Melhores Práticas

RELATO INTEGRADO

Desde 2000, o relato de informações não-financeiras, sociais e ambientais vem ganhando espaço e já se consolidou como uma prática, especialmente entre as grandes empresas. Essa evolução na divulgação de desempenho das corporações passou a aliar a tradicional comunicação de resultados financeiros e a cultura de produção de Relatórios de Sustentabilidade.

Atualmente, o International Integrated Reporting Council - IIRC (sigla em inglês para Conselho Internacional de Relatórios Integrados) congrega empresas, organismos reguladores e de padronização, investidores, organizações não governamentais e consultorias de quase 30 países em torno do desafio de criar um modelo global de relato integrado, o “Integrated Reporting”. A organização foi responsável pela criação das primeiras diretrizes sobre o tema, que passaram por processo de consulta pública no primeiro semestre de 2013 e estão sendo aplicadas neste ano de 2014.

Nelson Carvalho (FEA/USP), Roberto Pedote (Natura), Marco Geovanne Tobias da Silva (Previ) e Sandra Guerra (IBGC) são alguns dos profissionais brasileiros que fazem parte do IIRC. Há programas-piloto em processo com investidores, setor público e empresas, como BNDES, Itaú, AES Brasil, Petrobras, CCR, Votorantim Industrial e Natura, entre outras. Além disso, o Brasil está empatado em 2º lugar junto com a Holanda nessa iniciativa.

A agenda nacional de discussões do Relato Integrado estimulou iniciativas inéditas, como a criação da Comissão Brasileira de Acompanhamento do Relato Integrado, liderada pelo BNDES, que em pouco tempo atraiu membros da academia, empresas, organizações setoriais e consultorias, além de instituições como Abrasca e Anefac.

Com o objetivo de unificar o relato corporativo, o IIRC definiu seis capitais que, de alguma forma, já vêm sendo tratados nos relatórios de sustentabilidade: Financeiro; Intelectual; Natural; Manufatura; Humano; e Social e de Relacionamento. Além disso, detalhou a interrelação e o fluxo de cada um deles, que devem ser considerados desde a tomada de decisão até a divulgação dos resultados.

Ítens avaliados no Relato Integrado

  • Financeiro - Investimentos, dívidas e capital que permitem a organização da produção de bens ou prestação de serviços.
  • Intelectual - Conhecimentos intangíveis (que não podem ser contabilizados) de uma organização.
  • Natural - Todos os recursos ambientais renováveis e não renováveis.
  • Manufatura - Objetos físicos, como edifícios, equipamentos e infraestrutura.
  • Humano - Competências e capacidades dos profissionais.
  • Social e de Relacionamento - As relações entre a organização, a comunidade e outras partes interessadas

Mudança de comportamento
Duas pesquisas divulgadas recentemente comprovam o interesse do mercado na adoção dos princípios de relato integrado para a comunicação de resultados. Na primeira delas, elaborada pela consultoria PwC, quase 2/3 dos analistas e investidores entrevistados responderam que acreditam que a qualidade dos relatórios pode ter impacto direto sobre o custo do capital (incluindo informações sobre estratégia, riscos e outros direcionadores de valor). 

Já no levantamento realizado pelo International Integrated Reporting Council (IIRC) em parceria com a consultoria Black Sun, as empresas que já incorporaram parte das diretrizes afirmaram perceber impactos positivos no engajamento de stakeholders externos (91% dos respondentes) e benefícios estratégicos na tomada de decisão (79%). A percepção é das companhias que compõem o grupo piloto, que também indicaram melhor entendimento dos riscos e oportunidades (68%); e melhor compreensão dos investidores da estratégia de negócio de cada empresa (87%).


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RELATO INTEGRADO NO BRASIL

A introdução do conceito de Relatórios Integrados é muito semelhante ao do início do movimento de Governança Corporativa no Brasil. Ambos os casos oferecem uma nova maneira de pensar sobre o mundo das organizações.

O debate sobre as melhores práticas de Governança Corporativa (GC) teve um maravilhoso progresso ao longo das últimas duas décadas. Ele foi inicialmente muito difícil para atrair a atenção para a discussão sobre Governança no Brasil. Poucos entenderam seus conceitos e aqueles com uma melhor compreensão acreditavam ser restrito às realidades dos mercados do hemisfério norte ou para grandes empresas cotadas na Bolsa. Os resultados de hoje são evidentes ​​e os resistentes passaram a questioná-los cada vez menos.

