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Indubitavelmente, o cenário segue bastante desafiador para o mercado acionário brasileiro. A inflação resistente e a trajetória de alta da Selic, com a possibilidade de ganhos consistentes na renda fixa, reduzem a atratividade do mercado de ações. A preocupação fiscal do país é o principal fator que tem feito os juros futuros empinarem. O pacote de corte de gastos anunciado pelo governo, embora com alguns pontos positivos, teve muitos ruídos em sua comunicação e ficou aquém das expectativas dos agentes de mercado, pois faltaram mudanças estruturantes para equilibrar as contas públicas.
O ano de 2024 teve queda de 10,36% do Ibovespa, seguiu inóspito para IPOs – uma ausência de novas aberturas de capital desde setembro de 2021. Hoje, a fila de IPOs na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está zerada, isto é, não há nenhuma companhia interessada com prospecto registrado para análise.
A fuga de recursos de investidores estrangeiros da Bolsa brasileira resultou em um saldo negativo de R$ 24,2 bilhões no ano passado. “Obviamente, a bolsa acaba sendo um termômetro da confiança que os investidores internacionais e domésticos têm em relação à economia”, diz Einar Rivero, CEO da Elos Ayta, consultoria de dados financeiros, ressaltando que também devem ser considerados aspectos do contexto externo para esse movimento.
Segundo ele, a liquidez do mercado à vista da B3 atingiu baixos níveis em 2024. O volume médio diário foi de R$ 18,8 bilhões, o menor patamar em reais desde 2019, e de US$ 3,5 bi, o menor na moeda americana desde 2018.
Volume financeiro diário médio a cada ano do mercado à vista em R$ Milhões/dia
Fonte: Elos Ayta
Observando o Ibovespa, dos 250 pregões realizados no ano passado, somente 123 tiveram retornos positivos ou uma fatia de 49,2%, menor proporção desde 2015, de acordo com outro levantamento feito pela consultoria.
Percentual de pregões negativos em cada ano – Ibovespa
Fonte: Elos Ayta
Enquanto o mercado de ações enfrenta dificuldades, os juros elevados favorecem o mercado de renda fixa. Para se ter uma ideia, o volume de emissões públicas de títulos de dívida corporativa na B3 cresceu 76% no ano passado, atingindo R$ 608,1 bilhões. Dentro dessa marca inédita, o grande destaque foram as debêntures, com avanço de 107% nas emissões, totalizando R$ 465,8 bilhões. Outros ativos também ganharam força: Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), com alta de 20% nas emissões, e notas comerciais, com aumento de 58% nos títulos emitidos.
Rotas viáveis
Em que pesem as dificuldades do mercado de ações diante de aspectos macro que precisam ser endereçados, diversas medidas foram lançadas recentemente ou seguem em andamento para seu fortalecimento. Há ainda novidades em relação à atuação de novas bolsas.
Tendo em vista a importância do mercado acionário para o desenvolvimento do país, a Revista RI entrevistou especialistas sobre iniciativas em curso e a construção de uma agenda propositiva para remar contra a maré, aspectos que beneficiem emissores e investidores. Além disso, os preços são cíclicos e o bear market não é para sempre.
Ambiente regulatório
A normatização do FÁCIL (Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivo a Listagens) é uma das prioridades da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 2025. Trata-se de um ambiente regulatório voltado especificamente para companhias de menor porte, com processos simplificados e menos exigências. O objetivo é incentivar o uso do mercado de capitais para captação de recursos por empresas com até R$ 40 milhões de faturamento bruto e que desejam realizar ofertas públicas de até R$ 15 milhões. “Com o FÁCIL, pretendemos incluir novas companhias e estimular ofertas públicas de ativos mobiliários, democratizando o mercado de capitais”, afirma João Pedro Nascimento, presidente da CVM.
Segundo ele, cerca de 40 especialistas e associações representativas do mercado participaram da consulta pública, que ficou aberta entre setembro e dezembro do ano passado, e deram suas contribuições e sugestões para a proposta da autarquia. A área técnica da CVM já está analisando os comentários recebidos, sendo que a edição das regras ainda não tem prazo definido, mas ocorrerá ao longo do ano.
