O crescimento das Redes Sociais promoveu relevantes alterações na dinâmica das relações humanas, proporcionando novas oportunidades e, ao mesmo tempo, apresentando riscos a serem monitorados. Neste contexto de avanço constante e disseminação das Redes Sociais, com multiplicação de conexões e engajamentos cada vez mais amplos, atingindo perfis mais diversos, os Influenciadores Digitais surgiram e se tornaram progressivamente mais relevantes.
Os Influenciadores Digitais são um fenômeno global, presente em diversos segmentos, não sendo um acontecimento privativo das finanças e do Mercado de Capitais. Eles estão presentes em diversos campos do conhecimento e práticas da humanidade, tais como os esportes, a culinária, a área de saúde e muitos outros segmentos.
Em sua maioria, os Influenciadores Digitais são agentes econômicos de boa-fé, que se utilizam de sua relevância nas Redes Sociais para exercer influência positiva na vida das pessoas. No ambiente do Mercado de Capitais, os Influenciadores Digitais são, inclusive, uma forma poderosa de:
(i) disseminação de educação financeira para o público em geral; e
(ii) aproximação do Mercado de Capitais com os investidores de varejo, em especial o público mais jovem, que vem crescendo exponencialmente na atual democratização do Mercado de Capitais.
Por conta destes aspectos, a CVM reconhece a importância dos Influenciadores Digitais e pondera que, com alguns cuidados, eles podem ser aliados na evolução do Mercado de Capitais no Brasil. Todavia, há um ponto de atenção que precisa ser observado, não apenas pela CVM, mas pela sociedade em geral, que é o fato de existir uma pequena parcela de Influenciadores Digitais que se utiliza desta condição para promover desvios de condutas.
É preciso separar o joio do trigo. A CVM está atenta aos desafios apresentados pela pauta. A Autarquia não tem a pretensão de limitar a liberdade de expressão de ninguém, mas – ao mesmo tempo – está ciente dos riscos que a pontual parcela de Influenciadores Digitais não aderentes à boa-fé pode trazer ao Mercado de Capitais.
O primeiro risco é a atuação sem registro e invasão do perímetro de atuação de outros agentes regulados do Mercado de Capitais, como são, por exemplo, os analistas e os assessores de investimento.
O segundo risco, considerado maior do que o primeiro, está relacionado à atuação dos Influenciadores Digitais em condutas típicas de ilícitos do Mercado de Capitais, como – por exemplo – a Manipulação de Mercado, a Manipulação Informacional e, até mesmo, o Uso de Informação Privilegiada.
Vamos imaginar a situação em que eventual Influenciador Digital sugere investimento em algum valor mobiliário ou determinado ativo. Esta ação, por si só, já é um ponto de atenção. Caberia ao Influenciador Digital sugerir investimento? Ou deveria, esse Influenciador, ter registro junto aos órgãos competentes para realizar a ação de recomendação de investimentos?
Um passo além: previamente à sugestão do ativo, o Influenciador “monta posição” naquele investimento, em comportamento típico de front running. Ou seja: estaria o Influenciador criando um cenário, uma expectativa, além de se apresentar de maneira conflitada com o comportamento que vier a ser adotado por seus seguidores?
Não obstante esses contextos apresentados, mais uma característica a ser explorada na esteira do tema dos Influenciadores Digitais diz respeito a um dos pilares do Mercado de Capitais: a transparência da informação. Os Influenciadores Digitais — que possuam vínculo com participantes regulados pela CVM e/ou, de outra forma, tenham alguma relação contratual que oriente o viés para a influência exercida — devem tornar pública esta situação de potencial conflito de interesses.
As discussões sobre Influenciadores Digitais são hot topics recorrentes em fóruns internacionais da IOSCO - International Organization of Securities Commissions e da OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, sendo este um assunto em ebulição em diversos países.
Aqui, no Brasil, a CVM segue abordagem técnica e vanguardista e, também, exalta a postura que os autorreguladores têm tido. Há materiais da ANBIMA e da BSM sobre o tema, que se somam ao estudo promovido pela Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos (ASA) de nossa Autarquia, em 2022. Adicionalmente, o assunto vem evoluindo com os cuidados e atenção merecidos.
Em 2022, em meio ao estudo da ASA, a CVM se atentou à transparência em relação aos vínculos contratuais dos influenciadores. A partir de 2023, os focos da CVM passaram a estar relacionados (i) ao desenvolvimento de tecnologias para lidar com este desafio e (ii) à eventual necessidade de regulamentação do tema no Mercado de Capitais.
No final de novembro de 2023, a nossa Autarquia, valorizando o diálogo e escuta ativa, realizou uma Consulta Pública conceitual sobre a atuação de Influenciadores Digitais no Mercado de Capitais. O objetivo da CVM foi receber ponderações e comentários do público sobre possíveis opções regulatórias a serem consideradas em relação à elaboração de regulação prevendo obrigações e responsabilidades aos agentes regulados ao contratarem ou atuarem como influenciadores, bem como ao disseminarem informações por meio de plataformas de mídias e redes sociais.
Para isso, a CVM promoveu perguntas e as distribuiu em três vertentes:
Os comentários que os participantes do Mercado de Capitais encaminharam à Autarquia estão públicos e podem ser verificados por meio do QR Code disponível abaixo:
Em paralelo, a CVM iniciará, de forma organizada e construtiva, a análise das sugestões recebidas. Com o devido entendimento e percepção, pretendemos evoluir para conclusões sobre a possibilidade de encontrar um potencial caminho de convergência que privilegie a transparência, a segurança e bom funcionamento do segmento regulado pela Autarquia.
João Pedro Nascimento
é presidente da Comissão de Valores Mobiliários - CVM.
joao.pedro@cvm.gov.br