IBGC Comunica

GOVERNANÇA NAS ESTATAIS

ALERTA SOBRE EVENTUAIS MUDANÇAS DE PRESIDENTES NAS EMPRESAS ESTATAIS CONTRÁRIAS ÀS MELHORES PRÁTICAS DE GOVERNANÇA CORPORATIVA

Às vésperas das trocas oficiais de governo nos planos federal e estadual, é com apreensão que o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) assiste a declarações de representantes de partidos políticos e governantes eleitos sobre a substituição de diretores-presidentes e membros das diretorias de empresas estatais.

A preocupação é maior quando as mudanças planejadas se referem a Sociedades de Economia Mista (SEMs) listadas em bolsa de valores, que têm, além do Estado, acionistas privados, ou seja, investidores institucionais e cidadãos comuns. Nessas situações, a observância de boas práticas de governança corporativa se torna mais relevante para garantir que todo o conjunto de investidores e demais partes interessadas, não só o acionista controlador – no caso, o Estado –, seja beneficiado pelo desempenho da organização.

Em uma sociedade de economia mista, como em toda sociedade por ações, o conselho de administração é o órgão responsável por selecionar os membros da diretoria, incluindo o diretor-presidente. O inciso II do artigo 142 da Lei das S.A. (Lei 6.404/1976) atribui a seguinte competência ao conselho de administração: “eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições, observado o que a respeito dispuser o estatuto”. O artigo 139 da mesma lei ainda reza que: “As atribuições e poderes conferidos por lei aos órgãos de administração não podem ser outorgados a outro órgão, criado por lei ou pelo estatuto.”

A seleção, a avaliação e eventualmente a substituição de executivos-chave pelo conselho são práticas consagradas internacionalmente. Estão nos Princípios de Governança Corporativa do G20/OCDE (2015), documento que é referência sobre o tema e do qual o Brasil é signatário. Essa premissa não vale somente para o setor privado. Os Princípios de Governança Corporativa de Empresas Estatais da OCDE estabelecem que o conselho deve ter o poder de apontar e remover o(a) diretor(a)-presidente.

O Banco Mundial indica que controle operacional e estratégico diretamente pelo governo, e não pelo conselho, pode conduzir a resultados indesejáveis. “Intervenção governamental dilui a autoridade e mina a prestação de contas (accountability) do conselho de administração, e abre portas para interferência política e a falta de foco em desempenho. Também pode levar a conselheiros menos motivados e engajados e abrir espaço para que a administração persiga objetivos conflitantes”, afirma a instituição financeira global no documento Corporate Governance of State-Owned Enterprises: A Toolkit (2014).

As trocas de cargos das SEMs diretamente pelo Poder Executivo, se concretizadas, reforçarão a percepção de risco de retrocesso na Lei das Estatais (Lei 13.303/2016), que se elevou neste ano com tentativas do Congresso Nacional e alguns grupos de anular seus principais avanços.

A sociedade civil brasileira não tolera descartar as lições sobre riscos de corrupção em empresas estatais. A Lei das Estatais (Lei 13.303/2016), com todos seus mecanismos para inibir ingerência político-partidárias, não é uma mera formalidade ou simples carta de intenções. É Lei e, portanto, reflete a vontade de nossa sociedade em retomar padrões de integridade elevados na administração das SEMs.

O IBGC tem acompanhado esse assunto mais atentamente desde 2015, quando, à luz do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa e da vasta literatura internacional sobre governança de sociedades de economia mista, publicou três documentos: Carta de Opinião nº 3 – Governança de Sociedades de Economia Mista (fevereiro de 2015); Carta-Diretriz nº 5 – Sociedades de Economia Mista (junho de 2015); e Caderno 14 – Boas Práticas de Governança Corporativa para Sociedades de Economia Mista (dezembro de 2015).

Em todos eles, fica claro que, para cumprir sua missão, o conselho de administração deve selecionar, avaliar, fiscalizar e destituir membros da diretoria de forma independente e protegida de interesses político-partidários.
Sem protagonismo nesse processo e sem o uso de critérios exclusivamente profissionais, visando atender o melhor interesse da empresa, o conselho perde eficácia, deixando de exercer o papel de zelar pelo sistema de governança e pela qualidade da gestão.

O IBGC urge aos governantes eleitos que respeitem as enormes conquistas dos últimos anos das SEMs na implementação das melhores práticas de governança corporativa. São inúmeras políticas e processos elaborados, instalados e amadurecidos a duras penas, visando exatamente coibir a interferência político-partidária que solapou estatais, desvirtuando seu propósito e abalando a credibilidade do mercado brasileiro de capitais. Se os novos governantes interferirem diretamente na gestão das SEMs, desrespeitando a autonomia dos conselhos de administração, teremos a volta da influência político-partidária que ameaçou a sobrevivência das estatais.

A boa governança das estatais só será efetivamente praticada quando líderes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, nos âmbitos federal, estadual e municipal, demonstrarem comprometimento verdadeiro com o sentido real e a essência das recomendações e obrigações legais.

 (*) O IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) publica periodicamente na Revista RI - artigos a respeito de posições importantes para o Instituto.
comunicacao@ibgc.org.br


Continua...