Governança

CONSELHOS DE BUDA E PAPA FRANCISCO PARA BOA GOVERNANÇA

Em um mundo caracterizado pela disparidade econômica, degradação ambiental e turbulência social, devemos constantemente buscar novas inspirações para encontrar soluções inovadoras para nossos problemas. Uma alternativa em relação a essas questões é implementar e seguir diretrizes de Governança Corporativa. Mas como?

Como dizem, a inspiração pode vir de lugares inesperados. Talvez a resposta não esteja onde as pessoas costumam procurar, e algumas percepções interessantes podem ser encontradas em outros espaços. Por exemplo, nos ensinamentos de Buda e do Papa Francisco. Ambos líderes espirituais enfatizaram princípios de compaixão, sustentabilidade e justiça social, que são fundamentais para criar uma sociedade mais equitativa e sustentável.

Continue lendo para entender melhor como essas filosofias podem beneficiar a boa governança. Venha com a mente e o coração aberto. Afinal, está bastante claro que não vamos conseguir avançar e ter sucesso, tanto como planeta quanto como empresas individuais, fazendo o que já foi feito antes.

Uma abordagem budista para a economia
O conceito de economia budista surgiu no meio do século XX, através das obras de E.F. Schumacher, um economista britânico. Ele idealizou um modelo econômico fundamentado em princípios e valores budistas, oferecendo uma abordagem holística para o desenvolvimento econômico que prioriza o bem-estar e a sustentabilidade em detrimento da maximização do lucro. Ainda, ele tem raízes profundas nos princípios de suficiência, interdependência, compaixão e a noção de não prejudicar o outro.

No centro da economia budista está a ideia de suficiência. Ao invés da busca interminável por riqueza material e consumo, ela defende encontrar contentamento apenas com o que é necessário para uma vida digna. Isso se alinha com o conceito budista do Caminho do Meio, que enfatiza a moderação e o equilíbrio em todos os aspectos da vida. Em termos práticos, isso significa promover padrões de consumo sustentáveis que não esgotem os recursos naturais ou prejudiquem o meio ambiente.

Outro princípio chave é o conceito de interdependência. De acordo com os ensinamentos budistas, todos os fenômenos são interdependentes e interconectados. Este princípio se estende ao campo econômico, onde ações tomadas em uma parte da economia podem ter efeitos de longo alcance em outras esferas. No contexto da economia budista, significa considerar os impactos sociais e ambientais das atividades econômicas.

A compaixão também é um pilar central. Ela ressalta a importância da empatia e da preocupação com o bem-estar dos outros, incluindo as gerações futuras. Esse princípio se reflete na maneira como os recursos são gerenciados e distribuídos, com foco na redução da desigualdade e garantia de que todos tenham acesso às necessidades básicas.

Não prejudicar, ou ahimsa, é mais um princípio chave da economia budista. Ele enfatiza a importância de evitar prejudicar os outros, incluindo animais e plantas. No contexto econômico, isso se traduz em promover práticas sustentáveis e éticas que minimizem o dano ao meio ambiente e aos seres vivos.

Em termos práticos, a economia budista defende uma abordagem descentralizada e humanizada para o desenvolvimento econômico. Ela valoriza a importância da autossuficiência local, capacitação da comunidade e preservação da sabedoria e cultura tradicionais.

Francisco, Clara e um modelo econômico baseado no amor
A economia de Francisco e Clara refere-se a um modelo socioeconômico inspirado na vida e nos ensinamentos de São Francisco de Assis e Santa Clara de Assis, duas figuras reconhecidas por sua dedicação à pobreza, humildade e simplicidade. Este modelo está enraizado na tradição franciscana e reflete seus valores de solidariedade, amor, comunidade e cuidado com o meio ambiente. Atualmente, o Papa Francisco advoga por esses princípios, buscando envolver as gerações mais jovens nesse desenvolvimento econômico.