Na visão de Marcelo Korber, CEO da Prisma, empresa que faz parte do ecossistema da REAG e desenvolve soluções para o mercado de RI, essa flexibilização que será instituída pela CVM no mercado é bem-vinda. “As iniciativas de facilitação de documentação são positivas, mas precisam levar realmente à redução dos custos de observância, que hoje são elevados e inibem as empresas menores. Da forma que a CVM tem tratado essa questão agora, esperamos que dê certo”, diz.
Ele destaca que o Bovespa Mais, segmento de listagem da B3 para fomentar o crescimento de pequenas e médias empresas não andou como se esperava, apesar de reunir alguns cases expressivos, porém, a nova regra da CVM poderá dar novo impulso quando houver abertura de uma janela adiante, com melhoria das condições macro.
Somado a esse avanço em curso para companhias de menor porte, Paulo Henrique Praes, sócio-diretor da globalRI, consultoria de relações com investidores, avalia que a revisão do regulamento do Novo Mercado, segmento de companhias abertas com níveis mais rígidos de governança corporativa, também é essencial. Esse processo de aperfeiçoamento está em andamento na B3. “O Novo Mercado trouxe proteções, garantias e avanços importantes. Por outro lado, elevou demais os custos das empresas, um dos motivos pelos quais a gente acredita que algumas decidiram se listar em outros mercados, como a Nasdaq, por exemplo”, avalia.
Algumas atualizações significativas foram anunciadas ao longo do ano passado. Merece atenção a Resolução CVM 225 publicada em dezembro, que estabelece em caráter experimental o Cadastro de Acesso de Investidores. A nova regra permite que pessoas físicas – com nacionalidade brasileira e residentes no país – realizem o cadastro com intermediários de valores mobiliários de forma menos burocrática, sem fragilizar controles necessários para combate às fraudes, prevenção à lavagem de dinheiro e às atividades ilícitas. “Desse modo, promovemos um ambiente ainda mais acessível para novos investidores, com abordagem regulatória proporcional, sem abrir mão da segurança jurídica e da integridade”, afirma João Pedro Nascimento.
O Cadastro de Acesso pode ser aplicado para investidores pessoas físicas que tenham patrimônio de até R$ 30 mil junto ao intermediário. Além de mais enxuto, o investidor ficará isento do preenchimento do suitability, devendo ser enquadrado no perfil mais conservador. Caso o valor supere esse limite, o intermediário precisará solicitar informações complementares, como previsto na Resolução CVM 50.
Já as regras para portabilidade de investimentos (Resoluções CVM 210 e 209), editadas em agosto de 2024, consistem em avanços do Open Capital Market e deverão entrar em vigor em 1 de julho de 2025. Entre os principais pontos, a criação de interface digital para a solicitação da portabilidade, dispensando o preenchimento de formulários físicos ou o reconhecimento de assinaturas em cartório; a possibilidade de os investidores escolherem o ponto de solicitação – na origem, no destino ou junto ao depositário central - e caracterização como infração nos casos de descumprimento sistemático de prazos ou de represamento injustificado da portabilidade. “As regras de portabilidade contribuem para o empoderamento dos investidores e modernização do ecossistema do mercado”, destaca o presidente da CVM. De acordo com Nascimento, a expectativa é fomentar o ambiente de competição pela simplificação e desburocratização das regras de transferência de custódia.
Educação e foco no longo prazo
Além da modernização regulatória em prol do desenvolvimento do mercado, o economista Roberto Teixeira da Costa, que foi o primeiro presidente da CVM, defende mais educação para os investidores. “Manter um percentual da carteira de investimentos em ações faz sentido, pois existem boas opções”, ressalta. Para ele, é preciso reforçar nos investidores a visão de longo prazo, no qual as ações de boas empresas tendem a superar a renda fixa.
Luiz Barsi Neto, sócio da Barsi Investimentos, filho de Luiz Barsi Filho – conhecido como o Rei dos Dividendos e maior investidor pessoa física da B3 –, comenta que apesar do Ibovespa não estar apresentando bom desempenho no curto prazo, há oportunidades. Ele se refere a empresas bem geridas e consolidadas com ações descontadas, isto é, preços de mercado menores do que seus valores patrimoniais, e capacidade de geração de receita e lucro mesmo em cenário de adversidades.
