Luiz Guilherme Dias, incansável defensor do mercado acionário, nos brinda com mais uma importante contribuição a favor do investimento em Bolsa.
Nos meus longos anos de convivência, ligados direta ou indiretamente ao mercado de ações, sou testemunha das dificuldades sempre enfrentadas para popularizar o investimento nos títulos de renda variável.
Quando comecei na Deltec, empresa pioneira no segmento de mercado de ações, tínhamos mais de 300 profissionais de norte a sul do Brasil, vendendo ações de porta em porta, o que hoje chamamos de IPOs. Vale destacar o lançamento da Willys, Cia Brasileira de Energia Elétrica, Força e Luz de Minas Gerais, Listas Telefônicas, Cimento Aratu, Cia Paulista de Força e Luz, para citar algumas.
Na época fui encarregado de fazer o treinamento de seus vendedores. A Deltec defendia o princípio de que ações são vendidas e não compradas, e, portanto, é necessário fazer um esforço para transmitir o conhecimento sobre o que significa investir em título de renda variável, com os possíveis benefícios e riscos envolvidos.
Durante o treinamento da equipe de vendas enfatizava a liquidez pela negociação em Bolsa e que também permitia uma avaliação periódica do investimento realizado. Os poupadores à época tinham nítida preferência por aplicações imobiliárias e não existiam bancos de investimento. Os bancos comerciais não remuneravam seus aplicadores, pois os depósitos a prazo não podiam ser superiores aos 12% a.a. estabelecidos pela Lei da Usura.
Essa cultura era bem diferente dos anglo-saxões que sempre tiveram carteiras bem mais diversificadas onde a renda variável sempre ocupava posição de destaque.
Com a criação das Letras de Câmbio, a partir de 1961, oferecidas com deságio e uma renda prevista, tornaram-se assim um forte incentivo para os aplicadores e vieram a ocupar posição de destaque nas aplicações e seus similares posteriores como o CDB, Letras Imobiliárias, Títulos de Dívida Agrária. Nos últimos 30 anos os Títulos do Governo, esses papéis passaram a ocupar papel relevante nos portfólios, pois ofereciam um trinômio que seduzia os investidores: garantia, liquidez e rentabilidade. Indexados à inflação pelas taxas definidas pelo Comitê de Política Monetária – COPOM, eram fáceis de vender a investidores nacionais e estrangeiros.
O mesmo aconteceu com o aparecimento das cadernetas de poupança criadas pela Caixa Econômica Federal em 1861 que teriam por fim receber os juros de 6% as pequenas economias das classes mais abastecidas e de assegurar sob garantia total a fiel restituição dos que pertenciam a cada contribuinte.
A mudança mais significativa foi introduzida pela Lei 4380 de 1964 que instituiu a correção monetária para aquelas aplicações. Desde então, passaram a ocupar papel preponderante na escolha de diferentes segmentos, particularmente daqueles poupadores de menor renda. A Caderneta de Poupança era um instrumento de aplicação que não exigia grande esforço de venda e foi importante mecanismo para o financiamento imobiliário.
Desses meus muitos anos de vivência tivemos momentos em que houve um aumento espetacular das aplicações em ações, e que aconteceu em diferentes circunstâncias. A mais lembrada foi a crise de 1971/1976 que coincidiu com a fase do grande crescimento de nossa economia (o chamado “milagre brasileiro”) com legislação incentivadora e também com profissionais dedicados ao mercado de ações, mas sem os necessários preparo para que o investidor pudesse fazer uma avaliação do risco. Outra fase foi o que aconteceu com o ‘crash’ as Lehman Brothers em 2008, com impacto mundial e que interrompeu um ciclo de novas ofertas de ações que foram estimuladas pela criação do Novo Mercado.
Mais recentemente com a redução dramática da taxa de juros que chegou a 2% a.a. houve novamente uma forte modificação na estrutura do mercado, pois os aplicadores insatisfeitos com a rentabilidade dos títulos tradicionais ligados a correção monetária, buscaram alternativas para sua aplicação e proporcionaram um “boom” com novos lançamentos de ações que, infelizmente, teve vida curta e como sequela deixou muitas dívidas pelo caminho quando as taxas de juros voltaram a 13,7%, antes da progressiva redução que estamos vivenciando.
Portanto, em síntese, nosso mercado é ciclotímico pois passa de pessimismo a euforia em um curto espaço de tempo.
Esse fator tem um duplo efeito. Do lado dos aplicadores, quando as condições se alteram, às vezes há uma busca desenfreada pelo mercado acionário. Por outro lado, em seu planejamento as empresas não podem contar com a busca de capitais via Bolsa, somente o fazem quando se abre uma janela. O último ano foi de grande secura para os IPOs.
Assim, pelo histórico vivido nesses mais de 50 anos ligados ao mercado, é fundamental que os investidores tenham a perfeita noção de risco quando agregam ações ao seu portfólio.
Certamente, o bom senso indica que numa carteira de porte razoável, o investidor não deve ter medo de investir na Bolsa.
Seja comedido e nunca faça aplicações de recursos em Bolsa contando com os ganhos futuros. Caso precise de liquidez para compromissos futuros, somente arrisque montantes que não precisará dispor dentro de um prazo pré-determinado.
Investidores que seguem essa política e fazem escolhas certas, não buscando resultados de curto prazo, não se arrependerem.
Por que este livro foi escrito?
Este livro foi escrito por várias razões. Dentre as quais, destaca-se o dilema da cultura de baixo risco existente em nosso país. Ninguém, muito menos eu, é contra o baixo risco. Mas, por influência cultural, o risco é entendido como um inimigo, um adversário, e, como tal, deve ser combatido e eliminado.
Para ter o risco como um aliado é preciso conhecê-lo e gerenciá-lo. E aceitar o fato de que aplicações de renda fixa, como Caderneta de Poupança, Tesouro Direto, CDB etc., oferecem o desejado baixo risco, que serve, quando muito, para proteger o capital contra a inflação. Será que é isso que buscamos?
“Sem medo de investir na Bolsa” tem o objetivo de mostrar que risco não é inimigo, que bolsa não é cassino e que ações de empresas com governança responsável e fundamentos
sólidos são o melhor investimento para quem quer ganhar dinheiro de verdade.
Ao mesmo tempo, o livro tem a intenção de questionar os motivos pelos quais somos, há tempos, o “país do futuro”: um país que tem “medo” de dar certo e de ter uma riqueza compatível com o seu potencial e extensão territorial, e um povo que sabe “se virar nos trinta”. Fica a indagação: será que somos o “país do futuro do pretérito”? - Luiz Guilherme Dias, o autor
Nota: O livro “Sem Medo de Investir na Bolsa: Quem Sabe Investe Melhor”, de Luiz Guilherme Dias (IMF Editora, 2024 - 112 páginas), será lançado dia 24/04/2024, e já está disponível para venda na Amazon.com.br - no formato digital “Kindle”, ao custo de R$ 14,90.
Roberto Teixeira da Costa
Economista, foi o primeiro presidente da CVM - Comissão de Valores Mobiliários, e é conselheiro emérito e fundador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI).
teixeiradacostaroberto@gmail.com