O recente congresso do IBGC foi um dos melhores já realizados, pois, focando no tema “Governança Corporativa que Cria Valor - Um processo em evolução”, trouxe um olhar prático e profundo sobre os relevantes fundamentos da verdadeira governança. Desde o príncipe Charles que participou através de vídeo gravado até os diversos palestrantes nacionais e internacionais houve oportunidade de rever e meditar sobre princípios, recomendações e práticas da boa governança como algo mais profundo do que o mero cumprimento de legislação e regras.
Também mais abrangente do que o simples objetivo de maximização de resultados posto que seu foco deve ser criar valor através dos 3 Ps - “people, planet and profit”. “Pessoas” vistas não como recursos humanos, mas sob um prisma estratégico como personagens vitais no processo de governança e criação de valor, movidas por um propósito e por objetivos além e maiores do que apenas uma remuneração. O “planeta” percebido como o meio imprescindível de ser respeitado para viabilizar a própria sobrevivência de pessoas, negócios e empresas.
Poderíamos chamar isso de evolução para o “capitalismo inclusivo”, onde a cooperação e as parcerias são essenciais, impondo-se um olhar e perspectivas de longo prazo, abstraindo-se ou mesmo deletando a miopia da visão e cobrança dos relatórios trimestrais - a síndrome da trimestralidade que move especialmente o mercado de capitais. Isto em adição à evidente mudança das medidas de performance de forma a incluir métricas qualitativas além das clássicas quantitativas. Estas, por óbvio, permanecem válidas e vitais, posto que quem não conhece números não conhece o negócio.
Ratificou-se a importância do direcionamento estratégico no nível societário e de conselho, bem como do imprescindível alinhamento a ele de todos os executivos. Nesse cenário, cresce a importância da capacitação, perfil e independência opinativa e de posicionamento dos conselheiros que precisam olhar mais para a janela do que para o espelho. A mesma lógica se aplica ao fórum superior e maior da Governança que são os acionistas, para os quais “o olho do dono só engordará o boi” se enxergar bem e longe. Porque criar valor não significa apenas cortar custos, mas sim melhorar a eficiência, o que exige adesão e envolvimento de todos. Focar em redução de custos sem agir para ampliar receitas é um processo de anorexia gerencial cujo fim, como se sabe, é a morte.
Isto impõe um processo de decisão mais qualificado do que apressado, exigindo capacitação, experiência e independência de um Conselho com efetividade funcional, onde haja liberdade para o contraditório, posto que a unanimidade é burra. Sem esquecer que, assim como a quantidade de executivos não garante a qualidade de gestão, a de conselheiros também não assegura eficiência e eficácia do Conselho: esse patamar pode geralmente ser melhor alcançado com número de 5 a 7. Ficou notório que, mais importante do que a formalização de um Conselho de Administração, é a existência da lógica, responsabilidade, papel e obrigações desse fórum, não importando a forma que assuma (“Conselho Consultivo”, “Supervisor”, “de Gestão”, etc.). O conteúdo se sobrepõe à forma.
No âmbito de empresas de controle familiar, acionistas do Grupo Itaú, Votorantim, Duas Rodas e Laboratório Sabin deram demonstrações práticas de que sucesso, perenidade e criação de valor são sempre decorrentes da adequada estruturação, separação e operacionalização das três dimensões desse tipo de organização: família, propriedade e empresa. Ficou patente que a preparação e profissionalização nesses três níveis é vital para a proativa ação de unificação, afinidade e entendimento de herdeiros e sucessores, o que deve ser respaldado pelo regramento das relações através de adequados instrumentos de Acordo de Acionistas e de um Código de Conduta / Ética.
Nada disso, entretanto, será possível - e, portanto, a perenidade utópica - sem uma sólida base de valores e princípios conhecidos, formalizados, praticados e transmitidos. Nesse sentido, chamaram atenção dois casos de sucesso com composição societária de controle 50 / 50 onde o teórico impasse e problema decisório por empate é inexistente em função da unidade acionária decorrente do somatório de valores compartilhados e boas práticas de governança e sucessão. Foi lapidar a mensagem de Janete Vaz, do Sabin, “o corpo é dividido em partes, a alma em valores e princípios”. Em síntese, um congresso que soou como música aos ouvidos para quem prega, pratica e implanta as boas práticas internacionais de gestão e Governança.
Telmo Schoeler é fundador e Presidente da Strategos – Consultoria Empresarial e da Orchestra - Soluções Empresariais. Possui 50 anos de prática profissional, metade em funções executivas de diretoria e presidência de empresas nacionais e estrangeiras.
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