Pioneirismo brasileiro e construção de mercado global integrado, por meio de Building Blocks internacionais
Na edição de fevereiro de 2024 da coluna Voz do Mercado, aqui, na Revista RI, tivemos a oportunidade de apresentar algumas medidas que vêm sendo adotadas pela CVM para a inserção gradual e responsável da temática das Finanças Sustentáveis no Mercado de Capitais do Brasil. Trata-se de pauta global e de reconhecida relevância, capaz de atrair investimentos, oportunidades e auxiliar na promoção do crescimento econômico e social do nosso país, mas que demanda abordagem técnica, seguindo parâmetros internacionais, a fim de garantir a construção de um ambiente mundial integrado e comparável.
Podemos afirmar: há caminhos progressivos para a organização e integração de um mercado global nas Finanças Sustentáveis. Não à toa, este é um dos principais e mais recorrentes tópicos de discussão em fóruns internacionais de standard-setters como são, por exemplo, a IOSCO (Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários) e a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
No âmbito desses fóruns de discussão, há consenso no sentido de que precisamos criar meios mundiais para facilitar a alocação eficiente de recursos entre agentes econômicos de diferentes países, independentemente de onde eles estejam territorialmente localizados. Esse movimento pode, inclusive, auxiliar o Brasil a atrair recursos e bons negócios, desde que estejamos integrados e fazendo parte deste ambiente global comparável e, minimamente, padronizado.
É sempre bom lembrar que, especialmente no Mercado de Capitais, a busca por divulgações padronizadas, está alinhada a objetivos como transparência, comparabilidade e responsabilidade. A transparência promove confiança e oportuniza às partes interessadas a tomarem decisões informadas com base em conteúdos consistentes e claros. A padronização faz com que investidores e demais interessados avaliem e comparem o desempenho, práticas e impacto entre diferentes participantes de maneira eficaz. Já a responsabilidade, que está diretamente ligada à governança, evita penalidades, promove a conformidade, facilita a comunicação de práticas éticas, responsáveis e sustentáveis e auxilia na reputação positiva dos participantes.
Com foco na criação de ecossistemas financeiros sustentáveis em nível global, dois são os conceitos relevantes e que merecem atenção: interoperabilidade e a rastreabilidade. O primeiro termo refere-se à capacidade de sistemas e instituições trabalharem juntos, de maneira eficiente e coordenada, com integração de práticas e critérios de sustentabilidade. Já a rastreabilidade está ligada à capacidade de as instituições integrarem práticas sustentáveis no seu dia a dia, como relatórios transparentes sobre investimentos verdes, monitoramento de riscos Ambientais, Sociais e de Governança (ASG) e adaptação a regulamentações, que possam ser rastreados e cuja execução possa ser acompanhada pelos investidores.
Nós temos afirmado e reafirmado, em inúmeras oportunidades, que o Brasil tem todas as condições para ser líder mundial nas Finanças Sustentáveis. Há razões ambientais para esta liderança como, por exemplo, as dimensões e proporções continentais do território nacional; a existência de biomas com vegetação nativa preservada, com destaque à Amazônia, ao Pantanal e à Mata Atlântica; e o uso predominante de matrizes energéticas limpas e renováveis em nosso país.
Há, ainda, diversas razões econômicas. A começar, o fato de o Brasil ser credor e será potencial exportador de créditos de carbono dentro da lógica do Acordo de Paris. Adicionalmente, tendo em vista a publicação da Resolução CVM 193, somos o primeiro país do mundo a adotar regras de reporte de sustentabilidade e mudanças climáticas (IFRS S1 e S2). Além disso, o Brasil está na vanguarda mundial na integração de oportunidades de investimento na economia verde, por meio da indústria de Fundos de Investimento, conforme modernização recente da Resolução CVM 175.
Cabe destacar, também, inúmeras outras iniciativas construídas e em desenvolvimento pela CVM nesta pauta, como se observa no Plano de Ação de Finanças Sustentáveis da Autarquia para 2023-2024, disponível para consulta por meio do QR Code ao final deste artigo.
Por falar em construção, a expressão Building Blocks, no ambiente internacional, tem sido utilizada para ilustrar a elaboração deste ecossistema interoperável e rastreável integrado, a partir de componentes essenciais que pavimentam a pauta global de práticas financeiras sustentáveis. Os Building Blocks são, essencialmente, três:
Voltando ao cenário nacional, é perceptível que o Brasil vem dando passos relevantes e consistentes em cada um dos Building Blocks. A Taxonomia Sustentável Brasileira, cuja concepção e construção coletiva é organizada pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, tem sido elogiada internacionalmente pela qualidade e pelo aspecto cuidadoso com a agenda social. Na temática do Reporting, as Resoluções CVM 59 e 193 nos colocam em posição de vanguarda e destaque, mostrando para o mundo que estamos, sim, dispostos a fazer a diferença. Agora, estamos atentos às regras de Assurance. Neste contexto, temos mantido atuação integrada com o International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB), órgão internacional de padronização de normas independente, que emite diretrizes, como as Normas Internacionais de Auditoria.
O Brasil sinalizou para o mundo, diversas vezes, que seria o país do futuro. Neste momento, nova sinalização é feita, mas com uma grande diferença: o futuro chegou. Nosso país demonstra aos demais que é possível construir um mercado global nas Finanças Sustentáveis. Um mercado global com aspectos comparáveis e funcionais. Além disso, o Brasil comprova possuir um ambiente de negócios convidativo, que integra fatores econômicos e sociais, de maneira a auxiliar na promoção do crescimento responsável, com geração de emprego, renda e oportunidades de negócio. Comprova, inclusive, possuir um Mercado de Capitais eficiente, seguro e cada vez mais promissor.
Plano de Ação de Finanças Sustentáveis da Autarquia para 2023-2024.
João Pedro Nascimento
é presidente da Comissão de Valores Mobiliários - CVM.
joao.pedro@cvm.gov.br