhados à criação de instrumentos financeiros específicos para projetos sustentáveis e à influência dos investidores nas práticas e nos conteúdos disponibilizados pelas companhias e demais emissores. Essa relação contribui para a promoção de uma economia mais responsável. Também contribui para reforçar que o “futuro é verde e digital”.

Neste momento de construção coletiva e valorização da pauta global da sustentabilidade no Mercado de Capitais, a CVM e os principais reguladores dos Mercados de Capitais do mundo estão cientes da necessidade de construção de uma linguagem global. Em nossa próxima coluna aqui na Revista RI, apresentaremos para os leitores deste tradicional veículo do Mercado de Capitais do Brasil, os Building Blocks que estão sendo construídos como pilares para solidificar as Finanças Sustentáveis. Pilares estes que têm como base os conceitos da Taxonomia Sustentável, seguidos pelas regras de Reporting (divulgação de informações dentro do regime informacional) e arrematados pelas regras de Assurance (referentes à asseguração das informações prestadas no regime informacional, a fim de evitar o greenwashing).

Vem coisa boa por aí...!

João Pedro Nascimento
é presidente da Comissão de Valores Mobiliários - CVM.
joao.pedro@cvm.gov.br


Continua...