“Pensando em diversificação e para quem pretende ter renda passiva, há diversas oportunidades de compra. Afinal, os dividendos são pagos de acordo com a quantidade de ações possuídas”, destaca. Conforme ele, ao priorizar os dividendos, é válido selecionar ações de bancos, seguradoras, empresas de saneamento e de energia, analisando criteriosamente caso a caso. “A chance de dar errado é muito pequena para quem tiver esses grupos de ações na carteira. Por exemplo, para os grandes bancos, não existe crise, pois com juros altos ou baixos, eles vão ganhar dinheiro”, diz. Ele conta que é desse modo que ele tem argumentado com incrédulos que dizem que ‘a bolsa brasileira está barata desde sempre’.
Hoje, o Ibovespa negocia a índice Preço/Lucro de 8 vezes, abaixo da média histórica de 11 vezes.
Histórico P/L Bovespa
Fonte: Oceans14
Com educação financeira, segundo especialistas, é possível criar espaços para mais investimentos, beneficiando brasileiros que atualmente precisam se organizar o orçamento e lutam para pagar suas contas.
“É fundamental que a população entenda como o mercado acionário funciona e como pode ser uma alternativa para o crescimento patrimonial. No entanto, é preciso ir além do simples apelo ao investimento e ensinar a alocação de capital inteligente desde a base escolar até a universidade”, defende André Vasconcellos, diretor de Estratégia, Planejamento e Relações com Investidores da Fictor Alimentos (FICT3) e vice-presidente do Conselho de Administração do IBRI (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores).
Nesse processo educativo, pode haver campanhas abrangentes com linguagem simples e objetiva. “Falta uma campanha ampla no mercado sobre o que é renda variável e os benefícios de investir nessa classe de ativos. No passado, deu certo a campanha “Rumo a um milhão”, acrescenta Paulo Praes, da globalRI.
A iniciativa “Rumo a um milhão”, lançada em 2009 pela BM&F Bovespa, visava a democratização de acesso ao mercado de capitais. Vale lembrar que outra campanha de grande repercussão também durante a gestão de Edemir Pinto na bolsa foi “Quer ser sócio?”, estrelada pelo Pelé, em 2011. Evidentemente, muita coisa mudou de lá para cá. Antes a ênfase era em veículos de massa, ou seja, rádio e TV e, hoje, as redes sociais e o streaming têm grande força.
Atualmente, existe ainda o desafio em relação ao crescimento rápido do mercado de apostas online, as bets, que não podem ser consideradas investimentos e, sem a conscientização adequada, vem causando endividamento e problemas de saúde mental em famílias. “Podemos dizer que o mercado de capitais ganhou mais um ‘concorrente’. As apostas esportivas e joguinhos estão levando o dinheiro das pessoas que poderiam estar sendo direcionados aos investimentos e contribuir para melhorar a atividade econômica”, comenta Praes. Uma medida interessante, conforme ele, foi do Nubank. Quando o correntista vai transferir dinheiro para sites de apostas, aparece uma mensagem perguntando se ele não prefere investir o dinheiro: “Que tal guardar esse dinheiro?”.
Quando a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) apresentou, em meados do ano passado, o resultado surpreendente de uma pesquisa mostrando que 14% dos brasileiros são usuários de plataformas bets, realizando apostas, contra somente 2% da população investindo na bolsa, o presidente da CVM João Pedro Nascimento chegou a fazer um artigo especial para a Revista RI. Ele enfatizou o poder transformacional da educação para evitar distorções e diminuir as desigualdades. “Reforço aqui: o mercado de apostas não deve ser comparável ao mercado de capitais, mas, sim, aos cassinos, às loterias e outros similares ambientes de entretenimento. Jogos desde que regulares – devem ser encarados e reconhecidos como jogos, não como investimentos.”
Iniciativas educacionais da B3
Leonardo Resende, superintendente de Relacionamento de Empresas e Estruturadores de Ofertas da B3, destaca que a abordagem é sempre muito cuidadosa com o investidor pessoa física. “Olhamos muito sob o ângulo de educação financeira, geramos conteúdo e apoiamos produtores de conteúdo que ajudem os indivíduos brasileiros a investirem melhor”, comenta.
