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Com a aprovação da Lei nº 15.042, em dezembro de 2024, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), o Brasil deu um passo decisivo para ingressar definitivamente na chamada “economia verde”. Agora, o país faz parte de um seleto grupo de nações, como os membros da União Europeia, Nova Zelândia e Estados Unidos da América, que já operam mercados regulados de carbono para combater as mudanças climáticas e reduzir emissões de gases poluentes.
Ao implementar esse modelo, o Brasil não apenas reforça seu compromisso ambiental perante a comunidade internacional, como também impulsiona um novo mercado promissor, capaz de gerar receitas expressivas, especialmente para o setor agropecuário, estratégico na economia nacional.
Até então, o país possuía um mercado de créditos de carbono voluntário, ainda tímido e pouco explorado, restrito às iniciativas pontuais e empresas pioneiras. Agora, com o sistema regulado estabelecido por lei, o cenário muda completamente. O setor privado, particularmente os empresários rurais, poderá transformar práticas ambientais sustentáveis em uma valiosa fonte de receita adicional.
No entanto, apesar do potencial econômico inegável, a consolidação desse mercado exigirá uma série de ajustes regulatórios e tecnológicos importantes. O Brasil precisará aprender com as experiências internacionais e evitar erros semelhantes aos cometidos em outros mercados em fase inicial, como foi o caso do sistema europeu de comércio de emissões (EU-ETS), onde erros iniciais levaram à perda de confiança dos investidores e à queda significativa dos preços.
Diante desse contexto, a atenção se volta especialmente para o setor agrícola brasileiro. Com destaque global em produção agropecuária, o país possui vantagens naturais e técnicas que podem transformar a agricultura em uma das principais beneficiárias do mercado regulado de carbono.
O agronegócio brasileiro é reconhecido globalmente por sua produtividade, inovação tecnológica e capacidade de adaptação a novos desafios. Agora, com a entrada em vigor do mercado regulado de carbono, agricultores terão mais um poderoso incentivo para expandir práticas sustentáveis que já vêm sendo adotadas no país, como recuperação de pastagens degradadas, reflorestamento, agricultura regenerativa e sequestro de carbono no solo.
Essas práticas, antes vistas apenas como ações ambientais voluntárias, ganharão status econômico, permitindo aos produtores rurais obterem receitas adicionais através da comercialização de créditos de carbono. Assim, o setor agrícola terá à disposição uma nova forma de rentabilizar sua produção, diversificando fontes de renda e reduzindo a dependência das oscilações tradicionais nos preços internacionais das commodities agrícolas.
O Brasil, que já dispõe de amplas áreas agricultáveis e de uma biodiversidade única, poderá, se bem administrado, transformar esses recursos naturais em diferenciais competitivos. Com a certificação ambiental reconhecida internacionalmente, os produtores brasileiros terão melhores condições para negociar seus créditos no mercado global, agregando valor à imagem sustentável dos seus produtos.
Nesse contexto, o produtor rural brasileiro ganha uma posição privilegiada. Com investimentos adequados em tecnologias sustentáveis e certificações ambientais, poderá aproveitar plenamente esse novo mercado regulado, ampliando sua participação econômica global e reduzindo as vulnerabilidades financeiras causadas por variações nos preços das commodities agrícolas tradicionais.
Apesar das claras vantagens, o caminho para o sucesso dessa iniciativa ainda enfrenta barreiras importantes. A primeira delas refere-se à necessidade urgente de estabelecer regras claras e transparentes sobre como será realizada a medição e monitoramento das emissões de gases de efeito estufa. Essa questão técnica representa uma preocupação importante, pois impacta diretamente na confiança e na efetividade do sistema.
Outro desafio relevante é estabelecer metas adequadas e viáveis para cada setor econômico. Indústrias como energia, transporte, agropecuária e manufatura deverão receber metas distintas, considerando suas particularidades produtivas e o potencial de redução de emissões. Para o setor agropecuário, definir esses parâmetros será especialmente importante, uma vez que sua inclusão no mercado regulado demanda sensibilidade às especificidades e características regionais.
Além disso, será preciso garantir que o Brasil conte com uma infraestrutura tecnológica robusta e segura para registro, acompanhamento e comercialização dos créditos. Uma falha nessa área, como já ocorrido no mercado europeu durante sua fase inicial, pode comprometer severamente a confiabilidade do sistema. Portanto, investir em plataformas digitais eficientes e auditáveis será uma tarefa essencial para o sucesso do SBCE.
Experiências internacionais revelam que a regulação adequada e o acompanhamento próximo por parte do governo podem garantir o sucesso do mercado de carbono, beneficiando economicamente setores estratégicos e protegendo-os de instabilidades iniciais.
Na Nova Zelândia, o “Emissions Trading Scheme” (NZ ETS) integrou agricultores e pecuaristas, permitindo-lhes obter créditos por meio da implementação de técnicas sustentáveis de manejo de solos e recuperação de florestas. Essa iniciativa gerou receitas adicionais substanciais para produtores locais, fortalecendo cadeias produtivas regionais e ampliando o potencial econômico das propriedades rurais.
A Austrália também é um exemplo interessante, tendo criado o “Carbon Farming Initiative” (CFI), no qual agricultores conseguem monetizar a captura de carbono por meio da recuperação do solo e reflorestamento. Apenas em 2023, cerca de AUD 200 milhões foram revertidos diretamente aos produtores rurais, comprovando a eficácia do mercado na geração de receitas sustentáveis.
Nos Estados Unidos, especificamente na Califórnia, o “Cap-and-Trade Program” envolve diretamente o setor agrícola com projetos ligados à agricultura regenerativa e biogás. Nos últimos anos, esse modelo rendeu cerca de US$ 500 milhões aos agricultores, fortalecendo a economia local e incentivando práticas sustentáveis.
Esses exemplos internacionais demonstram que, quando bem estruturado, o mercado de carbono pode se tornar uma ferramenta poderosa para promover o desenvolvimento econômico sustentável, impulsionando investimentos e inovando em práticas produtivas.
Desta forma, o Brasil está diante da oportunidade única de alavancar o mercado de carbono e liderar o futuro econômico global sustentável. O compromisso conjunto será decisivo para garantir que esse potencial se transforme em realidade.
Marcelo Hilário Figueira Garcia
é Químico Industrial (UFRJ), Especialista em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ-USP), Mestrando em Agronomia – Produção Vegetal (UFPR) e membro do Grupo de Pesquisas e Inovação em Sistemas Puros e Integrados de Produção Agropecuária (GPISI-UFR), integrante do INCT de Agricultura de Emissões de Baixo Carbono.
hilario74@gmail.com