A INAÇÃO NESTA AGENDA PODE COLOCAR SUA EMPRESA EM RISCO.
As mudanças climáticas continuam sendo um dos principais temas discutidos globalmente e a principal ameaça para a humanidade e a biodiversidade. No início de 2022, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas - IPCC lançou as duas últimas publicações do 6° relatório de avaliação sobre mudanças climáticas. Foram tratados os impactos críticos dessas alterações no planeta e os caminhos da sociedade para mitigar esses impactos e manter a temperatura global abaixo do 1,5°C - meta global do Acordo de Paris.
Os impactos da mudança no clima já são uma realidade e têm sido mais severos do que se previa. Essas consequências já têm sido notadas com o aquecimento atual de 1,1°C. A segurança alimentar se vê ameaçada pelas secas em territórios com histórico de chuvas, calor extremo e inundações recordes cada vez mais frequentes. A insegurança hídrica vem sendo um dos principais problemas em nível global e os incêndios florestais, cada vez mais extensos, trazem danos irreversíveis à biodiversidade. O panorama é pouco alentador, e estes impactos devem aumentar no curto prazo, mesmo que o limite de 1,5°C seja respeitado.
O caminho para um cenário mais otimista é claro: o mundo precisa transitar para uma economia de baixo carbono, em que o abandono da energia fóssil é urgente. Para ser mais exato, o último relatório do IPCC indica cortar as emissões de gás, petróleo e carvão em 43% até 2030 (ano base 2019) para ter chances de que se cumpra a meta do Acordo de Paris.
Não é um mistério que os diferentes setores, tanto o financeiro como o de economia real (público e privado), precisam traçar estratégias climáticas que orientem à transição para uma economia de baixo carbono. Há dois principais motivos para que as organizações sigam essa agenda.
O primeiro está relacionado à mitigação dos riscos aos quais uma organização está exposta: os riscos físicos (eventos climáticos extremos ou mudanças em padrões climáticos), ou os riscos de transição para uma economia de baixo carbono (regulatórios, de mercado, tecnológicos e reputacionais). O segundo motivo está relacionado ao aproveitamento das oportunidades geradas a partir do negócio de atuação da organização (por exemplo, emissão de títulos rotulados, créditos de carbono, produtos mais sustentáveis, etc).
Estima-se que o PIB mundial poderia ser afetado pelas mudanças climáticas entre 18% - se nenhuma ação for tomada - e 4% - mesmo atingindo a meta do Acordo de Paris - (Swiss Re, 2021). Já no Brasil as perdas no PIB podem ficar de R$ 3,5 a R$ 8 bilhões por ano (UFMG, 2021). Nesse sentido, é fundamental que as organizações estimem os potenciais impactos financeiros dos riscos climáticos físicos e de transição aos quais se encontram expostas.
Para que as empresas possam aprimorar essa gestão existe um arcabouço de frameworks, como a TCFD, o CDP clima, a taxonomia da União Europeia e o Climate Bonds Taxonomy, que podem ser úteis para divulgar informações, buscando uma maior padronização de dados e indicadores, e consequentemente, facilitar a tomada de decisão dos investidores. Assim como classificar ativos ou projetos com adicionalidade climática.
Esses frameworks, por sua vez, têm ganhado tração nos últimos anos. A TCFD, por exemplo, é a principal referência para a criação de exigências regulatórias sobre disclosure climático. Um dos exemplos mais claros vem de fora do Brasil, onde em 2020 o Banco Central Europeu (ECB) publicou o Guia para Divulgação e Gestão de Riscos Ambientais e Climáticos, com o objetivo de garantir a aplicação padronizada de critérios de supervisão bancária em toda a União Europeia. Já em 2021, a Nova Zelândia aprovou a lei que obriga empresas a reportar o impacto no clima. Essa legislação se converteu na primeira do mundo do gênero. Uma mais recente foi proposta pela SEC (Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos), que também demandará a divulgação de informações climáticas das empresas listadas nos EUA.
O Brasil não é alheio a essa tendência, pelo contrário, o país teve 2 legislações importantes em 2021. A primeira veio do Banco Central do Brasil (BCB), que divulgou resoluções (N° 4.943, 4.944, 4.945) que, além de exigirem o gerenciamento de riscos socioambientais, a partir de 2023, também exige que as instituições financeiras passem a reportar sua gestão climática. A segunda foi dirigida ao setor de economia real, com a resolução da CVM 59 sobre dados ESG de companhias listadas a partir de 2023, incluindo o reporte sobre a adesão às recomendações da TCFD.
Nesse sentido, é claro que a agenda climática deixou de ser apenas uma adesão às boas práticas, para ser uma exigência do mercado: órgãos reguladores, investidores, clientes e demais stakeholders. Ante essas demandas é importante que as organizações olhem internamente para além da quantificação de emissões de gases de efeito estufa (GEE), e reflitam sobre a gestão climática como um todo. A urgência da agenda e o maior conhecimento dos stakeholders sobre a temática, tornaram as questões abaixo cada vez mais recorrentes. Sua organização tem boas respostas para todas?
Mais do que questionamentos, as questões climáticas se tornaram objeto de litigância. Empresas do ramo do petróleo como a Exxon, por exemplo, já possuem processos por ocultar informações sobre os impactos da mudança do clima de investidores e consumidores. Bem como casos de greenwashing são cada vez mais comuns entre empresas que estabelecem metas net-zero inconsistentes ou enganosas, o que pode acabar afetando severamente suas marcas e valor de mercado.
De acordo com uma pesquisa feita pela Deloitte, que entrevistou 2.260 executivos C-level de 21 países, dos quais 133 foram líderes brasileiros de 6 diferentes setores da economia, as companhias brasileiras estão à frente de outros países em algumas iniciativas climáticas, o que é um bom indicador sobre a movimentação do mercado como um todo, ainda que haja um grande caminho a ser percorrido.
Alguns exemplos de boas iniciativas destacadas na pesquisa e que podem servir de inspiração são: 73% das empresas brasileiras treinam funcionários sobre os impactos da mudança climática, enquanto esse número é de 57% na média global. E 71% dos negócios brasileiros aumentaram a eficiência energética à medida que no mundo este número é de 66%.
Visto que a variável climática deve continuar mainstream no mundo em 2023, a inação na agenda climática pode levar à obsolescência de algumas empresas e talvez setores. Não é vantagem para ninguém ficar de fora dessa realidade.
Omar Avila
é coordenador ESG de empresas com foco em clima na NINT - Natural Intelligence.
omar.avila@nintgroup.com