Por exemplo, na iniciativa B3 Educação é feita curadoria de conteúdo produzido por especialistas, agentes e associações de mercado, reguladores, influenciadores de finanças pessoais, bem como escolas e universidades, que são agregados em uma área do portal. Além disso, é possível acessar cursos gratuitos, do básico ao avançado. No total, são mais de 50 parceiros. “Recentemente, foi ultrapassada a linha de 6 milhões de CPFs na Bolsa, fruto de todo esse esforço”, avalia.
Enquanto a renda variável atravessa uma fase complexa no país, os títulos de renda fixa privados vêm quebrando recordes na bolsa. “Em outra frente, vale ressaltar ainda que a B3 trabalha com o Tesouro Nacional e lançou novos títulos do Tesouro Direto como RendA+, Educa+, sempre trazendo novas oportunidades para o investidor pessoa física”, afirma Resende.
Quanto à diversificação internacional, tão discutida diante do cenário doméstico atual, há conteúdo sobre BDRs (Brazilian Depositary Receipts) e ETFs (Exchange Traded Fund), que permitem acesso de forma simples e com menos taxas a outros mercados. Esses são ativos que vem conquistando atenção dos investidores nos últimos anos.
Desde 2021, a B3 conta com o Conexões de Valor, programa de relacionamento com empresas de capital aberto ou fechado e estruturadores de ofertas. O objetivo é preparar as companhias para que elas acessem o mercado de capitais, utilizando o melhor instrumento na ocasião correta. “Nunca paramos o nosso trabalho de formação de profissionais de RI, de executivos em temáticas de companhia aberta, justamente por entender que será super necessária quando o mercado estiver mais otimista, quando mais operações acontecerão”, diz Leonardo Resende. São consideradas diversas fontes de captação, não só IPOs, mas alternativas em renda fixa e de diversificação de funding. Entre os principais assuntos abordados, estão governança corporativa, comunicação com os investidores, ESG, segmentos de listagem, estratégias para aumento de liquidez e como compor carteiras de índices.
Conexões de Valor tem encontros presenciais para que haja networking. No ano passado, mais de três mil profissionais de todas as áreas corporativas, incluindo RI, jurídico, financeiro, sustentabilidade, tesouraria e alta gestão, participaram dos eventos. A agenda de 2025 está em planejamento e será divulgada em breve.
Incentivos para investir
Embora o governo esteja numa batalha para arrecadar mais, sendo que um tema que costuma vir à tona é a possível tributação dos dividendos, incentivos fiscais podem ser um caminho para atrair mais investidores e recursos, de acordo com agentes de mercado.
Paulo Henrique Praes, da globalRI, ressalta que há alguns exemplos internacionais que podem servir de inspiração. No Canadá, existe a Tax-Free Savings Account (TFSA), uma conta para investimento geral, sem incidência de imposto, que tem limite de CAD$ 7 mil (dólares canadenses). Nos Estados Unidos, instrumentos como o 401(k) e o IRA (Individual Retirement Account) estimulam a população a investir em ações e fundos de previdência com benefícios fiscais.
Mas, se eventualmente houver tributação dos dividendos no Brasil, ele defende ao menos uma faixa de isenção para pequenos e médios investidores.
Patricia Stille, cofundadora e CEO da BEE4, plataforma de negociação de ações tokenizadas de PMEs, o Brasil deveria se inspirar em casos de sucesso do Reino Unido, que isentou os impostos de sucessão e de ganho de capital dos investimentos em ações de pequenas e médias empresas listadas no mercado de acesso. “Incentivos fiscais são sempre catalisadores para o desenvolvimento de novas classes de ativos”, diz.
Por meio de interações com dezenas de RIs, André Vasconcellos menciona que uma das medidas defendidas é a redução de custos operacionais como taxas e corretagens, que muitas vezes desestimulam o envolvimento de investidores de menor porte com a bolsa de valores. “É preciso criar um ambiente mais acessível, onde pessoas com pouco capital possam investir de forma eficiente.”
Novas bolsas: a concorrência para B3
Há mudanças e novidades à vista envolvendo ambientes de negociações. Os holofotes estão voltados para a estreia da Base Exchange, bolsa sediada no Rio de Janeiro, prevista para o último trimestre de 2025. A nova bolsa tem por trás a Americas Trading Group (ATG), que passou a se chamar recentemente Flowa Technologies e é controlada pelo Mubadala, fundo dos Emirados Árabes Unidos.