A semelhança com o início do Relato Integrado no Brasil ocorre porque o conceito é muito inovador. Isso pode gerar dúvidas sobre a sua aplicação e as suas características principais.

No início, havia muitas dúvidas sobre conceitos de Governança Corporativa, uma fase que vivemos atualmente no Brasil em relação ao Relato integrado. Se compararmos esta fase ao início da promoção de GC, percebemos, no entanto, uma disposição mais positiva em relação Relatórios Integrados do que notamos na década de 1990 no Brasil para GC.

A razão para um maior ceticismo em relação à aplicação de boa Governança Corporativa do que encontramos hoje com Relato Integrado pode ser por causa das acusações relativas a alguns elementos da GC, como as questões relativas ao poder dentro das organizações e das exigências de transparência, o que pode ser visto como ofertar vantagens para os concorrentes. Por outro lado, posso listar alguns fatores positivos relativos ao Relato Integrado no Brasil, começando com os aspectos da Sustentabilidade.

O Brasil sempre recebeu estes aspectos de uma forma muito positiva, gerando empatia na sociedade. Do ponto de vista das organizações, nesta última década, observamos também uma maior preocupação em promover melhorias neste domínio, que evoluíram a partir do relato meramente ambiental para incluir os aspectos sociais. Houve adesão espontânea a estas questões.

Gosto de usar o testemunho de um fornecedor internacional de capitais como exemplo. Ele também opera no Brasil, concedendo crédito e como um investidor em empresas. Esta instituição financeira tem critérios firmes sobre GC e Sustentabilidade. Seus executivos, que interagiram com empresas interessadas na obtenção de crédito de uma forma favorável, ou em tê-los como acionistas, relataram maior facilidade na negociação de Sustentabilidade do que as cláusulas GC. A suspeita neste comportamento está associada a uma maior aproximação de GC com poder, fazendo a possível objeção maior.

Oportunidades
Acredito que essas percepções foram importantes para a obtenção de uma melhor recepção para os conceitos de Relato Integrado. A iniciativa de criar o Grupo Brasileiro, para um controle reforçado desta situação, foi estimulada pelos primeiros membros brasileiros do Conselho Internacional de Relatórios Integrados (IIRC). Com o Professor Nelson Carvalho, da FEA-USP, no leme, que incentivou o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) para atuar como um facilitador e organizador deste grupo brasileiro.

O grupo começou com poucos participantes, que voluntariamente se reuniram e decidiram sobre os seus próximos passos. A presença crescia a cada reunião. Sem qualquer estrutura de GC formalizada, e com a ajuda de Vânia Borgeth, uma executiva que se reporta ao presidente do BNDES, o Grupo Brasileiro reúne hoje mais de 200 participantes, que representam mais de 90 organizações envolvidas na compreensão e melhoria do processo de comunicação. A iniciativa foi ainda mais longe e grupos de trabalho estruturados foram estabelecidos, que agora totalizam quatro: a Comunicação com Públicos Estratégicos; Empresas Pioneiras; Relações com Investidores; e Road Show.

Nas suas reuniões, o grupo tem como objetivo manter o mercado brasileiro informado sobre o futuro da auto-regulação, a fim de evitar surpresas ou rejeições quando implementadas, envolvendo empresas brasileiras em Relatórios Integrados.

Durante todo este período de divulgação fomos capazes de observar os pontos que desafiam organizações, como sendo visto como um outro tipo de relatório e um custo adicional. Isto é devido, principalmente, à necessidade de formar equipes para elaborar o relatório integrado, bem como as questões relacionadas com a auditoria e sua padronização no Brasil.

O Brasil está entre os três principais países em termos do número de empresas participantes do Programa Piloto IIRC. Das 106 empresas-piloto, o Brasil tem 12, o mesmo que a Holanda e o Reino Unido. Isto é muito significativo se compararmos estes países em termos de PIB e mercado de capitais e da estrutura da organização. O interessante é que nós estamos em uma posição de liderança. Acreditamos que esta é uma oportunidade para outros países para entender o que está acontecendo aqui e usar isso para avançar na divulgação da causa em seus próprios países.


Sandra Guerra é presidente do IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
www.ibgc.org.br


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