O conceito de pobreza voluntária é crucial para a economia de Francisco e Clara. Ambos renunciaram à riqueza material e viveram vidas de simplicidade e austeridade. Eles acreditavam que, ao abraçar a pobreza, poderiam emular mais plenamente a vida de Jesus Cristo e viver em comunhão mais próxima com Deus. Esse princípio enfatiza a importância de viver apenas com o que é necessário e compartilhar recursos com os necessitados.

Outro aspecto chave da economia de Francisco e Clara é a ideia da boa administração. Eles acreditavam que toda a criação é um presente de Deus e que os seres humanos têm a responsabilidade de cuidar da terra e de seus recursos. Isso se reflete no compromisso com a sustentabilidade ambiental e na promoção de práticas que respeitem e protejam o mundo natural.

A comunidade e a solidariedade também são essenciais. São Francisco e Santa Clara enfatizavam a importância de viver em comunidade e apoiar uns aos outros nos momentos de necessidade. Na vida, isso é observado na ajuda mútua e solidariedade, onde os recursos são compartilhados entre os membros da comunidade para garantir que as necessidades básicas de todos sejam atendidas.

A economia de Francisco e Clara também enfatiza a importância do trabalho e da criatividade. Eles acreditavam que o trabalho é uma forma de oração e que ele tem dignidade e valor. Esse princípio é refletido no compromisso com o trabalho significativo e na promoção de atividades econômicas que contribuam para o bem comum.

Em termos práticos, esse modelo promove práticas econômicas sustentáveis e equitativas. Ele enfatiza a importância das economias locais e da produção em pequena escala, bem como a promoção do comércio justo e do consumo ético.

Como a boa governança pode se beneficiar desses novos modelos econômicos?
Em primeiro lugar, é fundamental destacar que, embora a economia budista e a economia de Francisco e Clara tenham suas origens nos ensinamentos de líderes religiosos, seguir suas filosofias econômicas não tem nada a ver com religião. Pense nisso como uma forma de ter uma perspectiva mais ampla e inovadora em relação à compreensão da dinâmica econômica do mundo.

A boa governança pode se beneficiar significativamente dos princípios e valores defendidos por esses modelos econômicos, bem como do Capitalismo Consciente. Cada um deles oferece insights e abordagens únicas que podem contribuir para uma governança mais eficaz, inclusiva e sustentável.

O Capitalismo Consciente é um conceito que procura conciliar a busca pelo lucro com a responsabilidade social e ambiental. Ele enfatiza a importância das empresas agirem como entidades responsáveis, equilibrando os interesses dos acionistas com os dos outros stakeholders. Os princípios da economia budista e da economia de Francisco e Clara se alinham com os valores do capitalismo consciente, enfatizando a importância da compaixão, sustentabilidade e responsabilidade social na tomada de decisões econômicas.

Incorporar esses conceitos na governança pode levar a vários benefícios. Primeiro, pode promover um crescimento econômico mais inclusivo que beneficie toda a sociedade, reduzindo a desigualdade e a pobreza. Segundo, pode levar a um desenvolvimento mais sustentável que preserve os recursos naturais e proteja o meio ambiente para as gerações futuras. Terceiro, pode fomentar um sentido de comunidade e solidariedade, levando a uma maior coesão social e estabilidade.

Em conclusão, a boa governança pode se beneficiar da economia budista e da economia de Francisco e Clara ao incorporar seus princípios e valores nos processos de tomada de decisão. Esses modelos enfatizam a sustentabilidade, a justiça social e a inclusão, que são essenciais para uma governança eficaz. Ao promover práticas éticas e sustentáveis, a boa governança pode construir confiança entre empresas, governos e sociedade, levando a um desenvolvimento mais inclusivo e sustentável.

Ana Paula Candeloro
é Conselheira estratégica com experiência no ecossistema de empreendedorismo e inovação, mercado financeiro, PME e 3º setor, com foco em ESG e gerenciamento de riscos. Advogada, executiva C-level, Mestre em Liderança para a Sustentabilidade pela Universidade de Cambridge, Inglaterra. 
anacandeloro@uol.com.br


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