Por sua vez, a BEE4, focada no segmento de PMEs, com uma abordagem inovadora do ponto de vista tecnológico, utilizando blockchain em infraestrutura de negociação de valores mobiliários, acabou inspirando a consulta pública do regime FÁCIL da CVM para dar origem à nova regulação. “A futura regulação tem publicação prevista para este ano e vai facilitar o registro de companhias de menor porte e suas emissões de ações e dívida, abrindo uma avenida enorme para a operação da BEE4”, afirma Patricia Stille, cofundadora e CEO.
Desde 2022, são quatro empresas listadas na BEE4 - Engravida, Mais Mu, Plamev Pet e Elétron Energia – em um período marcado pela escassez de IPOs na B3.
Segundo Stille, a ampliação da capacidade de distribuição é crucial, ou seja, maior número de corretoras dando acesso a esse novo mercado para que seus clientes participem das ofertas públicas e possam negociar no mercado secundário. Em setembro do ano passado, a BEE4 concluiu os projetos de integração com as corretoras Genial Investimentos e Itaú Private Bank e já foram abertas conversas com outras instituições de peso. “Na Genial, os clientes podem negociar ações listadas na BEE4 no mesmo home broker onde operam ativos como Petro e Vale. Já no Itaú Private Bank, os investidores podem operar via mesa da corretora. No futuro, a ideia é que todo mercado esteja conectado”, comenta a CEO.
Do lado da originação de ativos, desde o lançamento da BEE4, o número de consultores de listagem e parceiros vem aumentando. Conforme Stille, futuramente, uma quantidade maior de ativos negociados poderá justificar a cobertura desse segmento pelas casas de research, atraindo cada vez mais investidores e gerando maior liquidez.
Também autorizada a atuar no mercado de renda fixa, a instituição está se estruturando para realizar operações de debêntures e notas comerciais ainda em 2025.
IPOs reversos: movimento de revigoração
Em curto período, dois IPOs reversos aconteceram na B3, um tipo de acesso ainda raro no mercado brasileiro.
Einar Rivero, CEO da Elos Ayta, explica que nesse processo, uma empresa de capital fechado compra o controle de uma companhia listada na bolsa, que geralmente tem ações desvalorizadas e baixa liquidez, ou seja, “parada”, sem investidores olhando para elas. A partir dessa aquisição, elas alteram a denominação, o objeto de negociação e o ticker, transferindo suas atividades para essa nova empresa. “Até criei o nome de “barrigas de aluguel” de IPOs. Trata-se de uma alternativa para empresas que querem entrar na bolsa com menos burocracia e de forma mais ágil, evitando altos custos do IPO tradicional”, diz.
A Fictor Alimentos adquiriu 76% das ações da Atompar (ATOM3) e estreou na bolsa em 20 de dezembro, sendo que o ticker ATOM3 foi alterado para FICT3. Já a REAG Investimentos fez IPO reverso na GetNinjas (NINJ3), colocando suas atividades de gestão de recursos e estruturação de investimentos sob a empresa listada, estreando assim como RAG3 em janeiro.
Segundo ele, os IPOs reversos acabam revigorando o mercado, pois companhias com baixa representatividade mudam e conquistam maior destaque nos pregões. A entrada de novos negócios inovadores e promissores têm condições de atrair mais investidores e aumentar a liquidez.
O ponto de atenção é que esse é um movimento favorável para os controladores, porém, pode desagradar minoritários, que têm direito de recesso caso discordem da operação.
André Vasconcellos, diretor de Estratégia, Planejamento e Relações com Investidores da Fictor Alimentos, empresa que atua no setor de proteína animal, explica que a escolha da Atom Empreendimentos e Participações ocorreu após análise criteriosa da situação financeira da companhia, sendo que ela apresentava balanço saudável, baixo nível de endividamento e fluxo de caixa positivo. Além disso, a empresa contava com auditoria externa de uma das “Big 4” e relatórios financeiros transparentes e ausência de passivos trabalhistas, previdenciários, fiscais, ambientais e legais. De acordo com ele, 100% dos investidores minoritários tiveram interesse em continuar no papel.
Desde a estreia em dezembro até meados de janeiro, FICT3 liderou na Bolsa com ampla vantagem (159,97%), uma rentabilidade de quase o dobro da segunda colocada, a FRIO3 (98,06%). “O IPO reverso e nossa tese de aquisições estratégicas posicionam a FICT3 como a única growth stock do setor no mercado de capitais brasileiro”, destaca Vasconcellos. A Fictor combina uma estratégia de crescimento orgânico, cujos resultados são de longo prazo, porém, no curto prazo, o foco é a aquisição de empresas estressadas, com grande potencial de rentabilidade. “Acreditamos que, ao assumir esses negócios, podemos revitalizar e organizar processos, tornando-as rapidamente rentáveis e promissoras para o mercado”, explica o diretor.
Um fato histórico é que a Atompar fez o primeiro IPO reverso da bolsa, a partir da compra da Inepar Telecom, em 2015. “É uma listagem direta na Bolsa, sem passar pelo processo em torno de oito meses na CVM, portanto, é mais fácil e menos custoso, e já traz para a companhia controles internos, melhor governança e mais transparência. Outra vantagem é que acaba ganhando exposição na mídia”, ressalta Joaquim Paiffer , fundador da Atom Educacional (ATED3). Assim, a Fictor buscou esse caminho, inclusive verificando esse case.
A Atompar, funcionando como uma holding, criou uma subsidiária, a Atom Educacional. Paiffer diz que além do primeiro IPO reverso da bolsa (Atompar/Inepar), foi feita uma primeira cisão (Atompar/Atom Educacional) para um IPO reverso (Fictor/Atompar). “Essa operação, onde a gente fez a cisão da companhia que listou a ATED3, que é a Atom Educacional, e transferiu a parte cindida para um IPO reverso, que é o caso da Fictor, também foi uma inovação e pode ser um ótimo caminho para outras empresas”, diz. A Atom Educacional atua com educação financeira e cursos profissionalizantes, com aquisição do Cebrac (Centro Brasileiro de Cursos). Antes o foco da companhia eram os cursos para traders, entretanto, houve uma mudança na estratégia e abertura do leque.
Quanto ao IPO reverso da REAG, as primeiras aquisições de ações da GetNinjas (NINJ3) começaram em setembro de 2023 e culminaram com a realização de uma OPA. A partir daí, foi consolidado o controle na Getninjas e foram iniciadas as alterações na administração e negócios da companhia, que resultaram na alteração de objeto social e consequentemente do nome de pregão e ticker, ocorridos no último dia 10 de janeiro.
Lucas Trevisan, diretor de Relações com Investidores da REAG Capital Holding, comenta que o processo com a Getninjas envolveu um takeover, amplamente noticiado, com oposição do fundador da empresa. Após a consolidação do controle na companhia, foram realizadas diversas otimizações dos processos na companhia, investimentos em controles e governança, com a contratação de consultorias e implementação de sistemas que fortaleceram a estrutura corporativa. Ao final, foi iniciada uma reestruturação societária, que envolveu o drop down do negócio GetNinjas, para uma subsidiária da própria companhia, de forma que a empresa listada pudesse ampliar seu espectro de atuação e melhor aproveitamento dos recursos da empresa.
“A principal vantagem é a otimização de custos e aproveitamento de um capital humano já habituado à ‘vida de companhia aberta’. Tendo em vista o mercado pouco propício a um IPO tradicional, bem como os custos regulatórios envolvidos, o IPO Reverso é uma oportunidade para a empresa fechada de ‘subir a régua’ considerando a sujeição aos mais altos padrões regulatórios”, afirma Trevisan.
Um levantamento da consultoria Elos Ayta mapeou companhias na B3 que são potenciais candidatas para interessadas em realizar IPOs Reversos, pois possuem baixa liquidez e controlador definido. Veja a seguir:
Candidatas a IPOs Reversos
Empresas com volume médio inferior a R$ 1MM / dia e com um acionista com mais de 50% em ações ordinárias |
|||
---|---|---|---|
Empresa |
Setor |
Volume financeiro médio diário |
Presença pregoes |
Const A Lind |
Incorporações |
0 |
6,77 |
Josapar |
Alimentos diversos |
1 |
9,16 |
Sondotecnica |
Engenharia consultiva |
1 |
3,98 |
Hercules |
Utensílios domésticos |
3 |
26,49 |
Baumer |
Equipamentos |
5 |
36,45 |
Plascar Part |
Automóveis e motocicletas |
5 |
63,75 |
Estrela |
Brinquedos e jogos |
9 |
29,88 |
Excelsior |
Carnes e derivados |
10 |
36,25 |
Tex Renaux |
Fios e tecidos |
11 |
45,02 |
Cemepe |
Outros |
12 |
37,45 |
Karsten |
Fios e tecidos |
13 |
34,06 |
Panatlantica |
Artefatos de ferro e aço |
13 |
25,7 |
Wetzel |
Material rodoviário |
21 |
29,88 |
Bic Monark |
Bicicletas |
22 |
96,41 |
Mangels Indl |
Artefatos de ferro e aço |
29 |
40,64 |
Teka |
Fios e tecidos |
32 |
18,13 |
Atmasa |
Serviços diversos |
38 |
99,2 |
Haga |
Produtos para construção |
38 |
97,01 |
Minasmaquina |
Material de transporte |
39 |
0,4 |
Nutriplant |
Fertilizantes e defensivos |
43 |
100 |
Wlm Ind Com |
Material de transporte |
46 |
54,58 |
Pettenati |
Fios e tecidos |
64 |
88,84 |
Whirlpool |
Eletrodomésticos |
64 |
97,21 |
Santanense |
Fios e tecidos |
75 |
97,41 |
Pet Manguinh |
Exploração refino e distribuição |
82 |
99,6 |
Cristal |
Químicos diversos |
91 |
68,92 |
Embpar |
Material de transporte |
95 |
100 |
Sansuy |
Materiais diversos |
100 |
72,51 |
Riosulense |
Material rodoviário |
126 |
98,41 |
Springs |
Fios e tecidos |
128 |
62,95 |
Padtec |
Programas e serviços |
149 |
100 |
Dotz SA |
Programas de fidelização |
153 |
100 |
Fer Heringer |
Fertilizantes e defensivos |
166 |
100 |
Grazziotin |
Tecidos vestuário e calçados |
203 |
98,61 |
Aco Altona |
Máq. e equip. industriais |
274 |
81,27 |
Bombril |
Produtos de limpeza |
297 |
50 |
Triunfo Part |
Exploração de rodovias |
351 |
100 |
Kora Saude |
Serviços médico-hospitalares |
554 |
100 |
D1000vfarma |
Medicamentos e Otr produtos |
713 |
100 |
Alliar |
Serviços médico-hospitalares |
730 |
100 |
Neogrid |
Programas e serviços |
813 |
100 |
Fonte: Elos Ayta
Papel do RI no cenário atual
No atual momento complicado do mercado de ações, o papel dos profissionais de Relações com investidores se torna ainda mais significativo. “O departamento de RI atua como elo de confiança entre a empresa listada e seus investidores”, afirma André Vasconcellos, vice-presidente do Conselho de Administração do IBRI.
De acordo com ele, em tempos difíceis e de volatilidade, os investidores ficam mais ansiosos e inquisitivos sobre a saúde financeira, posicionamentos e perspectivas das empresas. “A comunicação deve ser de forma clara e eficaz para tranquilizar investidores em relação às estratégias de mitigação de riscos”, completa. Conforme ele, a gestão da crise, seja econômica, política ou interna deve ser bem conduzida para que acionistas e investidores se sintam seguros quanto aos planos de longo prazo da empresa. A boa governança corporativa e melhores práticas ESG estão entre os pilares mais valorizados.
Para Lucas Trevisan, diretor de Relações com Investidores da REAG, o RI, em momentos de mercado em baixa, deve atuar como o principal moderador das discussões internas da companhia, comunicando as impressões dos investidores e outros agentes de mercado à alta administração, trazendo subsídios para decisões estratégicas.
Leonardo Resende, superintendente de Relacionamento de Empresas e Estruturadores de Ofertas da B3, reforça a importância de uma narrativa baseada em dados. “É essencial manter o equity story, dar publicidade para a companhia de forma abrangente e para todos os segmentos de investidores.”
Em outra frente, sobretudo com a atratividade da renda fixa, os RIs precisam ampliar seus horizontes e práticas. “Geralmente, o RI é muito focado no investidor de renda variável, porém é interessante buscar mais conhecimento na tesouraria sobre debenturistas, por exemplo”, completa Resende.